quarta-feira, 17 de julho de 2013

OS PERVERSOS SEMPRE VÃO PARA O CÉU


Quarta à noite era o dia de ouvir histórias.  Minha mãe pegava algum livro grande e, sentados na enorme cama de casal, líamos enquanto esperávamos que meu pai voltasse da fábrica.

A verdade é que, aos cinco anos de idade, todo livro é enorme.  E como eram fantásticas aquelas ilustrações!  Trinta e cinco janelas para o mundo, O livro da juventude e, o meu preferido, a Bíblia Ilustrada.  Este último, além de me encantar causava, às vezes, um grande medo.

Minha mãe sabia do que eu tinha medo, e lia, e relia só as histórias da Bíblia das quais eu gostava: uma delas, a de Absalão, filho do Rei David, me deixava eletrizado e minha mãe tinha que contá-la várias vezes.

Às vezes, eu adquiria uma certa coragem e pedia pra mãe que me mostrasse aquela página do medão: era o Inferno!  Num braseiro, literalmente infernal, montes de pessoas sem roupa eram espetadas e torturadas pelos demônios, enquanto um demoniozão grandão, meio homem meio cobra, passeava feliz pela paisagem assustadora.

É pra lá que vão as pessoas más – dizia minha mãe.  E eu só queria saber de rezar e ficar bem quietinho e obediente, pois ela também dizia que quem fosse pra LÁ (a gente nem falava a palavra “inferno”), ia ficar para sempre.  E para sempre parecia ser muito tempo!

Hoje, minha mãe já foi para o Céu e eu nem sei onde foi parar aquele livrão da Bíblia Ilustrada.  Ainda que eu o encontrasse, provavelmente não seria tão grande como nos anos 60.  Absalão é personagem de minissérie e o Inferno...  Bem, esse local ainda mexe muito com minha imaginação.

Fico pensando: hoje as pessoas são tão perversas, mas tão perversas, que talvez ir para aquele local (que hoje seria como um baile funk turbinado) até que seria uma aventura muito excitante pra eles.

Será que a população de perversos aumentou?  Ou será que o medo do Demônio os fazia ficar mais contidos?  Maquiavel sempre dizia que preferia ir para o Inferno; e explicava: “lá gozarei da companhia de papas, reis e príncipes.  No céu, só terei por companhia mendigos, monges, eremitas e apóstolos”.  Eu ainda não vejo o tal lugar com bons olhos.  Cruz credo!

Crônica: Jorge Marin

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