quarta-feira, 31 de março de 2010

LIGANDO PARA A INFÂNCIA



Crônica: Jorge Marin

Escrevo pressionado pelo meu filho que, da altura de seus quase cinco anos, exige minha presença para atuar, como tradutor, no mais recente videogame que ele está “detonando”. Temos falado da infância e, num dos últimos comentários, Sílvio Heleno lembrou que “a infância é linda”. Ele está certo, e a infância é tanto mais linda quanto a manifestação da força vital (divina?) que nos anima a todos.
Brincamos e a vida simplesmente é. Não procuramos subterfúgios, não premeditamos a chuva do dia seguinte. Quando meninos, as horas só tinham importância, se houvesse algum bolo no forno, ou se fosse véspera de Natal. A distância, então, simplesmente não existia: para ir à guerra, bastava descer correndo pelo quintal abaixo. E o pensamento, se havia, era somente: do que é que nós vamos brincar agora?
Humberto de Campos dizia que “na infância, o que se ouve ou o que se vê, não sobe para o cérebro; desce para o coração e aí fica escondido”. E talvez esteja aí, neste afastamento do cérebro, e do pensamento analítico, o segredo da chamada felicidade da infância.
Não que tenhamos sido sempre felizes. Houve momentos tristes, assustadores e até mesmo francamente depressivos, mas, quando isto acontecia, íamos para algum canto, ou abraçávamos algum de nossos pais e, pouquíssimo tempo depois, a angústia passava, e voltávamos a correr como loucos.
Vemos atualmente nossas crianças, ingressando muito cedo na vida social e, sem dizer que era melhor no nosso tempo, ou coisa parecida, simplesmente analisamos. Hoje, o menino, com cinco anos, já é veterano na escolinha. As meninas, aos nove ou menos, já vão com as mães ao salão de beleza, fazer as unhas, tirar sobrancelhas e até submeter-se a uma drenagem linfática.
As desculpas, ou melhor, as justificativas são muitas: as mães têm que trabalhar fora e as crianças precisam ficar nas creches; não se pode andar de bicicleta, pois o trânsito é perigoso, mesmo motivo pelo qual não se pode mais jogar bola no meio da rua. Para aplacar a culpa, matriculamos nossas crianças, no balé, na natação, no taekwondô, no inglês. Tudo ao mesmo agora, como diziam os Titãs. E o resultado de tudo isto é que conseguimos formar precocemente um bom contingente de neuróticos.
Crianças de cinco anos já se sentem frustradas se não possuem um celular. Ou ficam deprimidas, se não ganham um laptop até os oito anos. Então, percebemos que, de repente, um fenômeno começa a ocorrer: os pensamentos, antes tão restritos durante a infância, começam a ferver nos cerebrozinhos movidos a som de MP4 e Mac Lanche Feliz. E, com os pensamentos, o afastamento da força vital, o divórcio do Anjo da Guarda (lembram?) e a aposentadoria prematura do Papai Noel e do Coelhinho da Páscoa.
Para acabar com este estado de coisas, com a dinâmica do consumismo e a prisão do narcisismo (falam até que existe uma vaidade “boa”), é preciso uma coisa muito rara nos tempos atuais: é a dedicação. Os pais, e principalmente as mães, se revoltam: poxa, agora que sou independente, posso fazer minhas escolhas, não tenho que ficar escravo dos meus filhos. E vai neste pensamento, um grande equívoco: podemos escolher as causas, mas não os efeitos. Se escolhemos ter filhos, não nos é dado escolher se vamos ou não nos dedicar a eles: isto é uma consequência!
Portanto, melhor acabar por aqui, pois o meu pequeno buscador já largou o videogame e está assistindo “A Dança dos Vampiros”, filme de Roman Polanski, no qual fui barrado, ao matar aula, no Instituto Barroso. E, crítico precoce de cinema, meu pequeno crítico de cinema já declara:
- Ô pai, tem um vampiro aqui que parece com o Serginho do Big Brother!
Repetindo Oscar Wilde: “não quero adultos, nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice. Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto, e velhos, para que nunca tenham pressa.”

sexta-feira, 26 de março de 2010

ORIGENS



O BARRACÃO DO SR. ANGINHO - Capítulo 2

(Artigo - Serjão Missiaggia)

Muitas foram as guerras que fazíamos com a turma da Santa Rita. Separados apenas pelo córrego, travávamos memoráveis batalhas de arco e flecha. Enquanto nossos adversários faziam suas armas em bambu, as nossas eram forjadas em ferro.
Numa dessas batalhas nosso amigo Eduardo resolveu passar, sem mais nem menos, para o lado do inimigo. Infelizmente, antes mesmo que alcançasse o portão de saída, foi atacado pela cachorra da casa, de nome Chep. Coitado! Melhor ter ficado onde estava. Chegou do outro lado bastante assustado e com alguns rasgos no traseiro. Como se não bastasse, ainda descarregamos todo nossa munição em cima dele.

Fantásticas eram também as montagens dos carros alegóricos do Clube Democráticos que, no carnaval, eram sempre feitas no Barracão. Jamais me esquecerei da presença de nosso inesquecível professor Biel, que ficava a comandar todo o trabalho de montagem. O galpão era todo cercado por lonas, e pouquíssimas pessoas, entre as quais nos incluíamos, tinham acesso ao local. Bons tempos de rivalidade entre Democráticos e Trombeteiros. Ficávamos ajudando pra depois faturar aquele lanche.

Quase que diariamente fazíamos também deste espaço nosso campo de futebol onde nossas possantes “bombadas” saiam pra tudo o quanto é lado. O frentista do posto de gasolina, muitas vezes, nos servia de gandula. E não foram poucos os “torpedos’ que passavam voando sobre sua cabeça enquanto abastecia um carro.
Interessante que aquele mesmo portão, que na época nos servia de gol, ainda continua inteirão, no mesmo lugar. Hoje vejo que não se fazem portões como antigamente.
Ao contrário, naquela época, não se faziam bolas como hoje, e quando a danada molhava, aí meu amigo, ficava mais encharcada que bola de meia. Parecia que estávamos chutando um tijolo. Muitas vezes, na tentativa de amenizar o problema, íamos ao açougue para pedir sebo de boi, e assim darmos uma boa ensebada na bicha. Até que servia para impermeabilizar um pouco mas, ao misturar com aquela água do córrego, a coisa fedia ainda mais. Era aquele cheiro de “inheca” que somente saía depois de um bom banho.
Tínhamos até uma já bem combinada escala para buscarmos a bola dentro do córrego. Quantas e quantas vezes, ao acabarmos de tirá-la de dentro d’água e darmos um forte chute, espirrava em nosso rosto aquela água imunda e fedorenta. E as amebas, com certeza, morriam de rir.

Depois diziam que dona Mariana era brava! Hoje, fico a imaginar como uma pessoa poderia passar o dia inteiro escutando a barulhada daqueles petardos explodindo no portão. E bem ao lado da cozinha. Se pensarmos bem, foi uma verdadeira heroína.
Dona Nicoleta, sim, era de poucas brincadeiras.
Certa vez, combinamos com Silvio Heleno o seguinte: quando fosse chamado para almoçar, educadamente, como sempre fazia, nos convidaria também. Só que o faria, desta vez, em voz alta. Neste dia, éramos mais ou menos uns cinco ou seis colegas. E assim foi. Quando Dona Nicoleta o chamou para almoçar, ele, em voz alta, também nos convidou: - Aceitam almoçar pessoal? Nós, com a voz ainda mais alta, respondemos juntos e mais que depressa: - Aceitamos sim!
Eis que, lá de dentro da cozinha, ela grita ainda mais alto: -Cada um vai caçando seu rumo! Tão achando que aqui é hotel? Vem, Silvio Heleno! Ou na casa desse pessoal não tem comida?!
E assim fomos todos nos retirando, dando boas risadas.

Fizemos deste Barracão até local para treinarmos tiro ao alvo. Isto sempre acontecia quando Fernando, primo do Silvio Heleno, aparecia por lá, trazendo consigo seu arsenal de armas de fogo (bereta, pistola, espingardas, revólver 22, 38, 39, 40, 41 e por aí a fora). Era tiro pra todo lado. Pobre daquele urubu que fizesse rota sobre o terreiro.
E, por falar em Fernando, imaginem vocês como ficávamos, quando ele aparecia no barracão pilotando seu famoso Kart. Ficávamos fascinados com a possibilidade de poder guiá-lo. Ainda hoje não vi outro igual em São João.

Como resistir a não brincar também num lugar onde existia um Fordinho 29 em que ficávamos dirigindo o dia inteiro? Era super-raro e emocionante podermos ligar e guiar um carro de verdade, principalmente naquela época. Interessante que, até hoje, não dirijo. Quem sabe não seria por causa daquele domingo em que matei missa só pra poder ficar fazendo umas manobrinhas? Só sei que Dona Venina ficou uma fera. Trauma de infância?

Na próxima semana, não percam: a super-buzina, o trote em cores e o Cine Teatro SERSIL!

quarta-feira, 24 de março de 2010

SENSATA LUCIDEZ



Música de Serjão Missiaggia apresentada no
Festival de Goianá em 1997.

Enquanto a dança desigual, corrompe, fere... Corre lá fora,
A verdadeira vida a ignora,
Fazendo-nos ser, aprendiz e professor,
Servos de nós... Não do Senhor...

Vida... Vida! Magia que fascina esconderijo das ilusões,
Vida é liberdade nos anseios das canções,
Seus detalhes, seus segredos, matam a sede da esperança,
Ser poeta, ser criança,
Ser feliz por simplesmente ser.

Se é serena e mansa a consciência,
Feliz do coração de quem alcança,
Pois se lança inconsciente por caminhos que sonhou.

É no sentimento sincero, que a alma brilha e se aquece,
E se o pensamento é tão puro, tudo ainda mais se enobrece,
Verdadeiro tesouro que enriquece,
E a vida segue viva, plena, livre, cristalina,
A um destino digno, se faz abraçar...

sábado, 20 de março de 2010

ORIGENS



O BARRACÃO DO SR. ANGINHO - CAPÍTULO 1

(Artigo - Serjão Missiaggia)

Abril é o mês de aniversário de nosso blog. Entre as postagens comemorativas que irão ao ar, esta é especial: é um retorno à pré-história do Pytomba, ou um mergulho no Túnel do Tempo, se preferirem. O sentimento não chega a ser nostalgia, mas sim a lembrança de um tempo em que aprendemos a ser felizes.

Hoje, 04 de fevereiro de 2010, estamos acabando de chegar de uma rodada de pizzas na casa de nosso amigo Silvio Heleno. Na oportunidade, tivemos o prazer de estar comemorando com ele seus “quarenta e dezesseis anos”.
Mas, antes de qualquer coisa, gostaria de abrir um pequeno parêntese para fazer uma exaltação toda especial àquelas maravilhosas pizzas que, por sinal, somente suas irmãs são capazes de fazer. Sempre digo que, iguais àquelas não há. Interessante também é sentir o prazer que a família tem em receber cada convidado. Confesso gostar muito e achar tudo o maior barato.
Mas, voltemos à casa do Silvio. Mais exatamente naquele espaço em que fica o velho Barracão:
Enquanto ali sentado em uma das mesas, saboreava aquelas delicias, ficava a viajar com a lembrança no tempo, recordando tantas e tantas passagens de infância, adolescência e até mesmo adulto que ali aconteceram. E garanto que não foram poucas!

E assim tudo começava: - SUVELENO TÁÍ?
Desta forma, diariamente ainda na infância, Renatinho e eu, religiosamente, chegávamos até a varanda de sua casa para chamá-lo. Logo éramos atendidos por alguém da família que, prontamente, nos mandava entrar e procurar pelo Silvio Heleno que, provavelmente, estaria (pra variar) não fazendo nada em algum lugar do Barracão. E assim, mais que depressa entrávamos, para que, juntos, também pudéssemos não fazer nada.
Já dentro do terreiro, outro mundo para nós se revelava e um leque de brincadeiras se abria.
Uma delas, e da qual jamais me esquecerei, eram nossas bem planejadas invasões. Para quem não sabe, em nosso dialeto, significava simplesmente, pular o muro e tomar emprestadas algumas frutinhas no território vizinho. Por sinal, tanto a primeira como a segunda invasão foram as que mais me marcaram. Ficaram conhecidas como “as famosas primeira e segunda invasão.”
Nunca iniciávamos um ataque sem, antes primeiramente, subirmos ao lavador e darmos nosso famoso grito de guerra: HÁ ALGUEM AÍ? A NOÍS AQUI Ó! O negócio era nos certificarmos de que realmente o lugar estaria deserto. Depois, era só pular o muro e, cagando de medo, recolher algumas frutas.

Muito comum também, e que sempre achávamos graça, era quando, ao procurarmos pelo Silvio simplesmente, o encontrávamos deitado no chão do Barracão onde, de barriga para cima, ficava dando “cusparada” para o alto. Coisa de doido, dizíamos, mas, se o negócio era deitar no chão, cuspir pro alto e não ficar fazendo nada, porque não fazer também? Virava um verdadeiro “cuspódromo”. Meu Deus, que nojo!
E presenciar a colheita de um jiló, e vê-lo instantaneamente ser devorado in natura quase por inteiro? Juro que via! Fato raro, mas alguém tinha este costume!

E como era mágico fazer a montagem daquele brinquedo “O PEQUENO CONSTRUTOR”, bem embaixo do lavador. Era o maior barato . Ali nos reuníamos e ficávamos horas e horas totalmente alienados do que ocorria lá fora no mundo. E nem víamos o tempo passar. Interessante que este mágico local se transformaria mais tarde em Chiqueiro. Coisas do velho Anginhusss.
E por falar em nosso saudoso Sr Anginho, diria que ele teria sido para mim uma daquelas pessoas de inteligência rara, super-dinâmica, trabalhadora e muito divertida. Vivia inventando algo diferente para fazer neste nosso santuário de brincadeiras. Quem não se lembra do famoso Expresso Picorone e sua frota de ônibus famosos (N-M e, posteriormente, o fantástico top de linha Ciferal da Merces Benz)? Quase sempre, enquanto ficavam estacionados no barracão, em manutenção, aproveitávamos e passávamos quase que o dia todo brincando dentre deles, fazendo incríveis viagens imaginárias por este mundo afora.
Pois este imenso espaço de terreira, também acolheu, certa vez, uma Máquina de Arroz, um Mercado, um Depósito de Mangas e até mesmo uma grande Criação de Porcos (exculê-exculê-exculê e lá ia o velho Anginhussss tratar de seus porquinhos). Até mesmo uma bela criação de coelhos chegou a existir no local, mas confesso não me lembrar se era de sua propriedade.

E foi nesta Máquina de Arroz que tive o prazer de conhecer o funcionário de nome Zé Justo. Um simpático senhor. Aquele mesmo que foi o sacristão da igreja católica por longos anos.
Acreditariam se dissesse que até a data de seu falecimento existia um amigo que literalmente tinha o “rabo preso” com ele? Tudo teria acontecido quando, no silêncio do almoço, após desligar as máquinas, o fiel e justo Zé começou a escutar, sutilmente, vindo do terreiro do Gongom, aquele famoso som: psiiiii. Segundo ele, só deu mesmo pra ver a ponta do rabo de uma eguinha balançando atrás do pé de Eugênia da arrepiante residência do sr. José Lobúglio.
Depois deste hilariante flagra, um de meus amigos confessou certa vez que, uma fruta de eugênia saborosa como aquela, jamais comeria novamente!
NA PRÓXIMA SEMANA, não percam: a Guerra, mais carros alegóricos das batalhas de confete e o inesquecível ecabol, diretamente do córrego para os campos desgramados.

quarta-feira, 17 de março de 2010

PENSANDO NA CHUVA



Crônica: Jorge Marin

Acontece de chover quando acabo de deixar meu filho na escola. A pé, só me resta abrir o surrado guarda-chuva e fazer o caminho de volta para casa, debaixo daquilo que nossos pais chamavam de “toró”.
Percebo que, à medida que vou subindo a pequena colina para retornar, apresso o passo, resfolego e minha mente vai com um só pensamento: voltar para casa, voltar para a casa o mais rápido possível. Nem percebo o desfile de guarda-chuvas e sombrinhas à minha volta, nem a celebração feliz das crianças sob a chuva de verão.
Paro por um minuto, respiro, e percebo que meu pensamento está me levando a me rebelar contra... a chuva. Meu pensamento indica que aquela chuva está atrapalhando meus planos (de chegar seco em casa?), ameaçando minha integridade (vai que eu escorregue e caia no meio da rua) e até mesmo me atrapalhando pensar em coisas importantes como: minha declaração de Imposto de Renda na malha fina, a dívida do cartão de crédito e, importantíssimo, o resultado de meu exame de sangue.
Ou seja, o pensamento quer que eu rejeite o que é, para ter mais tempo para pensar em inutilidades. E notem que os assuntos que o pensamento quer pensar são apenas geradores de más notícias, como se eu tivesse um “Datena” inconsciente, no ar por 24 horas.
Como não posso fazer “deschover”, desligo um pouco meu frenético fluxo pensante e começo a observar a paisagem. Vejo as vidraças sendo lavadas, vejo as árvores balançando com a força do vento e até, vejam só, um casal de filhotes de bem-te-vi escondidos debaixo da caixa de correio de um casarão antigo. Ao estar atento a todos estes detalhes, o mundo, de repente, deixa de ficar cinza, e assume tonalidades fantasticamente coloridas, de amarelo ouro a verde escuro, talvez porque o sol, brigando com as nuvens, teime em se manifestar.
Chego à conclusão que, na maioria das vezes, é muito difícil para nós constatarmos que não somos deuses. Ficamos sempre contestando aquilo que é. Seja uma chuva, uma derrota, uma desilusão amorosa ou a perda de um ente querido. E o curioso é que a dor vem daí, da não aceitação do fato consumado.
Temos esta mania, curiosa e poder-se-ia dizer, inexplicável, de querer mudar o passado e garantir o futuro. Quanta energia é gasta neste processo inútil, desagradável e totalmente idiota. Não quero dizer que tenhamos que aceitar tudo pacificamente ou que não devamos fazer planos. O que eu tento entender, e do que tento me livrar, é desta vocação para brigar com uma coisa manifesta, como a chuva, por exemplo. Ou sofrer, antecipadamente, por um futuro que nem sabemos se vai existir.
Sartre falava que o que importa não é o que fizeram de nós, mas o que fazemos com o que fizeram de nós. Há também um momento marcante, na peça “Melanie Klein”, sobre a célebre psicanalista vienense (interpretada soberbamente por Natália Timberg), em que sua filha, vivida por Carla Marins, reclama de sua mãe, dizendo que esta se preocupava mais com seus pacientes do que com os filhos, o que teria levado seu irmão a cometer suicídio e levá-la a viver uma vida miserável. A resposta de mamãe Melanie é cruel, e surpreendente:
- É problema seu, e do seu analista!
Por isso, não estou mais lamentando a chuva, e nem estou correndo feito um louco para me livrar dela. O que eu posso fazer é continuar segurando firmemente o meu guarda-chuva, ou talvez até fechá-lo, já que a intensidade da água diminuiu e posso me dar o luxo de receber algumas refrescantes gotículas de chuva naquilo que, antigamente, eu costumava chamar de “meus cabelos”.
Lembro-me de Gene Kelly, cantando na chuva: “que sensação gloriosa, eu estou feliz de novo, eu estou rindo das nuvens, tão escuro lá em cima, o sol está no meu coração e eu estou pronto para o amor.”
Será que vai ter arco-íris?

