sexta-feira, 27 de maio de 2011

TIRO DE GUERRA 04-151

Foto publicada no site Free-photos-biz

Capítulo 3 - O resgate do Soldado Raio (ou do raio do soldado)

NO ÚLTIMO CAPÍTULO, como bem recordam, estava eu, na esperança de poder passar o serviço e curtir a minha merecida festa de aniversário, quando um colega, movido a resíduos de frango com quiabo, invadiu a brancura dos banheiros. Percebendo que a guerra química começara, esperei. Como a coisa tomou um rumo destruidor, tive, como comandante da guarda, que intervir.
Ai não teve mesmo jeito. Com um pedaço de toalha camuflando o nariz, avancei de encontro ao fogo cruzado e, perigosamente, me aproximei daquela trincheira mortal. Comecei a implorar pela rendição do amigo-inimigo, insistindo que arriasse logo a munição e deixasse meu vaso em paz. Pensei em arrombar a porta, pois alguém já havia gritado, lá fora, que o sargento já estava subindo as escadas. A esta altura do campeonato, os gases letais já haviam arrasado meio quarteirão e, literalmente, provocado uma evacuação em massa da tropa, ou seja: evacuaram todos, da sala para o pátio, restando, na linha de frente somente eu, o 40 e o cheiro. No desespero, cheguei a pensar numa ação evasiva pelos flancos, mas um pequeno basculante impediria o êxito da retirada.
Meu Deus! E se o home chega aqui agora, pensava eu, enquanto o 40 não parava de bombardear o meu vaso. Como se não bastasse, ainda tive que ficar escutando o danado praticar, numa voz trêmula e em alto e bom som, aquela oração do atirador. Lembram?
“Empunhei o fuzil pelo delgaaaaaaaaado, coloquei no cavaaaaado do ooooombro...” Segundo ele, tratava-se de uma técnica de guerra, que usava sempre nos momentos de cólicas rebeldes. Pra mim, parecia mais uma forma de tortura.
Enquanto isso, não aguentando mais aquele odor insuportável, e que vinha acompanhado da bendita oração do atirador, abandonei, por momentos, a linha de frente, e fui lá fora no pátio, tentar convencer o resto da turma a se reorganizar e retornar novamente aos seus postos. E, para minha sorte, foi o que aconteceu.
Mas, quando tudo parecia resolvido, eis que meu amigo aliviado aponta a cara no corredor e diz:
- Obrigado 37, você me salvou! Só que tem uma coisa: joguei tanto papel que entupi a privada!
Ih, danou tudo! Lá se foi o meu aniversário!
Naquela altura da batalha, o negócio era enfiar a mão e tentar desentupir de qualquer jeito. Nada seria pior do que dobrar a guarda e, justamente no dia da minha festa!
Nisso, escutei estacionar o Fusquinha do Sargento próximo à sede. Gelei de vez. A seguir, escuto o barulho do trinco do portão se abrindo. Agora só mesmo São Raimundo pra me salvar, imaginei. Deixei o banheiro de lado e, como se nada tivesse acontecido, fui, mais que depressa, ao encontro do meu superior, para me apresentar. Tudo acompanhado pelos olhares assustado dos demais. Um verdadeiro ensaio para possíveis traumas de guerra.
É tudo ou nada, pensava comigo mesmo, enquanto caminhava ao encontro do meu destino que, naquele caso, era o Sargento.
Após recebê-lo no corredor de entrada, fui, de imediato, lascando aquela continência e dizendo a célebre e famosa frase:
- Atirador 37, do TG 04 151! Serviço sem Alteração!
As pernas tremiam, pois sabia que teria que conduzi-lo, em revista, a cada setor da sede.
Na guerra, quando perdemos um membro, ou perdemos algum sentido, muitas vezes a melhor solução é esquecer. E assim fiz: não existe banheiro, não existe banheiro, não existe banheiro. Até que...
Não percam, na próxima semana, mais uma batalha...

