quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O VALOR DO SILÊNCIO 3 (FINAL)



NA SEMANA PASSADA, estávamos refletindo sobre o silêncio e, quando falei que o silêncio é a música, muita gente quebrou o silêncio para argumentar que o silêncio não é a música, mas só uma pausa entre os sons.
No entanto, se fui muito abrangente, é preciso reconhecer que o silêncio é um elemento orgânico, real, na música.  E isso é fácil de ser entendido porque, em primeiro lugar, só há som se existe alguém para ouvi-lo.  E, se existe alguém, uma plateia, é IMPOSSÍVEL que não haja algum tipo de ruído, nem que seja a soma das respirações e de corações batendo.
Em segundo lugar, é preciso ficar claro que, na música, o silêncio NÃO interrompe a música, mas cria possibilidades: se, no Barroco, evocava tensão, na música romântica contemporânea pode ser enlevo.  Imaginem quando o compositor John Cage, um estudioso do silêncio no som, apresentou sua peça “4 minutos e 33 segundos”, na qual ele permanece esse tempo em frente a uma partitura em branco e, naturalmente, não produz NENHUM som ao piano?  A plateia mergulhou numa confusão de emoções e angústias que beirava o pânico.
Se na música já causa desconforto, na fala o silêncio é fundamental.  Pois aí, segundo o psicanalista Jacques Lacan, “o silêncio toma todo o seu valor de silêncio, não é simplesmente negativo, mas vale como além da palavra”.
O grande achado de Freud, na Psicanálise, foi justamente o não dito, o interdito, que ele chamou de Inconsciente.  O curioso é que este grande pensador e teórico NÃO fundou a Psicanálise a partir do silêncio de um paciente, mas sim através do SEU PRÓPRIO SILÊNCIO!  Ao tratar de uma manifestação histérica, a paciente Elisabeth Von R. virou-se para o famoso neurologista e disparou:
- Cala a boca, Dr. Freud, que eu quero falar!
De uma forma ou de outra, o silêncio vem sendo representado como sinônimo de sabedoria e até mesmo proximidade com Deus.  Não por acaso, grandes avatares das religiões permaneceram por longos períodos em silêncio absoluto, após o qual geralmente eram agraciados com algum tipo de recompensa pelos anjos em pessoa: assim foi com Moisés, Oseias, Elias, o profeta Muhammad, Buda e Jesus Cristo.
Assim, se na psicanálise o silêncio provoca a escuta analítica e pode revelar aquilo que se esconde por trás da falácia do ego, na religião pode também representar a fusão com a divindade, ou como diz a monja Maria-Amada de Jesus: “eu sou semelhante a um pequeno grão de área, que espera na praia a onda que o fará mergulhar no oceano.”
De minha parte, não tenho a pretensão de grandes voos transcendentes nem de abissais mergulhos psicanalíticos.  O que eu quero é propor um pacto, com todos que não têm nenhum tipo de laço ou gozo com a doença humana: vamos, PELO MENOS, parar de falar besteira e, principalmente, interromper qualquer tipo de ruído desnecessário!
(...) um parágrafo de silêncio

Crônica: Jorge Marin
Foto: Tunc Suerdas, disponível em http://browse.deviantart.com/photography/?q=silence+god#/drqw1h

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