quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

VAMO FAZÊ KAIZEN, NON?

Ilustração do site www.cultura-japonesa.blogspot.com

Aquele texto do Sylvio sobre Vida Medieval me fez lembrar minha carreira profissional. Sim, meus amigos, eu cumpri os tais 35 anos. E, pior, como bancário. Poderiam perguntar: o que leva alguém a querer ser bancário. Hoje, 38 anos depois, eu sei: é porque eu não aprendi a tocar nenhum instrumento. Diferente dos meus colegas do Pytomba, eu não tocava nada, e não cantava nada também. Na verdade eu não queria ser músico: eu queria é pegar aquele monte de meninas que eu achava que eles pegavam. Depois, um dos componentes me disse que não pegava mulher por causa da música, e sim porque tinha carro. Naquela lógica, esta sim bem medieval, pensei: todo bancário tem carro. Logo...
Bem, a dura realidade foi que tive que vender o carro pra comprar casa, comida, fraldas, estas coisas.
Um dia, sentado na minha mesa (depois inventaram as bancadas), chega o meu gerente com uma novidade:
- Agora vamos fazer o Kaizen.
Ficamos intrigados com aquela palavra. E o gerente, com toda aquela pose, começou a nos explicar que era uma palavra japonesa que significava “mudança para melhor”. Um gaiato perguntou: vamos ter aumento? Mas o gerente continuava, maravilhado, sua explanação. Meu padrinho, Manuel Florindo, que viveu na época dos escravos, me dizia que gerente é o mesmo que feitor, ou seja, aquele cara que toma café com o coronel e depois vai “gerenciar” os escravos. Em suma, é o que suja as mãos.
A partir daquele momento, teríamos que nos habituar, pois o banco adotara a Teoria dos 5 S. Então, tivemos que decorar que faxina chamava Seiton, eliminar o desnecessário era Seiri, manter limpo era Seiso, higiene era Seiketsu, e a disciplina era Shitsuke. Introjetei tanto aqueles princípios que arrumei até uma seitoneira para fazer faxina lá em casa. Um gozador, sempre tem um, dizia que, para ele mudar pra melhor, os 5 S seriam: sexo de manhã, sexo de tarde, sexo de noite, sexo casual e sexo domingo à tarde (depois do futebol).
Mas, como sempre fui muito obsessivo, fui escolhido para ir a Belo Horizonte, treinar a teoria, sob a assessoria de um mestre japonês, legítimo, vindo direto do Japão. Este mestre não falava uma palavra de português, mas tinha uma tradutora que o acompanhava em todas as palestras. Eu só o encontrei sozinho uma vez, e justamente no refeitório. Como não havia lugar, tomei coragem e resolvi sentar junto com o mestre. Cheguei meio reticente, e, pra ele não achar que eu era muito burro, tentei arranhar um inglês:
- May I sit?
O cara levantou-se, olhou firmemente pra mim (pensei, ih, falei esta droga errado!). Mas, para minha surpresa, ele levantou-se, fez aquela genuflexão que os orientais fazem, sorriu, e disse:
- Itada Kimasu, Itada Kimasu!
Para retribuir a gentileza, fiz o mesmo que ele e me apresentei:
- Jorge Marin, Jorge Marin!
Este ritual se repetiu mais uns dois dias, até que, comentando com um colega nissei que o velho mestre teimava em se apresentar todos os dias, o amigo me explicou que, na verdade, itadakimasu era “bom apetite” em japonês.
Envergonhado, mas disposto a reparar a minha gafe internacional, parti no dia seguinte para o refeitório, mas... Decepção, o mestre não estava lá. Quando eu já estava quase terminando minha refeição, para minha alegria, ele apareceu meio esbaforido e eu, com minha esperteza verde e amarela, levantei correndo da mesa, fiz a genuflexão, e lasquei:
- Itadakimasu, Itadakimasu!
Ele ficou muito surpreso, sorriu aquele sorrisinho amarelo dos japoneses, colocou o seu prato na mesa e, curvando-se, respondeu, num português meio enrolado:
- Jorge Marin, Jorge Marin!

(Crônica: Jorge Marin)

Um comentário:

  1. São episódios como esse que tornam a vida mais atraente.
    Se meter em situações onde se convive e aprende com o novo, mesmo que não se veja muita utilidade nisso, e principalmente, mesmo sabendo que irá tratar por pouco tempo com uma pessoa diferente (língua, valores, tipo físico), tentar ser gentil apenas pela satisfação de tornar aquele momento mais agradável, quando racionalmente o mais óbvio e fácil seria cada um ficar no seu canto.
    Ambos estão de parabéns!
    Sylvio.

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