NA SEMANA PASSADA, estávamos
refletindo sobre o silêncio e, quando falei que o silêncio é a música, muita
gente quebrou o silêncio para argumentar que o silêncio não é a música, mas só
uma pausa entre os sons.
No entanto, se fui muito abrangente, é
preciso reconhecer que o silêncio é um elemento orgânico, real, na música. E isso é fácil de ser entendido porque, em
primeiro lugar, só há som se existe alguém para ouvi-lo. E, se existe alguém, uma plateia, é
IMPOSSÍVEL que não haja algum tipo de ruído, nem que seja a soma das
respirações e de corações batendo.
Em segundo lugar, é preciso ficar claro
que, na música, o silêncio NÃO interrompe a música, mas cria possibilidades:
se, no Barroco, evocava tensão, na música romântica contemporânea pode ser
enlevo. Imaginem quando o compositor John
Cage, um estudioso do silêncio no som, apresentou sua peça “4 minutos e 33
segundos”, na qual ele permanece esse tempo em frente a uma partitura em branco
e, naturalmente, não produz NENHUM som ao piano? A plateia mergulhou numa confusão de emoções
e angústias que beirava o pânico.
Se na música já causa desconforto, na
fala o silêncio é fundamental. Pois aí,
segundo o psicanalista Jacques Lacan, “o silêncio toma todo o seu valor de
silêncio, não é simplesmente negativo, mas vale como além da palavra”.
O grande achado de Freud, na
Psicanálise, foi justamente o não dito, o interdito, que ele chamou de
Inconsciente. O curioso é que este
grande pensador e teórico NÃO fundou a Psicanálise a partir do silêncio de um
paciente, mas sim através do SEU PRÓPRIO SILÊNCIO! Ao tratar de uma manifestação histérica, a
paciente Elisabeth Von R. virou-se para o famoso neurologista e disparou:
- Cala a boca, Dr. Freud, que eu quero
falar!
De uma forma ou de outra, o silêncio
vem sendo representado como sinônimo de sabedoria e até mesmo proximidade com
Deus. Não por acaso, grandes avatares
das religiões permaneceram por longos períodos em silêncio absoluto, após o
qual geralmente eram agraciados com algum tipo de recompensa pelos anjos em
pessoa: assim foi com Moisés, Oseias, Elias, o profeta Muhammad, Buda e Jesus
Cristo.
Assim, se na psicanálise o silêncio
provoca a escuta analítica e pode revelar aquilo que se esconde por trás da
falácia do ego, na religião pode também representar a fusão com a divindade, ou
como diz a monja Maria-Amada de Jesus: “eu sou semelhante a um pequeno grão de área,
que espera na praia a onda que o fará mergulhar no oceano.”
De minha parte, não tenho a pretensão
de grandes voos transcendentes nem de abissais mergulhos psicanalíticos. O que eu quero é propor um pacto, com todos
que não têm nenhum tipo de laço ou gozo com a doença humana: vamos, PELO MENOS,
parar de falar besteira e, principalmente, interromper qualquer tipo de ruído
desnecessário!
(...) um parágrafo de silêncio
Crônica: Jorge Marin
Foto: Tunc Suerdas, disponível em http://browse.deviantart.com/photography/?q=silence+god#/drqw1h
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