A mãe e
a tia na sala discutem:
- Acho
que já é tempo de você começar a pensar em ter um filho. A gente precisa pensar
no futuro. Quando você for velhinha,
quem é que vai cuidar de você? Você quer
terminar sua vida velha e sozinha?
- Ah,
mas você está dizendo isso porque a Clarinha ganhou neném e veio ficar com você
aqui por uns dias. Mas, na hora em que a
criança estiver maiorzinha, ela vai rachar fora e vai deixar você aqui...
sozinha.
Preocupada
com o debate das comadres, que poderia acordar sua filhinha (sim, Cléo
acabara, finalmente, de dormir), a Clara disse:
- Vocês
ficam aí, falando e falando e falando de solidão. Mas, ou não sabem, ou
esqueceram do que é isso. Pois eu vou falar pra vocês exatamente o que é.
Solidão
é ser mãe.
Nunca,
na minha vida, me senti tão sozinha e tão desamparada, desde que esta criança
nasceu.
Fui a
todas as consultas, li todos os manuais, fiz todos os exercícios, meu marido me
acompanhou sempre que possível. Fiz
enxoval, chá de bebê, tudo.
O parto
foi tranquilo, a médica fez cesárea (porque tinha que sair de férias com os
filhos), e tudo correu bem.
MAS, na
hora em que cheguei na minha casa, e o Marcelo teve que dar um pulinho na
empresa, PIREI.
Quando
me vi só, completamente só, e com aquela criança para criar (pois ela depende
de mim pra TUDO!), a única coisa que eu fiz foi rezar e pedir a Deus, que ela
não chorasse, pois eu, simplesmente, não saberia o que fazer com ela.
Agora,
vim aqui pra casa da mãe, estou mais tranquila, mas continuo só. Minha cabeça dói, é como se eu tivesse saído
de um grande porre.
Antes,
eu era maravilhosa, linda, todos davam lugar na fila, no ônibus, no elevador e
até o Marcelo ligava do trabalho para saber o que eu queria.
Agora,
todos os olhos são para a Cléo e todas as obrigações para mim.
Eu
TENHO que ser uma mãe maravilhosa, perfeita, dar de mamar, ser tranquila, não
sentir sono, não sentir raiva, não sentir ódio, não me decepcionar.
Agora
eu tenho que ser A MÃE. Gente, é muito
peso, é muita solidão!
E Clara
chorou, a mãe suspirou, a tia virou-se para a tevê. Cléo dormia.
Conto
curto: Jorge Marin
Muito bom, Amigo Jorge!
ResponderExcluirVocê descobriu a forma de falar coisas sérias através do conto. Aqui, psicólogo, você descreve síndrome que atinge algumas mulheres no pós-parto (não sei o nome); e sem ser professoral...
Acho que deve continuar nessa linha. Depois, faz o que Drummond escreveu: guarda na gaveta, relê, corta, refaz... E quando gostar do resultado, separa para publicar seu livro. Não tenha pressa. Deixe fluir. “Um texto puxa o outro.”
Meu afetuoso abraço,
Brandão
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Obrigado, Brandão
ExcluirPara atingir o "selo de qualidade" drummondiano, eu vou ter que juntar muita gaveta e gastar muita tesoura. Mas, não importa, somos jovens...
Falou tudo! Só quem já viveu isto sabe que vc. acertou em cheio.Abraços
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