Nestes mais de 160 anos vividos (nós três), convivemos com toda
espécie de pessoas, algumas admiráveis, outras crápulas da pior espécie.
Podemos garantir, sem querer puxar a sardinha para nosso lado, que pouquíssimas
pessoas conhecemos possuindo a honestidade, a simplicidade, a generosidade, a
criatividade, a inteligência e a sabedoria de nosso avô materno. Nosso pai foi
uma dessas pouquíssimas pessoas, mas aqui estamos tratando apenas de nosso avô.
Pra começar, vamos falar de sua generosidade e capacidade
empreendedora.
Quando arrendaram a Fazenda São Francisco, poderiam apenas buscar
lucro, pois além de não serem proprietários sabiam que o arrendamento não seria
longo. Encontraram a fazenda num estado lastimável: as casas dos colonos caindo
aos pedaços, todas de sapé e barro batido, repletas de barbeiros, pulgas e até
mesmo cobras. Logo que puderam, construíram uma olaria e começaram a reformar
todas as casas com tijolos e telhas. Estradas e pontes não passavam de trilhas
e pinguelas. Nas enchentes, a fazenda ficava totalmente isolada por semanas.
Imediatamente, nosso avô começou a construir estradas, pontes e aterros.
Aquele amontoado de pobres casebres começou a se transformar numa
pequena vila. Até um campo de futebol nosso pai criou, formando um time que
disputava jogos com outras fazendas. Camisas foram compradas, chuteiras e
meias. Os domingos tornaram-se uma festa. Falando em festa, vez por outra
organizavam uma, principalmente em junho, julho e finais de ano. Nas festas,
nosso curral, que era enorme, ficava apinhado de colonos, muitos vindos de
outras fazendas.
Quando lá chegaram, existiam apenas três engenhos de cana, movidos
a cavalo. Em pouco tempo foi construído
um grande engenho, movido a motor a óleo.
Muitos fazendeiros vizinhos traziam sua cana para transformá-la em
açúcar. Até hoje trazemos, na ponta da
língua, o gosto da garapa e da puxa, além daquele cheirinho gostoso de açúcar.
Chegaram a comprar um caminhão pequeno e um automóvel, a famosa
fubica.
Tudo isto e muito mais em pouquíssimo tempo.
Nosso avô era de uma criatividade e inteligência fenomenal. Ótimo
marceneiro, ótimo ferreiro, ótimo artesão de couro. Conhecia profundamente os
mistérios da agricultura, passando ensinamentos preciosos para os colonos.
Recuperou muitos animais na base do álcool e do canivete, como se fosse
experiente veterinário.
Era tão inteligente e criativo que, sem nunca ter visto um motor
de carro, conseguia, na base da curiosidade, intuição e inteligência, consertar
muitos defeitos que nossos velhos “fords 28" sempre apresentavam.
Temos de reconhecer que era, às vezes, muito quixotesco, lutando
contra moinhos de vento. Mas sua fidalguia era, com certeza, real.
(CONTINUA)
Pesquisa: Serjão, com a colaboração de Antônio Dárcio e Kiko
Missiaggia
Foto: acervo da Família
Missiaggia
Sei que meu comentário vem tarde, mas não poderia deixar de falar do meu avô. Convivi com ele nesta fazenda . Apesar de bem pequena lembro-me perfeitamente de tudo que havia lá. Havia de fato tudo o que aí foi descrito.
ResponderExcluirVô era tudo isto e mais ainda. Querido por todos, amável, corajoso, honesto, verdadeiro e cheio de sabedoria. Um abençoado por Deus. Homem incomum.
Felizes fomos nós que convivemos com ele e dele recebemos tantos ensinamentos.