(Crônica – Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 25 de maio de 2011

A ARTE DE CRIAR ESCORPIÕES

Foto publicada na revista Planeta número 442
Capítulo 1

Esta fábula já deve ser de conhecimento da maioria das pessoas, pois, com frequência, circula pela Internet. Um escorpião, bonitão, e de voz doce e aveludada pede carona a um sapo para atravessar o rio. O sapo argumenta:
- Sai pra lá, malandro. Cê acha que eu vou dar mole pra você? Assim que subir nas minhas costas, você vai me ferroar e soltar seu veneno em mim.
O escorpião não se abalou e argumentou que estava mudado, era outro aracnídeo, e, de mais a mais, se ferroasse o amigo, iriam os dois para o fundo do rio. Tranquilizado pela lábia mansa do escorpião, eis que nosso amigo sapão topou atravessar o escorpião.
Quando estavam chegando do outro lado, o escorpião lascou uma ferroada nas costas do sapo e, enquanto esse sentia os efeitos do veneno e afundava, o escorpião saltou todo serelepe na outra margem. O sapo, sempre de boa fé, ainda perguntou qual era o motivo de tanta crueldade, e, antes de mergulhar completamente, ouviu o escorpião dizendo, sorridente:
- Porque essa é minha natureza!
Outro dia, veio uma senhora, que mora aqui perto, até minha casa, me pedindo uns “conselhos” pra lidar com o seu filho que estava passando por problemas. Eu nunca dou conselhos, mas, às vezes, as normas de boa vizinhança, indicam que devemos ouvir as pessoas. E assim, fiquei escutando ela dizer como o filho, um “menino” de 29 anos, estava tendo problemas. Acho que ele está usando drogas, sabe? Porque, normalmente, ele é uma pessoa muito boa. Carinhoso comigo, um amor. Mas tem os amigos, o senhor entende, as más companhias. Outro dia, eles estavam num barzinho desses aí e teve uma briga e o Ronaldinho (nome fictício) resolveu separar. Resultado: acabou preso, disseram que ele bateu com o capacete da moto na cabeça de um rapaz, que teve que levar uns pontos. Ele foi preso, mas é por causa dos outros, que foram embora e deixaram ele na mão.
Contou que, para pagar o advogado, ele acabou tendo que vender a televisão de LCD da irmã, que ela não concordou e, sem querer, ele acabou empurrando ela e parece que ela machucou o braço. Mas não quebrou não, sabe? Eu pedi pra ela não dar queixa porque senão ele iria voltar direto pra cadeia.
Coitado, no serviço, acabaram não aceitando ele de volta. E ainda deu azar porque o banco veio e tomou a moto dele. Eles não entendem que ele depende daquela moto para sobreviver. Aí eu vim aqui, conversar com o senhor, porque ele diz que não vem de jeito nenhum, porque o pessoal aproveita que ele é um rapaz de bem, e fica fazendo um monte de sacanagem com ele. O que é que o senhor acha?
Eu acho que eu não gostaria de receber o seu filho aqui na minha casa, digo, tranquilo e sincero. E a senhora vá com Deus, que Ele a ilumine!
Gente, é enorme a quantidade de pessoas que convivem com esses seres, rotulados pela psiquiatria como portadoras do Transtorno de Personalidade Antissocial, ou perversos, ou sacanas, ou “espertos”. São aqueles colegas ou conhecidos que pedem dinheiro emprestado e não pagam, esquecem de devolver coisas emprestadas, usam algum tipo de droga ilícita e, eventualmente, cometem algum tipo de delito. Coisa boba, dizem.
(continua)

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 20 de maio de 2011

TIRO DE GUERRA 04-151

Arte digital por Mark Brooks

Capítulo 2 - O mais longo dos dias

NA SEMANA PASSADA, tiro de guerra, guarda, guarita, coturno, todo esse dialeto ao qual nos acostumamos quando estávamos com dezoito anos, voltou. E com carga total. Os e-mails recebidos atestam que esta fase difícil nunca saiu de nossas memórias e do nosso imaginário. De repente, 40 não é mais um número, mas um camarada que me deixou numa enrascada, 37 sou eu e 24 era um cara muito engraçado que trabalhava na padaria.
Bom, fui me empolgando e esqueci: banheiro é banheiro, e, se não estiver limpo, a guarda dobra. Mas, isso é só um mau pensamento, que eu devo esquecer, pois, afinal de contas, era o dia do meu aniversário.
Era uma manhã gelada de sábado, mas, felizmente, tudo transcorria, até então, na mais perfeita ordem e harmonia. “Sem alteração”, a gente falava. Sabíamos, de antemão, que um oficial graduado do Exército Brasileiro estaria sendo aguardado para uma visita de inspeção. Razão pela qual, naquela noite, por várias vezes, tivemos visitas surpresa do Sargento, para se certificar de que a limpeza estaria além da expectativa.
Pois foi justamente naquela manhã, quando já faltavam pouco mais de cinco minutos para a chegada do nosso instrutor, que se aproximou de mim o atirador de número 40. Pálido e segurando a barriga com as mãos, me implorou, quase que de joelhos, para usar a todo custo o banheiro. Disse que havia comido uma galinha com quiabo e que tinha dado um “reverterio” danado. Como assim, perguntei! Não faz isso comigo não!
O home já tá chegando aí pra passar em revista a sede. O banheiro tá um brinco e é um dos primeiros a ser checado. Corre ali debaixo da goiabeira daquele terreno baldio em frente e deixa acontecer naturalmente! Eu mesmo já fui lá varias vezes, concluí. Num dá tempo 37, dizia ele, enquanto, de pálido, passou a ficar vermelho. É... seja o que Deus quiser, pensei. Vai dar “merda” mesmo! Pelo menos, faço uma boa ação.
Pedi que, pelo menos, fosse o mais rápido e objetivo possível, pois era norma do TG não deixar nenhum atirador usar o banheiro antes da inspeção. Exceto o cabo da guarda e os três sentinelas. Enquanto isso, com um olho no banheiro e outro no relógio, um tanto ansioso, não via a hora em que o 40 acabasse de cumprir sua difícil missão.
De repente, comecei a perceber que o negócio no banheiro ia de mal a pior. Um odor nada agradável começava a tomar conta de toda a sede, enquanto o 40 não parava de gemer.
Poxa, mas tinha que comer quiabo com frango justamente no dia da minha guarda? Ou melhor, descarregar a galinha enquiabada na hora de entregar meu serviço?
A coisa tava tão braba que não haveria tática de guerra, grupo de choque ou de combate que desse jeito. Pelo menos, que eu soubesse, até então nada constava ou fazia referência em nosso glorioso Regulamento Disciplinar do Exército. Era artilharia pesada mesmo! E acompanhada de barulhos que mais pareciam arma de repetição. Era a busca da sobrevivência diante de agentes químicos que, cheirando a pólvora, espalhavam-se por todas as direções. Verdadeira guerra fria entre irmãos.
- O sargento tá chegando – gritou o batedor. Batedor era o atirador que ficava de olho na escada e, quando o home chegava, batia pra gente.
Olhei para a sala de instrução: aquelas cadeiras vazias pareciam ter adquirido vida própria e ficavam me acusando: vai dobrar, vai dobrar! Já nem sabia mais se o 40 ainda estava consciente, ou havia desmaiado em meio aos gases e à artilharia. O que fazer?
NÃO PERCAM, na próxima semana, O Resgate do Soldado Raio, cujos detalhes não posso revelar (é confidencial). Só digo uma coisa: a coisa vai feder!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

REALMENTE VIRTUAL

Arte digital por Eran Cantrell

Na porta do colégio, esperando a saída do meu filho, ouço mães conversando. Há grande preocupação quanto aos hábitos cibernéticos dos filhos. Gente, há quanto tempo não ouço essa palavra aí – cibernética! Não é possível, diz uma delas: eles vivem num mundo absolutamente virtual. Ninguém conhece ninguém, todos usam nicknames, cada um assume uma personalidade que nunca é real. E o vocabulário então? É hshuahshuahshua ou rsrsrs, essas coisas.
Fico pensando: qual é mesmo a diferença entre o mundo virtual, onde cada um assume um tipo de persona (máscara) para interagir com a comunidade, e o “nosso” mundo? Ou: qual é a diferença entre as pessoas com as quais a gente convive na vida dita “real” (e não sabe, de verdade, quem são) e as pessoas com as quais a gente tecla na net (e não sabe, de verdade, quem são)?
A verdade é que baseamos nossa vida em imagens. De cara, já começamos construindo uma imagem sobre nós mesmos: é o ego. A intenção até é boa, porque, se você não tem uma autoimagem, quando perguntarem “quem é você?”, você talvez não saiba responder. Então, o ego veio, não só para conectar a pessoa ao chamado mundo real, mas, também, para defender sua integridade.
Então, a coisa funciona mais ou menos assim: criamos uma imagem de nós mesmo e, quando nos perguntam quem somos, respondemos aquilo que achamos que somos e, se alguém nos contestar, partimos para a briga. Aí, dizem: nossa, que pessoa egoísta! Na verdade, podemos dizer: puxa, que pessoa temerosa de perder a identidade com a imagem que criou!
O que é pior nesse processo de criação de imagens é que, também com as pessoas que nos cercam, maridos, mulheres, filhos, pais, mães, amigos, criamos um “nick” para cada um e, se ocorre – e ocorre sempre – que a imagem não corresponda à realidade, então ficamos chateados: como é que ela pôde fazer isso comigo? O que será que eu fiz de errado pra esses meninos agirem desta maneira? E por aí vai...
Me lembro de um caso, não sei se é verdade, de um menino de rua de Juiz de Fora, que foi chamado por um grupo de teatro, para ir até as escolas da cidade, vestido de coelhinho da Páscoa, com uma daquelas máscaras enormes de papelão. Na verdade, nenhum dos atores queria pagar o mico de sair pela rua com aquele cabeção, que não tinha nem buraco para os olhos. Pois é, o menino foi tão abraçado, acariciado e amado por todos, que aconteceu uma coisa engraçada: quando saiu da última escola, nosso “coelhinho”, que mais parecia um bombom recheado, daqueles branquinhos por fora e preto por dentro, tirou a roupa com rabinho, entregou, mas, como dizem, rapou fora com a máscara na cabeça. Correram atrás dele, disseram que ele roubou a máscara, que a gente não pode tentar ajudar essas pessoas e até que iam fazer um B.O. na delegacia mais próxima (furto de cabeça de coelho, será que eles registram?). O fato é que o menino, que nunca se sentira tão amado, resolveu não tirar mais aquela máscara: foi pra casa, dormiu com ela, sonhou e, cedinho na manhã seguinte, voltou para sua esquina favorita pra pedir umas moedas, com aquela cabeçona, mas também com uma esperança e uma alegria que não cabiam no peito.
Aí, vem essas mães falar em realidade. Senhoras, senhoras! A única diferença, se é que há, entre a nossa vida no dia a dia e a vida on line, é que esta pode ser interrompida por um pico de energia, e a nossa continua... Mas, cuidado na hora de atravessar a rua! Vai que...

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 13 de maio de 2011

TIRO DE GUERRA 04-151

Frame do filme Full Metal Jack (Nascido para Matar), de Stanley Kubrick

Capítulo 1 - De guarda

Fim de mais um dia de instrução, e eu, fatigado, morrendo de fome, via meu nome ser estampado na escala do quadro-negro da sala de instrução do Tiro de Guerra.
Não acredito! Logo hoje? E justamente na véspera do meu aniversário?
Pra piorar ainda mais a situação, era uma sexta-feira, e uma pequena festa já havia sido programada por parentes, amigos e namorada.
Bem! Nem tudo estava perdido, pensei! Pelo menos, estamos na véspera e não no dia.
E assim, muito a contragosto, lá pelas cinco e trinta da tarde, vesti a velha farda, calcei meu coturno, firmei o manual pelo sovaco, peguei meu pão com queijo e minha garrafa térmica de chá-mate e me mandei em direção à avenida. Enquanto descia em direção a sede, tentava ir conversando comigo mesmo, tentando me consolar na justificativa de que meu aniversário seria mesmo no outro dia.
E que noite cansativa foi aquela! Coincidentemente, fui premiado com a companhia de três irmãos atiradores (sentinelas) que faziam de tudo, inclusive nada. Por sinal, verdadeiros amigos que ficarão guardados com muito carinho na lembrança.
Foi uma das noites mais frias que passei, pois, enquanto ali cumpria meus deveres de Cabo da Guarda, já quase congelado, via o dia amanhecer.
Havíamos trabalhado na faxina até pouco mais das onze da noite, pois nada poderia sair errado. Como todo atirador que se preza, sabíamos de antemão que, antes mesmo do dia clarear, salvo em caso de guerra, lá estaria nosso garboso comandante, a passar em revista a tropa, ou melhor, o dedo, em cada centímetro dos móveis à procura de vestígios de poeira. Dobrar a guarda em caso de alguma alteração no serviço, nos fazia tremer na base. Era complicado para nós, principalmente se estivéssemos no comando. Administrar a limpeza da sede, especialmente quando tínhamos a companhia de alguns atiradores que só queriam mesmo era bagunçar, dava mesmo vontade de chorar. As horas iam se passando, o cansaço só aumentando e o serviço não rendia.
E se um daqueles três vasos sanitários do banheiro não ficasse brilhando como espelho e cheirando a Pinho Sol? Aí é que a coisa ficava feia pro nosso lado. Isso para não falar que ainda tínhamos que fazer a limpeza da área externa: varrer o passeio, regar as árvores da rua, molhar com um regador a calçada, dar um trato no pátio, limpar a secretaria e a sala do Sargento (essa então!).
Mas, confesso que minha preocupação maior sempre foi com aquele bendito banheiro e seus três imponentes vasos. Já cheguei até a sonhar com eles. Certa vez, um Cabo da Guarda chegou a passar quase que a noite toda acordado, apenas para ficar vigiando uma possível sabotagem dos atiradores. Era muito comum alguns abdicarem de consultar a alça de mira na hora de encarar o vaso, e errar o alvo de propósito, só pra sacanear. No outro dia era aquele cheiro de banheiro biológico tendo que ser limpo às pressas e em poucos minutos. Isso nunca aconteceu em minha guarda, mas reinava a expectativa de que um dia isso poderia acontecer.
Nossa missão era manter, tanto a parte interna, quanto a externa da sede impecavelmente limpas e, se possível, melhor do que nossa própria casa. E isto quase sempre acontecia.
Até que... naquela fatídica manhã do meu aniversário...
(continua)

