sexta-feira, 3 de março de 2017

O MELHOR CARNAVAL DA MINHA VIDA


Acho que, no último domingo, vivi um dos melhores carnavais da minha vida. Após atear fogo a uns carvões, fiquei, em silêncio, esperando o braseiro se formar, sentado numa espreguiçadeira, enquanto pássaros há muito esquecidos da minha infância invadiram, para minha surpresa, aquilo que chamam cafonamente de espaço gourmet.

São canários da terra, tico-ticos, bem-te-vis e, ao abrir a torneira para regar minhas espadas-de-são-jorge, fui surpreendido por um autêntico sabiá laranjeira cantando a plenos pulmões na desolada paisagem urbana. Como diz o samba campeão: “é água de benzer, água pra clarear, onde canta um sabiá”.

O samba é cantarolado baixinho, como a lembrar que, apesar de distante da folia, eu sou bom sujeito e não sou ruim da cabeça. O pé, herança de uma genética austríaca, ainda é meio de chumbo.

O fogo vai ardendo e é assim que deve ser. Alcanço uma caneta e, como nos tempos do Bar Xodó em São João Nepomuceno, pego um guardanapo e resolvo escrever... uma poesia? O tal samba volta à minha mente: “vai inspiração, voa em liberdade, pelas curvas da saudade”.

Mas... vão perguntar: e o Carnaval? Assim mesmo, com maiúscula. Onde estão os passistas, ritmistas, bateria e porta-bandeira? Aponto para a TV ligada (sem som) e digo: lá! E eu... aqui! Quietinho, com minha passarada. Assim como eu, parece que eles comemoram a ausência de trânsito, de barulhos e de vozerio.

Esse foi meu carnaval. Não que eu critique ou despreze aquela festa maravilhosa da qual, aliás, participei ativamente por muitos anos. Torço, sinceramente, para que cada vez mais e mais pessoas possam se reunir lá, na Bahia, no terreirão, nas praias, nos sambódromos. E que seja uma festa linda, com muito ritmo, calor e sensualidade!

Mas, principalmente, que nos deixem aqui, eu, a família e os passarinhos.

Minha esposa, que está jardinando, me traz uma flor. E o danado do samba teima em martelar na minha cabeça: “o perfume da flor é seu, um olhar marejou sou eu, quem nunca sentiu o corpo arrepiar ao ver esse rio passar”.

O fogo, finalmente, esquenta.

Crônica: Jorge Marin

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