quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

SOBRE O ÓCIO

Arte digital por Shauna

Domingo, meio-dia, com o som do Emmerson Nogueira no MP3 player, estamos, eu e minha esposa, trabalhando febrilmente num projeto: empacotando chup chup para o filho em férias. Meus filhos mais velhos chegam e me corrigem: trabalhando? Mas você não trabalha desde que você se aposentou. Isto que você está fazendo é pura diversão. Paro o meu trabalho (porque é trabalho!) para explicar, primeiro, que aposentadoria não tem nada a ver com parar de trabalhar. Aposentadoria é um acordo pelo qual eu pago mensalmente uma determinada quantia ao estado e este, se o Fernando Henrique não estiver na presidência, me remunera também mensalmente até o fim da minha vida. Ou seja, só porque me aposentei, não significa que eu deva parar de trabalhar. Até mesmo na minha antiga empresa eu trabalhei aposentado.
A segunda observação é que trabalho não tem nada a ver com salário, ou com patrão. Fazer a sobremesa é um trabalho, levar os filhos ao shopping é um tipo de trabalho (e como dá trabalho!). Às vezes, fico impressionado com aquelas chamadas donas de casa, ou do lar: passam o dia lavando, passando, varrendo, arrumando o marido e os filhos, cozinhando, fazendo feira e, se por acaso, não têm um trabalho remunerado, as pessoas perguntam: mas você não trabalha não?
Depois que me aposentei (já avisei ao Serjão para se preparar), são muitas as pessoas que se aproximam de mim e perguntam: você aposentou mas não vai fazer nada? Como se fosse imoral não ter que produzir alguma coisa que gere lucros. O escritor italiano Domenico de Mais criou o conceito de ócio criativo, que é um conjunto de atividades que conseguem congregar descanso, lazer, trabalho e aprendizagem. Na verdade, a pessoa que vive bem, não diferencia muito entre trabalho e lazer, entre estudo e recreação, e até mesmo, segundo o referido autor, entre amor e religião. Ou seja, busco fazer o melhor. Definir se sou trabalhador ou vagabundo, é problema dos outros.
Esta confusão toda tem sua explicação na Grécia Antiga que separava o trabalho intelectual do trabalho braçal. O trabalho intelectual era próprio aos cidadãos gregos, e incluía a dedicação às artes, ao governo, às ciências e ao lazer. Este tipo de trabalho era denominado ócio porque não envolvia nenhuma atividade braçal. Esta, como negava o ócio, era chamada de negócio, e envolvia toda esta história de produção, salário e toda a ralação envolvida. Eram atividades destinadas às chamadas classes inferiores, aos não-cidadãos e aos escravos.
Conclusão: cinco pra meia-noite e eu escrevendo o blog. É trabalho? Eu mesmo não sei: às vezes é pura diversão, mas é uma alegria que vem justamente da realização deste trabalho. E, enquanto vou exercendo este ócio, vou aprendendo e me divertindo. Aqui, no cinema, num teatro, ou lendo um livro, tudo é trabalho, mas também é diversão, e aprendizagem.
Um filho de carpinteiro, que conhecia também do ofício, além de ser profeta, pescador, mestre (Jesus) e, nas horas vagas, salvador da Humanidade dizia: “Tudo o que a sua mão encontrar para fazer, faça-o com todo o seu coração.” Portanto, mãos à obra, mas com muita calma nesta hora!

(Crônica: Jorge Marin)

3 comentários:

  1. Amigo Jorge,sua cronica me faz lembrar que estou aposentado.Sim,lembrar,pois trabalho muito mais hoje do que trabalhava antes da aposentadoria.Minha mulher e minha enteada mais velha trabalham fora,e eu trabalho ¨dentro¨de casa,pois tenho o compromisso de preparar o almoço para minha enteada mais nova,que estuda, de minha mulher e da enteada mais velha,que trabalham.Além disso,escrevo para um jornal,dois sites,meu blog e ainda faço um programa de rádio.E o pior é que tivemos um presidente que chamou os aposentados de vagabundos.É mole?!...

    ResponderExcluir
  2. O trabalho que fizemos hoje, conversando bastante, foi muito produtivo e gratificante para mim. Amei revê-los... Ainda estou me alimentando do fruto da nossa conversa que deu trabalho... PELO MENOS PRO ARTHUR rsrsrsrs beijão Maíta

    ResponderExcluir
  3. Sylvio disse...
    Eu sou um adepto praticante do “atoismo” (pode se encarar de certa forma como um tipo de religião, aberta a novos adeptos). Desde que me entendo por gente tenho uma percepção íntima, constante e natural de que não gosto de trabalhar e não me orgulho ou envergonho disso. Simplesmente percebo e sinto desta forma. Para mim quem inventou o trabalho não tinha nada melhor para fazer! Tanto lugar bonito para conhecer, idéias para refletir e colocar em prática, pessoas interessantes para ter contato, atividades agradáveis como ler, escrever, desenhar ou pintar sem compromissos, paisagens maravilhosas que se oferecem gratuitamente para serem contempladas e eu tenho que gastar minha vida me enfiando em um lugar durante toda a manhã e tarde, indo correndo para minha casa à noite para aproveitar algumas poucas horas de alforria com a família e dormir cedo para estar descansado no dia seguinte para começar toda esta rotina novamente? Isso é vida de formiga ou de escravo! Respeito e incentivo as pessoas que gostam de trabalhar, pois há nitidamente aqueles que se sentem incomodados em ficar parado. Ainda bem que existem estas pessoas para produzir, mas é necessário que se consuma o que é produzido, senão todo este esforço se torna um desperdício, e é aí que eu entro, evitando a perda do tempo e esforço alheios ao consumir mais do que produzo. Acredito que ninguém deva trabalhar para me sustentar, mas quero trabalhar naquilo que gosto e quando estou com vontade, em um ritmo onde a atividade que pratico seja um prazer alcançado e não uma meta atingida (principalmente quando esta meta é estabelecida por terceiros, quartos ou quintos que não conheço e com os quais não concordo). Seguindo este raciocínio, pode-se dizer que busco o “ócio sustentável”, onde quero “trabalhar” o mínimo possível, de modo que eu não pese nas costas dos outros e não carregue o peso (expectativas) dos outros nas minhas costas. Não quero incomodar ninguém e que ninguém se incomode comigo, se acham que não sou um membro produtivo de nossa sociedade. Se existe reencarnação, eu reservei esta vida para curtir minhas férias, na próxima eu trabalho duro!

    ResponderExcluir

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL