Arte digital por Guangjian Huang
Caçaram o maior terrorista do mundo e, numa operação tipicamente terrorista, detonaram o sujeito. Festas nas ruas dos Estados Unidos, comemorando a eliminação do “demônio”. Há uns trinta ou quarenta anos atrás, era o governo do Irã e do Iraque que conclamava a população a combater o “grande satã”, os Estados Unidos.
Enquanto isso, correntes atravessam a Internet, pregando o perdão, dizendo que temos que ser magnânimos, santos e altivos.
Daqui destes cantos mineiros, fico pensando por que é que as pessoas investem tanta vida, tanto esforço e tanto intelecto, tentando ser santos, ou julgando, e condenando os outros a serem demônios.
Pra falar a verdade, anjos eu nunca vi não, nem mesmo dos tais caídos, os do mal, ou demônios. Mas eu, francamente, não penso que Deus tenha assim uma expectativa de que sejamos, aqui na Terra, todos santos. Penso isso porque eu, que nem um pai tão bom sou, jamais fico fazendo expectativas em relação aos meus filhos, do tipo que eles serão um Bill Gates ou, vai que, um Bill Clinton, ou até um papa. Ora, se eu não faço esse tipo de expectativa, até porque é muito peso pra colocar nas costas de uma criança, como é que pode o Pai Celestial ficar contando com que sejamos exatamente iguais a Ele? Aliás, pelo pouco que eu sei de Bíblia, foi por querer ser tão translúcido quanto Deus, que o então rei dos Querubins caiu em desgraça e foi expulso do Céu pelo arcanjo Miguel.
Desta forma, eu, que não sou santo mesmo, não consigo, face a um sociopata, seja ele um terrorista, um pedófilo ou mesmo um vizinho mal intencionado, ter mesmo aquela compaixão que algumas pessoas vêm cobrando via e-mail. Para não errar, faço o seguinte raciocínio: esta pessoa, que está sendo perseguida pelos seus crimes, poderia se abrigar aqui dentro da minha casa? Certamente que não, né?
Então, meus amigos, não vamos querer ser santos nem anjos, porque nosso papel, aqui nesta terrinha, é sermos homens e, se conseguirmos ser homens, úteis, construtores de boas coisas e, pelo menos, suportarmos o próximo (olha que não precisa nem amar), creio que o Pai Celeste irá se regozijar.
Mas, por favor, gente, só porque não temos esta obrigatoriedade de sermos anjos, também não quer dizer que tenhamos que ser demônios. Então, de cara, vamos, primeiro, parar de julgar os outros, do tipo “aquele lá, oooo” ou “aquela ali, iiii”. Depois, vamos parar com essa mania de sair apregoando por aí que nós somos assim, e eles, coitados, são daquele jeito, só porque não fizeram certas coisas que nós achamos que são importantes.
Renato Russo, bebendo da famosa Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, dizia, do alto do seu Monte Castelo, que, “ainda que eu falasse a língua dos homens, e falasse a língua dos anjos, sem amor, eu nada seria.”
Queria que a coisa ficasse assim, sem cara de sermão, nem sacrilégio, mas viver, de vez em quando, adquire esta característica de declaração de imposto de renda, que fica impossível enxergar o filho brincando, o brilho do olho da mulher amada, até mesmo a chuvinha fina escorrendo na janela.
É quando somos mais humanos e, estranhamente, tão difícil de compartilhar...
(Crônica: Jorge Marin)
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