domingo, 27 de dezembro de 2009

OBRIGADO POR SONHAR!



Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade. Assim dizia o Raul.
Em abril deste ano, o Serjão me enviou um e-mail, contando que havia sonhado com o Pytomba. O engraçado é que eu não conversava com o Serjão há exatos trinta anos e, no e-mail, ele reclamava de um bola cinco que eu havia matado na mesa de sinuca do Pintinho, quando a luz acabou.
Quer dizer, a amizade é assim. De repente, trinta anos depois, vem um sonho, assim do nada. Do nada não, vem daquele depósito de materiais inconscientes, dos velhos baús da infância, das mochilas perdidas, dos cadernos de poesia encardidos e dos intrincados desejos não realizados.
Pois é, de uma hora para outra, este estranho mundo entra em erupção e aí vem o resultado: sonho! O sonho do Serjão falava de um suposto show na praça da Matriz e já foi publicado aqui no blog (sob o título E nós, que culpa tivemos?). E ele falava da necessidade de divulgarmos a história do Pytomba na Rede. E lembrava de um amigo nosso, o Cabral, falando orgulhoso:
- Sou um daqueles que viu o Pytomba!
Comecei a perceber que a arte, mesmo a mais despretenciosa, traz consigo um compromisso, que é feito uma promessa, que o tempo não apaga. O que o Pytomba fazia, naqueles anos que hoje consideramos ingênuos, era uma forma de arte. Menos do que a arte musical, o que se fazia era a arte da convivência, a arte da amizade, a amorosa arte do compartilhamento de ideias e ideais.
Trazidos para a telinha do computador, via blog, vimos que não estávamos sozinhos: a arte de viver bem tinha muitos adeptos. É verdade que muitos se referem aos “velhos bons tempos”, mas a maioria sabe que é possível fazer, dos tempos atuais, momentos marcantes e inesquecíveis. É difícil, claro. Mas é uma arte e, como toda arte, transformadora. De conceitos e comportamentos.
O blog começou, relembrando as experiências do Pytomba e, de repente, percebemos que as experiências vividas, eram comuns à maioria dos nossos leitores. E não eram apenas sanjoanenses, mas também outros “jovens” de outras cidades, que viajaram voos parecidos com o que relatávamos no blog.
Novo e-mail do Serjão: “quando uma criatura humana desperta para um grande sonho e sobre ele lança toda a força de sua alma, todo o universo conspira a seu favor.” A frase é de Goethe, mas, de novo, estava ele lá: o sonho.
E assim tem sido: de sonho em sonho, a cada lembrança, nos risos e nos lapsos, a certeza de que a vida pode estar sendo uma experiência bem mais fantástica do que temos nos dado conta.
Hoje, 10.000 acessos depois, o blog está calmo: muitos leitores em férias, outros acabando de passar o Natal com suas famílias. Somos agora uma rua onde as pessoas passam para relembrar os bons tempos, as serenatas, os tragos escondidos, os beijos roubados e as canções que sempre voltam. Só que tudo isto está acontecendo AGORA, que estamos sonhando juntos.
Obrigado por nos significarem,
Jorge Marin