sexta-feira, 12 de março de 2010

CAUSOS INACREDITÁVEIS



CRÔNICAS GALINÁCEAS - DE DONALD A MARGARIDA
EPISÓDIO 5 - O RETORNO - CAPÍTULO FINAL
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Na última semana, eu havia acabado de receber uma ligação do Geraldo, dizendo que, naquela noite, iria procurar entre centenas de patos em sua propriedade, para tentar localizar nossa Margarida, ou Donald, sei lá. Na hora do aperto, exceto em filme americano, uma coisa com a qual a gente não preocupa é o sexo.
Eu sabia que não ia conseguir dormir naquela noite. Portanto, para espairecer, e ainda na expectativa de que eles poderiam enfim encontrá-lo, aproveitamos e fomos para o Botafogo.
A esta altura do campeonato, metade da cidade estava à procura do pato.
Teve gente me telefonando, tarde da noite, pra dizer que havia visto um pato, meio suspeito, lá pelas bandas da estrada de Roça Grande.
Enquanto tudo isso ia acontecendo, comecei a observar que Matheus, realmente, dava os primeiros sinais de que, esquecer do Donald seria apenas uma questão de tempo.
Paulinha, que havia ficado em casa, chegou repentinamente ao clube. Um tanto assustada, nos disse meio afônica:
- Pai! Deixaram uma coisa lá no corredor da vó! Tá dentro de um saco e não para de mexer! Faz um barulho esquisito! Para mim, não tem nada a ver com Donald! - afirmava ela, em conclusões precipitadas.
Eu, um tanto eufórico, com aquela possibilidade, comecei a chamar pelo Matheus. Nesta hora, ele jogava bola na quadra.
Antes que ele escutasse, tive a intuição de, primeiro, confirmar do que realmente se tratava... E foi a minha sorte!
Deixando o pessoal no clube, dei um pulinho até em casa. O negócio era verificar a autenticidade do achado.
Chegando, ansiosamente, perto do saco, dei-lhe primeiramente, um pequeno cutucão com o pé.
O barulho do bicho, em nada me agradou. Como poderia Donald ter mudado tanto? E em apenas quatro dias?
Por fim, meio receoso, após colocar a cabeça dele fora do saco, é que pude observar que aquele patão, da cabeça preta, não tinha nada a ver com o nosso Donald.
E lá fui eu, telefonar novamente, para o Geraldo.
-Alô! Geraldo! Tudo bem?! - Antes de qualquer coisa, gostaria, imensamente, de te agradecer. Sei que teve muita boa vontade, mas... Vou te devolver aquele patão! Fiquei muito grato, só que: meu pato não tem cabeça preta! Como poderei fazer para devolvê-lo?!!! – perguntei.
- Entrega ele, novamente, ao pessoal da loja! Amanhã, bem cedinho, passarei e o levarei de volta! – respondeu, um tanto decepcionado.
Neste meio tempo, já não tinha nenhuma dúvida de que Matheus começara a esquecer de Donald e, qualquer vacilo, poderia novamente despertar sua saudade.
Minha preocupação era devolvê-lo o mais rápido possível. Teria que evitar, a qualquer custo, que naquela noite fizesse o mínimo barulho.
Assim, após amarrar a boca do saco, deixei-o pernoitar na casa ao lado, no corredor.
Felizmente, para nossa sorte, tudo transcorreu dentro do previsto.
No outro dia, bem cedinho, antes mesmo que o galo começasse a cantar, já estava eu andando pela rua, carregando aquele bendito saco de farinha. Pessoas que passavam por mim ficavam de olhos arregalados. Não era para menos, pois aquele saco, com uma coisa enorme dentro, não parava de mexer.
Quando chegaram os primeiros funcionários, eu já estava esperando há quase uma hora.
Coincidentemente, foi uma das noites mais frias do ano (aproximadamente, dez graus).
E lá amanhecera eu: sentado no meio fio, com um saco de farinha no colo que, por sinal, não parava de grasnar.
Minha cara, com certeza, era de quem mal dormira naquela noite.
Pedi que o entregassem, novamente, ao Geraldo, agradecessem em nome da família e dessem, de uma vez por todas, um tiro certeiro neste assunto.
Enfim! Em nome da paz!...Pato nunca mais!!!!

PORÉM: o que teria acontecido com Donald, ou Margarida?
Ao longo do tempo, desenvolveram-se diversas teorias patológicas:
- Para alguns, ele(a) foi visto pela última vez, na fazenda do Geraldo, passeando às margens do Rio Novo, com oito patinhos amarelos.
- Para outros, Donald foi recuperado pelo Zezé Raposão (lembram?) que o colocou como cão (pato) de guarda de seu cafofo.
- Outros dizem que, a exemplo do seu antigo dono, Donald se tornou jogador de futebol e assinou contrato com o Milan, mas eu acho que se trata de um outro pato.
- Finalmente, devido à sua ambiguidade sexual, Margarida estaria nadando na piscina do Big Brother Brasil, quando foi eliminada no paredão e assinou contrato para posar, como veio ao mundo, para uma daquelas revistas que vocês conhecem bem (a Globo Rural).

quarta-feira, 10 de março de 2010

A FACE OCULTA DA FELICIDADE



Crônica: Serjão Missiaggia (março/2004)

Vez ou outra, duvido que qualquer ser mortal, por mais equilibrado seja, não tenha se questionado, em algum momento de sua vida.
São aqueles questionamentos latentes que, aprisionados em nossa memória, ficam a vagar pelo tempo, para, de vez em quanto, aflorarem em nossos pensamentos. Acontece, principalmente no que tange às lembranças de oportunidades perdidas, ou em fatos que, com certeza, teriam, e muito, mudado a trajetória de nossas vidas, para melhor... é claro.
É muito comum entrarmos neste triste devaneio, principalmente quando nos encontramos naqueles dias de baixa estima, ou quando as coisas não vão indo como gostaríamos que fossem. São nas ondulações negativas do cotidiano que nos envolvemos mais facilmente, com estes pensamentos tão nefastos.
Porque isto?... Porque aquilo?... Porque aquilo outro...? Enfim... São tantos e tantos porquês!
Imaginei, ao longo de minha vida, que as respostas, para esses enigmáticos questionamentos, poderiam estar, quem sabe, em algumas seções de terapia (umas mil e quinhentas... talvez!), ou mesmo no brilho de uma estrela que, possivelmente, estaria, desde meu nascimento, constantemente com as pilhas fracas.
Preguiça?... Bem pouco possível!
Incompatibilidade com os livros?... Não seria uma hipótese de toda descartável, ou melhor... Inteiramente provável!
Falta de Fé?... Nunca! Sem chance para esta possibilidade!
Há... Já ia me esquecendo do tal de destino. Para ser sincero, nunca fui muito de acreditar nestas coisas e muito menos em: carma, mau olhado, olho gordo e outras besteiras mais...
Então, onde estariam as respostas para tantas e tantas dúvidas e tantos porquês?
Por acaso, comecei a encontrá-las, quando menos esperava. Foi numa bela tarde, em que estava sentado no terreiro de minha casa, sob a sombra de meu pé de caqui.
Enquanto comia um pedaço de pão e observava entre a folhagem dois passarinhos, um sentimento, de certa forma banal e, ao mesmo tempo, de uma singela inocência, inundou, de repente, meu coração.
Neste sentimento, não sei por quê, interagi sensivelmente com a paisagem, fazendo com que, naquele mesmo instante, pudesse entender quão bela é a Magia Infinita da Perfeição Divina. Uma magia que, sorrateiramente, fica a reger tempo e espaço, sem que mesmo percebamos.
Confesso que achei também, ter sido um pensamento um tanto esquisito, mas, na hora, preferi mesmo acreditar que minha cabeça seria simplesmente mais uma entre tantas outras milhões que ficam, vez ou outra, a vagar pelo espaço.
Voltando ao pensamento, e procurando assim interpretá-lo com um pouco mais de sensibilidade, surpreso fiquei, ao ver que tudo estava ali, sutilmente, bem ao meu lado, ou seja: “NAQUELE MOMENTO PRESENTE”... Isso mesmo!
Já imaginou o que significou um milionésimo de segundo ao longo de nossas vidas?
Partindo deste pressuposto, perguntei-me:
- Hoje, sou feliz?
- Tenho um lar que, mesmo longe da perfeição, é abençoado por Deus?
- E que este mesmo Deus, a mim, veio confiar o cuidar de uma esposa e dois filhos maravilhosos?
- Tenho uma profissão que, por mais simples que seja, dela faço prover o pão de cada dia?
- Tenho amigos fiéis e uma saúde que, apesar de alguns tropeços, muitos não as têm?...
Milésimos de segundos... ”Fronteira entre o ser e não ser.”
Qualquer outro caminho que, no passado, tivesse sido alterado, ou mesmo uma simples decisão que não fosse as mesmas, que houvesse sido tomada... Hoje, nada, ou quase nada, seria assim.
Milésimos de segundos. “Tudo seria diferente”
De minha concepção à concepção de meus filhos.
Do exato momento: daquele namoro... daquele noivado... daquele casamento... daquele ato de amor....daquele espermatozóide que, entre tantos milhões, foi o único que: naquele ano, naquele dia, naquela hora, naquele segundo, naquele milésimo de segundo, teria sobrevivido pra fazer germinar e fazer a vontade de nosso criador.
Milésimos de segundos... ”Senhor do ser ou do que poderia ser”. É exatamente aí que, sutilmente, sempre esteve e sempre estará a mão de Deus.
Nosso passado foi regido e construído por infinitos milésimos de segundos que, divinamente, foram se combinando para, ao longo de nossas vidas, intencionalmente, sem que percebêssemos, fossem, sob a batuta de nosso ser supremo, verdadeiros tijolinhos na edificação do momento presente.
Milésimos de segundos... Um elo entre o tempo e o espaço que, se alterado no mais intimo de suas conexões, teria mudado todo um momento futuro.
Em nossas vidas, cada um de nós, por mais simples que seja, tem sua missão a cumprir e, por ignorarmos esta essência, é que nos deixamos, muitas vezes, sufocar pelo inconformismo e pela incompreensão.

Enfim... Antes de tantos arrependimentos e porquês, procuremos abrir os olhos e sentir, com toda plenitude, o que de bom conseguimos construir em nossa volta. Perceberemos, em milésimos de segundos, que sempre esteva ali, bem ao nosso lado, tão pertinho da gente: “nossas respostas, nossas dúvidas e nossos porquês.”

“Aceita as surpresas que transformam teus planos, derrubam teus sonhos, dão rumo totalmente diverso ao teu dia e à tua vida. Não há acaso. Dá liberdade ao Pai, para que ele mesmo conduz a trama dos teus dias...”
(Dom Hélder Câmara)

sexta-feira, 5 de março de 2010

CAUSOS INACREDITÁVEIS



CRÔNICAS GALINÁCEAS - DE DONALD A MARGARIDA
EPISÓDIO 4 - BUSCA PATÉTICA
(Roteiro original - Serjão Missiaggia / Adaptação - Jorge Marin)

Na semana passada, num bairro afastado, num quintal sombrio de uma casa escura, eu me encolhia ao lado de uma cerca de bambu, e juro ter visto brilhar na escuridão uma lâmina, acho que era um canivete. A imagem de homem foi se aproximando lentamente até que, pela luz da varanda, pude vê-lo.
Assustado, de olhar arregalado, custou se aproximar. Provavelmente, estaria imaginando que eu pudesse ser um ladrão. Vindo lentamente para meu lado, um tanto desconfiado, aproximou-se de mim trazendo consigo um suave bafo de álcool. Se havia algo na mão, porque ele a enfiou no bolso da calça.
Antes que me interrogasse, procurei, de imediato, num ato inconsciente, de coragem e desespero, ir tomando pulso da iniciativa. Simulando segurança, fui logo perguntando:
- Nem brinca que já comeu meu pato!
Ele, por sua vez, até então sem nada entender, sentou-se na escada e, aliviado, me disse:
- Ô meu! Assim, cê me mata de susto! Achei mesmo que poderia ser um ladrão! Quanto a este pato, se for o que estou pensando, confesso, a você que, pela primeira vez, fiquei com pena de um bichinho. Resolvi então, presenteá-lo a um velho amigo.
A seguir, dizendo-se feliz, com minha presença, ofereceu-me um pedaço de “torremo”. Aliás, gordura purinha, acompanhada de fragmentos de torresmo!!!
- Numa outra oportunidade! Quem sabe!
Agradecendo, então, pela bela acolhida, pedi que não reparasse, pois, naquele momento, estava empenhado somente em achar aquele bendito pato. Custe o que custasse. E fui logo me mandando dali.
Felizmente, para minha sorte, este seu amigo era também um conhecido meu.
Sendo assim, no outro dia, bem cedinho, antes mesmo de abrir a oficina, lá fui eu procurá-lo.
Por sorte, logo o encontrei, pois seu escritório era bem aqui ao lado, isto é: na antiga casa do Bolote. Chegando lá, após pedir licença, procurei ir entrando. Fui caminhando até sua mesa e sentei-me.
Ele, extremamente ocupado, com centenas de papéis sobre a mesa e com dezenas de pessoas a sua espera, perguntou-me qual a razão de minha visita:
- E aí Geraldo?! Como tem passado?! – disse-lhe, meio sem jeito, para, em seguida, começar a contar meu drama.
Ele, por sua vez, um tanto abobado e incrédulo, esperou-me acabar e disse:
- Ô Serginho! Eu também sou pai e já passei por uma situação muito parecida. Realmente, eu ganhei o pato. Só que, para achá-lo novamente, será muito difícil!
- Por que, Geraldo? - questionei um tanto apreensivo!
- No meu sitio, existem mais de trezentos patos! E todos soltos na
natureza! Se você quiser, poderemos, pelo menos, tentar encontrá-lo! É só descer o rio! Terá que ser à noite e de canoa! Se possível, ainda hoje, pois viajarei amanhã! - concluiu.
Comecei, então, nesta hora, a imaginar como seria Geraldo e eu, descendo o rio, de canoa, numa noite chuvosa e sem lua, à procura de um pato. Isto sem contar que ele já havia me confessado que nem sabia nadar!
Um tanto receoso, pedi que me desse mais um dia, para que, assim, pudesse sentir, com mais firmeza, como a coisa iria caminhar. Ao sair de seu escritório e já passando pelo corredor, ainda tive que encarar várias pessoas. Divertiam-se e riam bastante, pois haviam escutado nossa conversa, do lado de fora.
Procurando por patos, na Internet, fiquei sabendo que, no dia 29 de janeiro de 1992, um navio cargueiro deixou cair parte de sua carga no Oceano Pacífico, liberando, adivinhem o quê? Milhares de patinhos de borracha amarelos. Surpreendentemente, muitos deles ainda continuavam boiando até os dias atuais, inteiros, e avançando constantemente. Eles percorreram o oceano até a costa leste dos Estados Unidos, até as margens da Groenlândia e, através do gelo, no Oceano Ártico.
Não devia ter lido isto, pois comecei a me sentir mal. Deitei no sofá e me via numa canoa, cercado de milhares de patos rodopiando sem parar. Comecei a ficar enjoado com aquele quá-quá-quá, quando o telefone tocou. Era o Geraldo, dizendo que estava no sítio e que iria, com alguns amigos, descer o rio.
Perguntou-me se, por acaso, não me lembrava de alguma referência que pudesse identificar o pato. A única coisa de que me recordei era que, além de uma pequenina mecha preta na cabeça, existia um furo bem na pata esquerda... Ou direita?!
Mais tarde, fiquei sabendo que quase todos os patos têm um furo desses na pata.
Desliguei o telefone e me deu um aperto no coração. Os meninos brincavam e não quis dizer nada para a Dorinha. Tinha certeza de que aquela seria a noite mais longa da minha vida.
Não percam, na próxima semana, o emocionante capítulo final desta saga. Saibam como aprendi novas lições com os meus filhos e, principalmente, em que enrascadas pode se meter um caçador de patos (o pai sempre acaba pagando o pato!).

quarta-feira, 3 de março de 2010

VIVER A VIDA



Crônica: Jorge Marin

Toda noite, mesmo com a TV desligada, recebemos a poesia cantada de Vinicius de Morais: “tem dias que eu fico pensando na vida.” A verdade é que tem dias que eu fico mesmo pensando na vida. E não durmo.
Falamos no blog dos males do pensamento compulsivo, mas a questão aqui é outra: a vida é mesmo para ser pensada? Qual é a utilidade de se pensar na vida? Quando pensamos, invariavelmente, estamos avaliando alguma coisa que já aconteceu, ou fantasiando algo que vai ocorrer lá na frente, no futuro. E este pensamento, que nos tira o sono, vai mudar alguma coisa que já aconteceu? Ou vai alterar algo no futuro?
Outro poeta, o Cazuza, dizia: “vida louca vida, vida breve, já que eu não posso te levar, quero que você me leve.” E o caminho é por aí mesmo: a vida é para ser vivida, de forma natural e fluida. Assim como um rio. Vocês já imaginaram o Rio São Francisco planejando uma curva? Ou o Amazonas se arrepender de ter inundado um igarapé?
Muito dessa mania de pensar a vida vem de um pressuposto segundo o qual o pensamento gera inteligência, como se as pessoas sábias fossem aquelas que pensam muito e sabemos bem que isto não é verdade. De fato, se analisarmos melhor, veremos que a inteligência vem antes do pensamento. Antes mesmo que o nosso cérebro seja formado, uma inteligência já coordena e constrói cada parte de nosso corpo em estado embrionário.
Isto é, há, em tudo, esta inteligência que impregna e permeia todas as coisas manifestas, inclusive nós mesmos. Esta inteligência é a própria vida que, num momento, manifesta-se de uma forma, e em outro momento, retorna à sua fonte. “Olhai os lírios do campo”, dizia o mestre Jesus, “como eles crescem; não trabalham nem fiam”.
Mas nós não conseguimos acompanhar este raciocínio, principalmente porque é uma verdade para ser sentida, vivenciada. Julgamo-nos muito importantes, temos certeza absoluta de que somos, como dizia Raul Seixas, “um doutor, um padre ou um policial que está contribuindo com sua parte para o nosso belo quadro social.”
Resultado: uma população mundial que, ao invés de tirar lições de lírios, vive delírios sobre quem é ou o que faz. E não é só isso: este comportamento de “pensar na vida” gera sofrimento. O sofrimento vem da análise da vida, não desta em si.
É lógico que existem condições indesejáveis, que existe dor, que existe luto e perdas, mas é preciso saber que cada condição negativa tem o seu começo e o seu fim: “não há bem que sempre dure nem mal que nunca se acabe.” Mas a vida não, a vida continua, sempre e sempre. Não por acaso, o contrário de morte é nascimento, não vida como se costuma dizer.
Quando digo para viver o momento presente, livre de pensamentos, não quero dizer que cada um deva fazer o que quiser, achando que está sempre certo. Isto não é vida, é loucura.
Viver a vida é estar plenamente consciente do momento atual, saber de todas as coisas lindas e imbecis que já fez e não julgar nem umas, nem outras. Viver a vida é saber que temos um futuro sobre o qual não temos o mínimo controle.
Portanto, já é tempo de parar de agir como se fôssemos participantes de algum Big Brother cósmico, no qual o que importa seria a aparência, a forma como nos comportássemos e a qualidade de nossas posições politicamente corretas.
O tempo é agora, o espaço é aqui e a vida pulsa como nunca.
Isto é tudo.
Ah, e um último poeta, Renato Russo: “quando tudo nos parece dar errado, acontecem coisas boas, que não teriam acontecido se tudo tivesse dado certo.”

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL