Na verdade,
nunca fui um jogador inveterado e muito menos expert no assunto, mas era parada
obrigatória aos finais de noite, principalmente após o namoro, cinema, ou mesmo,
simplesmente, pra assinar o ponto e poder ficar em pé em um de seus portais,
vendo as meninas saírem do colégio.
Lembrei-me
agora do mestre Sôbi quando dizia achar a maior graça das vezes em que passava
em frente à sinuca e via aquele montão de rapazes em pé na porta com uma das
pernas dobradas na parede como se fossem garças.
Um local
que veio a marcar várias gerações e acumular por décadas momentos felizes e
descontraídos. Quem não se recorda do Jornal
do Brasil que ficava à nossa espera no velho banco de madeira naquele pequeno
quarto ao fundo? Bons papos aconteciam ali com o Sr. Cida, enquanto o jornal
era esmiuçado com as principais notícias do dia.
Difícil
também não se lembrar das noites de quarta e das tardes de domingo, quando aquele
velho rádio a válvula, que, num volume bastante considerável, ficava transmitindo
os jogos do campeonato carioca. Por sinal, Sr Cida, era um tricolor apaixonado.
E, já que
estamos comentando sobre o Sr Cida, um fato que sempre me chamava à atenção era
das poucas vezes que ele saía desse quartinho. Isso sempre acontecia nos
momentos de apagar o quadro negro para o recomeço de uma nova partida ou quando
uma bola, após uma desastrosa tacada, rolava pelo chão ou até mesmo em direção à
rua.
Assim,
enquanto os jogos rolavam à solta no salão principal, a maioria de nós queria mesmo
era ficar sentada em outro banco de madeira que ficava posicionado bem próximo à
mesa de bilhar. Ali, boas prosas de fim de noite rolavam, enquanto íamos nos divertindo
com cada jogada ou acirradas disputas.
Mesmo
tendo sido ali por várias décadas um salão de jogos, perpetuou um imenso
respeito, não somente pelo local, como também por seu proprietário.
Assim me
narrou o mano Darcio:
“Infelizmente, o Cida era tricolor. Contudo, somente discutia
futebol em alto nível. Não admitia gozações e nem gozava os adversários. Ele próprio fazia os
consertos de sua casa, além de cuidar da manutenção das sinucas, trocando os
panos verdes e as tabelas. Poucas pessoas seriam capazes destes serviços com
tamanha precisão, principalmente no bilhar. Trocar as tabelas colocando as
novas no ponto certo era coisa para especialistas. Suas sinucas eram
fantásticas.
Ele não admitia apostas no salão, nem bebidas. De hora em hora fazia uma
limpeza e o salão mais parecia uma sala de visitas. O BANHEIRO ERA
IMPECAVELMENTE ASSEADO. Um hábito do Cida era lavar as mãos com sabonete e depois com
álcool logo após receber dinheiro de quem encerrava o jogo.
Cida dizia que aquele casarão foi o primeiro a ser construído na
parte baixa da cidade. Antes, todas as residências ficavam no morro, na região
da Matriz, pois a baixada era pantanosa. Dizia que a casa nada mudara,
recebendo apenas alguns reparos. Sua habilidade era muito aproveitada pela
Igreja, já que era ele que preparava os pequenos altares que desfilavam nas
procissões, principalmente nas Semanas Santas. Aliás, era muito católico.
Quanto ao seu irmão, Seu Zé, era um autodidata, uma pessoa muito
culta. Tendo apenas o primário, cuidou de toda a contabilidade da Fábrica de
Calçados por anos, até sua aposentadoria. Lia muito, discutia literatura,
história e política. Conhecia bem a Língua Portuguesa e bastante Matemática,
principalmente aritmética. Tinha até um razoável conhecimento do Latim.
Além de excelentes pessoas, eram homens de coragem. Dentre meus amigos verdadeiros estavam
os irmãos Palmieri.”
Crônica: Serjão Missiaggia
Foto : Facebook
Parabéns Sérgio, voltei ao passado com suas lembranças, que verdadeiramente são as de milhares de jovens, que viveram esse tempo. Você foi feliz principalmente nos detalhes, como o do rádio. Obrigado pelas lembranças!
ResponderExcluirObrigado, José Carlos, vendo a velocidade com a qual os jovens conduzem suas vidas atualmente, cada vez mais me convenço, noves fora o saudosismo, de que fomos uma geração abençoada.
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