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

CAUSOS INACREDITÁVEIS



UM POSTE EM MEU CAMINHO - CAPÍTULO FINAL
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Na semana passada, como diria Drummond:
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha um poste
tinha um poste no meio do caminho
no meio do caminho tinha um poste... e o dedo doía...
E o suor começou a escorrer!
Imaginem só: uma pessoa sentada num banquinho amarelo ouro, no meio da calçada, com uma mão na cintura, a outra mão a meia altura, fazendo sei lá o quê, num poste qualquer, em plena Rua Nova!.. Ou é maluco ou é promessa!
O suor aumentava... Vontade de fazer xixi... Aí também não!...
Chega o Zé da Carroça! Olha daqui, olha dali e meio desconfiado, tira o cigarro de palha da boca e vai logo dizendo besteira:
- Procupa não, moço!!! Se ocê não saí por bem, nóis ranca com o poste e tudo!!!
Naquele momento, as gotas de suor já escorriam pelo rosto e as mãos começavam a ficar frias. Ouço então, do meio da multidão, a palavra “cavadeira”. Aí também não!... Ficar aqui agarrado, ainda passa! Mas, sair daqui levando comigo um poste, nem pensar!...Está fora de qualquer cogitação!!! E depois... levar para onde? Hospital?.. Prefeitura?..Ferreiro de plantão?.. Jamais.!!!! E a minha reputação?
Imaginem vocês o que significa uma notícia dessas no rádio ou jornal de uma pequena cidade do interior como a nossa. -"Genro do Barroso dá entrada no Hospital S. João acompanhado de um poste". Seria cômico se não fosse triste.
A esta altura, o suor já pingava no chão. Então, entre licenças e “abre caminho”, chega Dona Zélia, também moradora da rua, trazendo-me gentilmente, água com açúcar, bolachas e algumas palavras de consolo. Vendo-me comprimido por tantas pessoas, anunciou-me que estava quase na hora de começar um dos últimos capítulos da novela das oito e que a coisa ali ia serenar um pouco, pelo menos, durante a novela. Nessa hora, já sem esportiva, perguntei:
- Dona Zélia, a senhora tá achando que vou ficar aqui até que horas?!
Entre risos, um senhor que não conheço, começou a pedir que as pessoas se afastassem um pouco por causa do calor, mas ninguém queria de forma alguma arredar o pé, e olhem que a novela já havia até começado.
O engraçadinho da cavadeira, que estava há algum tempo quieto até demais para o meu gosto, manifesta-se novamente do meio da multidão e, com uma pequena torcida organizada, erguia as mãos para o alto e, em coro gritava freneticamente:
- Cavadeira!...Cavadeira!...Cavadeira!
Em meio ao alvoroço, os ânimos começaram a se exaltar e, “num ranca, num ranca, ranca, num rança”, comecei a me desesperar.
Para piorar ainda mais a situação, o Mota Soares, meu amigo das peladas de fim de semana e fanático botafoguense, passa pelo local e, mesmo vendo-me naquela situação, ainda teve a petulância de perguntar se por acaso eu não havia ficado sabendo o resultado de Botafogo e União de Araras. O pior de tudo é que o Mota é meio gago. Aí vocês imaginam o-o-o-o-o de-e-e-e-sespero...
Eu já estava prestes a entrar em pânico. Um calafrio percorreu todo meu corpo. Falaram em serrar o poste, cortar meu dedo e, quando o caso parecia mesmo sem solução, eis que surge, inesperadamente, um enviado das alturas, carregando em suas mãos, a poção mágica e grandiosa, conhecida por nós, simples mortais, pelo nome de sabão. O velho e eficiente sabão que, misturado com um pouco de água, foi aos poucos e lentamente retirando o quase desfalecido e inchado dedão.
Então, sob uma calorosa salva de palmas, fui rapidinho procurando meu rumo, não sem antes ver, ou melhor, cruzar com um carrinho de pipocas e um menino vendedor de picolés que, apressadamente, dirigiam-se ao local, na expectativa de faturarem às minhas custas. Haviam sido informados que ali o movimento prometia muito. Desta pelo menos eu escapei!!!
Mais noticias de meu drama, convido você, leitor, a procurar na voz de São João da época.
Este é um dos muitos causos do século passado e que hoje, de verdade mesmo, só restou o traiçoeiro e imponente poste. Lá está ele no mesmo lugar, frio e impassível, como a esperar por um novo e distraído DEDÃO.
Por isso, quando passarem por aquele local, cuidado: eu sempre fecho as duas mãos, ou as coloco no bolso, pois ainda ouço aquela voz sibilante:
- Dessa vez eu te pego, dessa vez eu pego...

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

A MAGIA DO NATAL


Vem chegando o natal,
Onde está Papai Noel?
O presépio, meus brinquedos, minha estrela de papel.
Onde está o sapatinho?
Que guiava do cantinho, meus desejos... Puros sonhos ao céu!

Recordações... Emoções e alegria!
Das canções e poesias... Natal nasceu Jesus!
E o tempo eternizou a mais linda sinfonia,
Infinita melodia, que nos encanta, nos aquece e nos conduz.

Quem me dera ser menino,
Ao natal poder voltar,
Adormecer... Assim sonhar!
Reencontrar a fantasia, desvendar a luz do dia,
Os presentes de natal.

Mas o bom velhinho sempre existirá,
Semeando o faz de conta e a esperança,
É só acreditar, deixar pulsar seu lado de criança,
Que a magia do natal e a estrela de Belém,
Brilhará eternamente,
Enchendo de luz cada momento,
E os sentimentos de cada coração.


Sergio R. Missiaggia (festival natalino 1998)
Foto: Jessica Onawa82, disponível em: http://browse.deviantart.com/photography/?order=9&q=magic+christmas&offset=72#/dqpouj

A todos os nossos leitores, seguidores e comentaristas, um Natal de muita paz, muito aconchego e muita luz interior!

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

CAUSOS INACREDITÁVEIS



UM POSTE EM MEU CAMINHO
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Semana passada, ali pelas 3 horas da tarde, estava eu passando pela Rua Nova quando, na esquina com a Rua Joaquim Murtinho, mais exatamente em frente à casa da saudosa D. Arlinda, e a pouco mais de cinquenta metros da residência de nossa querida amiga Soninha, a lembrança de um fato fez, naquele momento, com que eu viajasse alguns anos no tempo.
O exato lugar, se não me falha a memória, ocorreu em julho de 1975, e tornou-se palco de uma cena não comum a moradores e transeuntes daquela redondeza.
Naquele inesquecível dia, tornei-me personagem principal de um cômico e dramático episódio, que teve como coadjuvantes dezenas de pessoas que por ali passavam: moradores, curiosos, fofoqueiros, palpiteiros etc.etc.etc.
Além de incomum, ninguém poderia imaginar que aquela cena ficaria gravada, anos e anos, na história da já famosa Rua Nova.
Vamos ao fato: havia naquele local... Ou melhor, ainda há... um poste de ferro, que servia á sinalização de trânsito cuja característica era possuir pequenos orifícios espalhados em sua base.
Passar por ali era rotina obrigatória das idas e vindas do namoro, tornando-se local predileto das brincadeiras que eu, religiosamente, fazia toda vez que ali passava.
Uma das brincadeiras exigia de mim uma precisão invejável que, por sinal, era muitíssimo bem ensaiada. Consistia em enfiar o dedo rapidamente num desses buracos e, ante o perigo de ficar preso, deixar assustadas as pessoas que me acompanhavam.
Um belo dia... Não sei se por azar, erro de cálculo ou mesmo se engordei de um dia para o outro, ao enfiar, mais uma vez, o dedo num desses buracos, um calafrio no corpo me fez compreender que havia entrado verdadeiramente pelo cano, ou melhor, pelo poste. Senti uma sensação diferente, era como se escutasse ao pé do meu ouvido...
-DESSA VEZ EU TE PEGUEI!!!
Provavelmente teria sido um erro de cálculo, pois, após estudar minuciosamente o ocorrido, descobri que, ao introduzir o dedo com um pouco mais de pressão no buraco, deixei que as juntas penetrassem além do costume.
E ali estava eu. Por um erro de cálculo, tornei-me um indefeso prisioneiro de um poste e, o que é pior: exatamente na Rua Nova, que era das mais movimentadas da cidade.
Em vão, fiz as primeiras tentativas de escapulir dali. Procurei disfarçar, mas era impossível. Já alguns curiosos começaram a circular ao meu redor e aglomerar ao meu lado, enchendo-me de palpites, piadinhas e gozações. E eu ali indefeso, preso e já começando a ficar preocupado.
Um infeliz, já meio alcoolizado, passou pelo local e, com aquele bafo de pinga e aquele olhar pesado de todo pinguço, olhou para mim, olhou para placa, novamente olhou para mim e, colocando a mão em meu ombro, sussurrou baixinho em meu ouvido:
- Gente boa, fica frio, a placa é contramão, só o dedinho pode! (Depois dizem que bebum não pensa!...)
Fui levando tudo na brincadeira, pois, até então, acreditava que sair dali era questão de momentos, ou uma certa perícia, e isto eu acreditava que tinha.
O número de curiosos aumentava a cada instante e, entre uma piadinha e outra, chega o Sr. Saul que, com sua já conhecida educação, vai pedindo licença a todos, fazendo chegar até a mim uma cadeira, ou melhor, um banquinho amarelo ouro, sem encosto, duro e bem desconfortável. Mas valeu, pois já um suor frio principiava a dar sinal em meu corpo. Foi nesta hora, que comecei a pressentir que a coisa era bem mais séria que pensava.
Mas, o que fazer?
Será que teríamos que chamar o Corpo de Bombeiros em Juiz de Fora? E os meus pais, como reagiriam à notícia? Daria manchete na Voz de São João?
A resposta para estas inquietantes questões serão um presente de Natal: no próximo dia 25, quando faremos este esperado post... do poste. Aguardem!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

CAUSOS INACREDITÁVEIS



NUMA SEXTA QUALQUER DO PASSADO - CAPÍTULO FINAL
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Na semana passada, estávamos cantando na casa do Biel, nosso primo e, lá, encontramos o Tio Gabi. Sempre digo que o tio foi um marco na história da cultura sanjoanense, que se dividiu em antes do Gabi e depois do Gabi. Era contagiante seu entusiasmo nas causas que abraçava. Fazia tudo com desenvoltura e com amor sem igual. Divertido, inteligente e de uma oratória como poucos.
Pois foi o tio que nos levou, até a fazenda Santa Fé, na semana seguinte, para cantarmos pra um tal General do Exercito que lá estava pernoitando. Eles ficaram maravilhados, sendo que, dias depois, fomos convidados pelo tio Gabi, para cantar e fazer uma entrevista em seu programa, que acontecia todos os sábados na Rádio Difusora. Este dia foi, de certa forma, hilariante, pois, se não fosse a desenvoltura e desinibição de Pedrinho, aquela entrevista seria catastrófica. Ninguém dizia nada e a única coisa que lembro ter dito foi a de mandar um abraço para mãe e para meu pai, que estava meio doente.
Ficamos conhecidos por QUARTETO NEPOPÓ. Se não me engano, este nome foi carinhosamente dado pelo Tio Dante.
Nosso repertório era vasto e eclético, pois cantávamos, desde músicas de nossa própria autoria, até canções evangélicas, nacionais, internacionais e muitas outras.
Entre tantas, algumas nos marcaram mais: Asa Branca, A Casa do Sol Nascente, Barracão de Zinco, Segura na Mão de Deus, A Noite do Meu Bem, Teus Olhos e um solinho, feito por mim, que servia como introdução para acordar as pessoas.
Casas como as de Maria Célia, Neide Araújo, Bete e Cristina Itaborahy eram algumas que, vez ou outra, estávamos também cantando. Assim como para Guida, Josemi, Mica e outros parentes mais...
Muitos e muitos foram os lares que tiveram o privilégio de nos ouvir cantar e muitos foram os pedidos que, infelizmente, não puderam ser atendidos, devido ao tempo ou ao cansaço.
No final da serenata, e antes que fôssemos para casa, uma breve visita era feita ao forno de alguma padaria. Naquela hora da noite, a fome já começava a bater mais forte.
E como era gostoso aquele pãozinho quentinho, que mal havia saído do forno!!!! Os padeiros até nos conheciam e, vez ou outra, nos forneciam também uma manteiguinha.
A noite, literalmente, virava uma criança e nós, mais crianças ainda, nem víamos o tempo passar.
O único registro que ficou foi uma fita cassete gravada na igreja Matriz. Nosso amigo Jorge Marin, com seu excelente gravador Philips, foi o técnico de gravação, e esta fita se encontra perdida, vagando em algum lugar do planeta...
Com carinho e simplicidade, deixo registrada aqui, uma pequena passagem de nossas vidas.
Com certeza, algum fato poderá ter sido omitido. Ficará em aberto, se necessário, para futuros complementos.
Segue então, a última estrofe de uma de minhas letras, numa singela homenagem a todos que conosco, direta ou indiretamente, viveram estes momentos tão felizes.
“Ao Tio Dante... minha especial dedicatória e eterna saudade”.

Foi-se a noite enluarada,
Vi no tempo quase nada,
Foi amiga namorada,
Que calada me ouviu “cantar.”.
Sergio R. Missiaggia --- janeiro de 2005.

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ALGUNS DETALHES PERDIDOS

Ainda hoje, passando pela cozinha de minha casa, tive a grata felicidade em perceber minha atenção despertada por um minúsculo fato, que simplesmente era o de um aroma de leite fervido, que exalava do velho fogão.
Momento raro de observação que me levou, naquele instante, a questionar sobre tantas coisas puras que nos passam despercebidas e que nossa já calejada sensibilidade não notam mais.
É interessante que algumas observações, para determinadas pessoas, possam ser fúteis e até cômicas, mas quão maravilhoso e significante é saber contemplar e cativar pequeninas coisas!
O velho abraço apertado, o ato rotineiro de um simples aperto de mão, fascínio ao respirar o ar puro de uma manhã de céu azul envolvida em cerração, bate-papo na varanda, um olhar nos olhos ou mesmo ser um pouco daquela criança das pipas e dos inocentes casos de assombração.
Enfim, uma infinidade de sentimentos e pormenores do cotidiano, que o futuro sufocou, mas que, ainda enraizados, resistem fielmente.
Submergem, às vezes, por necessidade ou sobrevivência. Mas é certo que, tanto a pressa que o tempo nos impõe, como competição às vezes desenfreada, jamais serão capazes de inibi-los.
Indiferentes para alguns, sublimes e indispensáveis para outros, mas, com certeza, nos ajudam, e muito, a aproximarmo-nos da verdadeira felicidade.

A vida, além de bela, tem, como essência maior, a extrema facilidade de ocultar toda sua beleza e mistérios em infinitos detalhes e atos excepcionalmente singelos.
Sergio R. Missiaggia
São João Nepomuceno - maio 96

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

CAUSOS INACREDITÁVEIS



NUMA SEXTA QUALQUER DO PASSADO - SEGUNDO CAPÍTULO
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Na última sexta, perguntávamos: como se planeja uma serenata. De repente, um bando de jovens sai pela rua, com seus violões, para cantar músicas românticas. Segundo o renomado historiador José Ramos Tinhorão, no seu livro Os Sons que Vêm da Rua: “O hábito de cantar à noite pelas ruas, geralmente com o propósito de fazer-se ouvir por amadas inacessíveis (...), constitui, desde o fim da Idade Média um recurso sentimental cultivado em altas vozes noturnas por todo o Ocidente.” Relata ainda que tais cantorias foram chamadas de “serenada” pelos espanhóis e “serenata” pelos portugueses. A primeira serenata no Brasil, segundo Tinhorão, data de 1717.
O fato é que não se planeja uma serenata, era a música que nos levava. Quando descíamos da casa do tio Dante, já tínhamos um destino certo: Celeste, que, na época, morava no final da Rua do Descoberto, era nosso ponto de partida.
Quase sempre, Dorinha ia também dormir com ela, pois nesta época, morava no bairro São José. (Era ruim pra gente subir aquela escadaria!!!)
Então, sentados na calçada, procurávamos, de imediato, fazer algum tipo de ruído e aguardar por um sinal que logo viria.
Nem seria necessário pois, segundo pesquisas recentes, aquele meu velho cacoete, em eu ficava a raspar garganta, era suficiente para acordar quase meio quarteirão. Ainda mais naquela hora da noite!!!!
Mas, voltando à casa da Celeste: lembro-me que, na garagem, um delicioso lanche ficava, religiosamente, a nossa espera, enquanto, da janela, alguns acenos de aprovação, sempre nos deixavam muito felizes.
Uma passada na casa da Rosana Pimenta sempre acontecia, quando não dávamos, primeiro, uma esticadinha até a casa do Guto no bairro Santo Antônio. Nosso intuito, além de fazer uma serenata para sua família, era também saborear aquele queijinho caseiro, que sua mãe sempre preparava. Descendo, depois, a Rua do Buraco, passávamos pela casa da Maria Célia e, tomando um fôlego, íamos à Renise LaCava no morro do Ginásio.  Descíamos pelo outro lado, passávamos pela casa da Dione Paes, seguindo, após as cantorias, para a Rua do Sapo, onde Rosa Furiatti era nosso próximo destino.
Passávamos pela pracinha do Coronel, e alguns “gatos pingados”, saídos do colégio, ainda resistiam ao frio e permaneciam conversando...
Quando chegávamos à casa da Rosa, entrávamos por um portão lateral. Éramos sempre recebidos, amistosamente, pelo cachorro de um vizinho: por sinal... mal-educado e nada romântico. E o danado não parava um minuto de latir. Enfim, depois que o bicho sossegava, era só nos acomodar entre uma infinidade de varais e roupas penduradas sobre nossas cabeças.
Se não me falha a memória, era lá que ficava, a nos esperar, o melhor lanche.
(E como comíamos!).
Casa da Rita Rocha era nosso próximo alvo.
Nesta hora, uma paz absoluta já tomava conta de toda cidade. Neste momento, sempre que passávamos próximo aos correios, um fato interessante chamava minha atenção. O silêncio era tanto que, mesmo ao longe, dava até para escutar o clicar das bolas de bilhar. A sinuca do Cida era o único ponto da cidade que permanecia aberto até aquelas horas.
Na Rita Rocha, ficávamos sempre debaixo do porão. Era até interessante, pois este local nos proporcionava uma acústica fantástica. O lanche também era muito bom e, naquela hora da noite, até que dava um grande alento ao estômago.
Outro fato interessante era quando íamos até a casa da Dione Paes. Lá era o único local em que ficávamos totalmente expostos, pois tínhamos que ficar cantando na calçada. Era muito comum terminar de cantar e ver algumas pessoas, desconhecidas, sentadas ao nosso lado.
Até aquele pequeno intervalo, para descansar e esquentar as mãos, saborear os salgadinhos e fumar aquele cigarrinho, era curtido por nós.
Pior mesmo, era quando cantávamos um punhado de músicas e a danada da luz não dava sequer uma piscadinha. Era raro, mas... Acontecia!!!!
Ou este pessoal morreu ou não estão gostando da nossa serenata! Imaginávamos!!!! Já premeditando que ali ,com certeza, não haveria lanche.
Uma certa vez, lá pelas tantas, enquanto fazíamos uma serenata, na varanda de nossa saudosa prima Marialva, éramos observados por algumas pessoas. Essas pessoas, que também estavam perdidas na noite, ao passarem, por acaso, pelo local, ficaram maravilhados com a beleza da serenata. Entre elas estavam: Moacir Ângelo Ferreira, mais conhecido como Godelo e uma outra pessoa, que me foge agora da memória.
Conclusão: levaram-nos para casa do Biel (nosso primo). O Biel, se é que alguém não sabe, é um grande seresteiro, amante da boa música e de um fogão a lenha. Além de bom violonista, canta com desenvoltura e até arranha bem um acordeom.
Resultado: ficamos lá cantando e bebendo, até quase o dia amanhecer.

NA PRÓXIMA SEMANA: Como acaba uma serenata? Ela realmente acaba? Das ruas para o rádio, uma nova conexão. Não percam, o final da serenata. Numa padaria mais próxima, naturalmente.

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL