quinta-feira, 19 de maio de 2011

REALMENTE VIRTUAL

Arte digital por Eran Cantrell

Na porta do colégio, esperando a saída do meu filho, ouço mães conversando. Há grande preocupação quanto aos hábitos cibernéticos dos filhos. Gente, há quanto tempo não ouço essa palavra aí – cibernética! Não é possível, diz uma delas: eles vivem num mundo absolutamente virtual. Ninguém conhece ninguém, todos usam nicknames, cada um assume uma personalidade que nunca é real. E o vocabulário então? É hshuahshuahshua ou rsrsrs, essas coisas.
Fico pensando: qual é mesmo a diferença entre o mundo virtual, onde cada um assume um tipo de persona (máscara) para interagir com a comunidade, e o “nosso” mundo? Ou: qual é a diferença entre as pessoas com as quais a gente convive na vida dita “real” (e não sabe, de verdade, quem são) e as pessoas com as quais a gente tecla na net (e não sabe, de verdade, quem são)?
A verdade é que baseamos nossa vida em imagens. De cara, já começamos construindo uma imagem sobre nós mesmos: é o ego. A intenção até é boa, porque, se você não tem uma autoimagem, quando perguntarem “quem é você?”, você talvez não saiba responder. Então, o ego veio, não só para conectar a pessoa ao chamado mundo real, mas, também, para defender sua integridade.
Então, a coisa funciona mais ou menos assim: criamos uma imagem de nós mesmo e, quando nos perguntam quem somos, respondemos aquilo que achamos que somos e, se alguém nos contestar, partimos para a briga. Aí, dizem: nossa, que pessoa egoísta! Na verdade, podemos dizer: puxa, que pessoa temerosa de perder a identidade com a imagem que criou!
O que é pior nesse processo de criação de imagens é que, também com as pessoas que nos cercam, maridos, mulheres, filhos, pais, mães, amigos, criamos um “nick” para cada um e, se ocorre – e ocorre sempre – que a imagem não corresponda à realidade, então ficamos chateados: como é que ela pôde fazer isso comigo? O que será que eu fiz de errado pra esses meninos agirem desta maneira? E por aí vai...
Me lembro de um caso, não sei se é verdade, de um menino de rua de Juiz de Fora, que foi chamado por um grupo de teatro, para ir até as escolas da cidade, vestido de coelhinho da Páscoa, com uma daquelas máscaras enormes de papelão. Na verdade, nenhum dos atores queria pagar o mico de sair pela rua com aquele cabeção, que não tinha nem buraco para os olhos. Pois é, o menino foi tão abraçado, acariciado e amado por todos, que aconteceu uma coisa engraçada: quando saiu da última escola, nosso “coelhinho”, que mais parecia um bombom recheado, daqueles branquinhos por fora e preto por dentro, tirou a roupa com rabinho, entregou, mas, como dizem, rapou fora com a máscara na cabeça. Correram atrás dele, disseram que ele roubou a máscara, que a gente não pode tentar ajudar essas pessoas e até que iam fazer um B.O. na delegacia mais próxima (furto de cabeça de coelho, será que eles registram?). O fato é que o menino, que nunca se sentira tão amado, resolveu não tirar mais aquela máscara: foi pra casa, dormiu com ela, sonhou e, cedinho na manhã seguinte, voltou para sua esquina favorita pra pedir umas moedas, com aquela cabeçona, mas também com uma esperança e uma alegria que não cabiam no peito.
Aí, vem essas mães falar em realidade. Senhoras, senhoras! A única diferença, se é que há, entre a nossa vida no dia a dia e a vida on line, é que esta pode ser interrompida por um pico de energia, e a nossa continua... Mas, cuidado na hora de atravessar a rua! Vai que...

(Crônica: Jorge Marin)

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