(Crônica: Serjão Missiaggia)

SOBRE ANJOS E DEMÔNIOS

Arte digital por Guangjian Huang

Caçaram o maior terrorista do mundo e, numa operação tipicamente terrorista, detonaram o sujeito. Festas nas ruas dos Estados Unidos, comemorando a eliminação do “demônio”. Há uns trinta ou quarenta anos atrás, era o governo do Irã e do Iraque que conclamava a população a combater o “grande satã”, os Estados Unidos.
Enquanto isso, correntes atravessam a Internet, pregando o perdão, dizendo que temos que ser magnânimos, santos e altivos.
Daqui destes cantos mineiros, fico pensando por que é que as pessoas investem tanta vida, tanto esforço e tanto intelecto, tentando ser santos, ou julgando, e condenando os outros a serem demônios.
Pra falar a verdade, anjos eu nunca vi não, nem mesmo dos tais caídos, os do mal, ou demônios. Mas eu, francamente, não penso que Deus tenha assim uma expectativa de que sejamos, aqui na Terra, todos santos. Penso isso porque eu, que nem um pai tão bom sou, jamais fico fazendo expectativas em relação aos meus filhos, do tipo que eles serão um Bill Gates ou, vai que, um Bill Clinton, ou até um papa. Ora, se eu não faço esse tipo de expectativa, até porque é muito peso pra colocar nas costas de uma criança, como é que pode o Pai Celestial ficar contando com que sejamos exatamente iguais a Ele? Aliás, pelo pouco que eu sei de Bíblia, foi por querer ser tão translúcido quanto Deus, que o então rei dos Querubins caiu em desgraça e foi expulso do Céu pelo arcanjo Miguel.
Desta forma, eu, que não sou santo mesmo, não consigo, face a um sociopata, seja ele um terrorista, um pedófilo ou mesmo um vizinho mal intencionado, ter mesmo aquela compaixão que algumas pessoas vêm cobrando via e-mail. Para não errar, faço o seguinte raciocínio: esta pessoa, que está sendo perseguida pelos seus crimes, poderia se abrigar aqui dentro da minha casa? Certamente que não, né?
Então, meus amigos, não vamos querer ser santos nem anjos, porque nosso papel, aqui nesta terrinha, é sermos homens e, se conseguirmos ser homens, úteis, construtores de boas coisas e, pelo menos, suportarmos o próximo (olha que não precisa nem amar), creio que o Pai Celeste irá se regozijar.
Mas, por favor, gente, só porque não temos esta obrigatoriedade de sermos anjos, também não quer dizer que tenhamos que ser demônios. Então, de cara, vamos, primeiro, parar de julgar os outros, do tipo “aquele lá, oooo” ou “aquela ali, iiii”. Depois, vamos parar com essa mania de sair apregoando por aí que nós somos assim, e eles, coitados, são daquele jeito, só porque não fizeram certas coisas que nós achamos que são importantes.
Renato Russo, bebendo da famosa Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, dizia, do alto do seu Monte Castelo, que, “ainda que eu falasse a língua dos homens, e falasse a língua dos anjos, sem amor, eu nada seria.”
Queria que a coisa ficasse assim, sem cara de sermão, nem sacrilégio, mas viver, de vez em quando, adquire esta característica de declaração de imposto de renda, que fica impossível enxergar o filho brincando, o brilho do olho da mulher amada, até mesmo a chuvinha fina escorrendo na janela.
É quando somos mais humanos e, estranhamente, tão difícil de compartilhar...

(Crônica: Jorge Marin)

BLOGGER INDISPONÍVEL

Nosso hospedeiro, o Blogger, esteve indisponível por problemas técnicos, o que atrasou a postagem de quarta-feira.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

O TOQUE

Foto de Stock Royalty Free

Capítulo 4 - Final

NA SEMANA PASSADA, sei que vocês se lembram, pois estamos recebendo e-mails afetuosos sobre o assunto, a fila do exame de próstata permanecia parada. Juraci havia entalado na porta do CEASM e houve um princípio de tumulto. Uma funcionária saiu, fez um discurso para os marujos de primeira viagem, e os dito cujos relaxaram um pouco.
Mas, infelizmente, daí em diante, não pude mais acompanhar. A única coisa que posso afirmar, com certeza, é que o Juraci entrou. Se fez o exame, aí é outra história!!!
Para terminar, e até para atestar o nível de veracidade dos nossos causos, convido-os a darem uma olhadinha no jornal Sul da Mata, de 30 de setembro de 2007. Na referida edição, foram narrados dois fatos hilários que ocorreram naquele dia.
Irei resumi-los.
Um sujeito que estava na fila já havia um bom tempo. ao chegar sua vez, emocionou-se e, um tanto exaltado, falou:
- Agora quem não quer sou eu! - E foi rapidinho rasgando sua senha e virando, mais do que depressa, a esquina.
Teve uma outra figura que chegou ao local sem ter feito o exame de sangue. Após várias tentativas, todas em vão, para que achassem sua veia, resistiu bravamente, embora um tanto nervoso, e conseguiu, não só tirar o sangue, mas também esperar o toque retal, até que, extenuado e lívido, caiu desmaiado.
Agora, imaginem vocês, que susto deverá ter levado aquele pessoal, que estava na varanda aguardando a vez, ao verem o tal sujeito sair da sala carregado?
Enfim, antes de terminar, já ia me esquecendo de contar outro fato: no finalzinho da fila, apareceu, de repente, uma figura. Até aí tudo normal, se, por acaso, o tal sujeito não estivesse de bicicleta e, por cima, carregando uma imensa gaiola na garupa. Dentro da mesma, um lindo curió. Segundo fui informado, esta figura, ao passar em frente ao local, e vendo aquele movimento, simplesmente entrou na fila, assim do nada. Confesso que fiquei até com pena do tal sujeito. Pela sua aparente inocência e simplicidade, o coitado deveria estar imaginando que, naquele momento, algum político poderia estar distribuindo cestas básicas ou afins, para o povão. Se bem que, se formos analisar filosoficamente, o jogo político tem muito de exame de próstata mesmo, embora não ocorra todo ano, ou em todos os anos. Voltando ao inocente, não sei, nem seu destino, nem o de seu belo curió. Será que ele deu de presente? Não quero nem pensar.
Finalmente, falando sério, reconheço e parabenizo as autoridades e profissionais da saúde, por tão bela e nobre iniciativa. Como não poderia jamais deixar de ser, somos também, e como, conscientes da importância e da necessidade do referido exame.
Afinal, entre Trancados e Penetrados, todos se salvaram!!!

TOQUE FINAL: Ao chegar com os pães, em casa, fui surpreendido pela minha querida filha, com um pedido, a meu ver, um tanto indecoroso e assustador. Sem nenhum preparo psicológico, foi logo dizendo:
- Paizinho! Vou querer, de presente de aniversário, o seu exame de próstata!
- Ih, lá se foi meu café!

TOQUE FINAL 2 (contado por testemunhas idôneas): Serjão continuava sua greve de fome. Os filhos, famintos, chamavam: vem, pai! Vem, pai! Ele, até porque bastante traumatizado com tudo, gritou:
- Lanchem vocês! Já coloquei tudo aí em cima da mesa. Podem comer: tem pão, presunto, queijo-minas e torrada. – e emendou:
- Mas, na minha rosquinha, ninguém mexe!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 4 de maio de 2011

O PESO (LEVE) DO SILÊNCIO

Arte digital por Karen Koski

Dizem que dois monges peregrinavam por várias cidades, como é comum aos jovens monges no Oriente, quando se depararam com uma moça chorando na beira do rio. Irmã, por que está chorando? – perguntou um dos monges. E ela explicou que havia atravessado o rio mais cedo para colher frutos e não percebeu que, talvez devido a alguma enchente na cabeceira do rio, este havia enchido e aumentado de volume, o que estava impedindo que ela voltasse para casa, pois não sabia nadar. Consternado, o monge entrou na água, pediu que ela subisse em seus ombros, e a atravessou. A moça correu feliz para casa e os dois monges seguiram caminho.
Depois de um certo tempo, o outro monge, inquieto, não pôde segurar sua indignação e repreendeu o colega, dizendo: meu irmão, o que foi que você fez? Estamos em nossa senda para a santidade e fizemos um voto de jamais tocar uma mulher. Você está repleto de pecados. Vai me dizer que não teve nenhum prazer em tocar aquela moça?
O primeiro monge respondeu: puxa, eu deixei aquela menina do outro lado do rio há mais ou menos umas duas horas atrás, e você ainda está carregando ela até agora?
Gosto destas pequenas parábolas porque falam de coisas simples, e não dão nenhuma lição de moral, embora nos façam pensar. Da mesma forma que o segundo monge, passamos a vida inteira carregando o fardo de nossos preconceitos, nossos julgamentos e nossas preocupações. Alguém pode dizer: carrega porque quer, como se fosse possível, de uma hora para outra, pegar esta tralha toda, colocar no chão, e sair assobiando uma música do Raul Seixas.
Sou uma daquelas pessoas que tem esta maldição chamada zumbido de ouvido. Faço parte de uma comunidade que não conhece o silêncio exterior. Pois bem, para se ver livre desse fardo do qual estou falando, seria necessário obter o completo silêncio interior. Mas, como atingir tal estado, se somos treinados para, a todo instante, buscar objetivos, atingir metas, adquirir bens? Qualquer livro que leiamos, vai indicar que, para atingir qualquer objetivo, temos que traçar planos, metas claras, e persegui-las. No entanto, este processo de resolução “gradual” dos nossos problemas, só vai trazer mais ruído para o nosso pensamento, mais embaçamento para nossa alma, e mais peso para nossas costas. Quanto mais autoridade, saber externo e dogmatismo, mais barulho, mais confusão e mais conflito vão nos atingir.
Meu Deus, mas há um caminho para chegar àquele silêncio interior? Se há, pode ser um excelente presente para o Dia das Mães.
Que silêncio é esse que não é só falta de barulho, nem desligamento do pensamento?
Eu poderia fazer como nos causos do Serjão e terminar a crônica aqui, dizendo: não percam, na próxima semana, a fórmula para se atingir o silêncio interior, e livrar-se dos fardos da vida. Mas, não é esta a questão: qualquer sugestão que eu pudesse fazer, qualquer instrução, ou mesmo qualquer dica, ainda assim, seria uma fórmula, um discurso, um tipo de autoridade que não quero exercer e nem estou qualificado para tanto.
Este silêncio é um estado de frescor e vitalidade que não dá nem para descrever em palavras. Sabem quando a gente coloca o ouvido numa concha de mar e tem a sensação de estar escutando o oceano ali dentro? Pois bem, imaginem-se entrando pela concha e saindo do outro lado, dentro do oceano, de um mundo de água azul e calma. Esta é (deve ser) a sensação de uma mente tranquila, que não se deixa iludir pelas armadilhas, nem do tempo, nem do espaço. Ou, como diz aquela música dos Titãs: “Marvin, agora é só você...”

(Crônica: Jorge Marin)

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL