sexta-feira, 29 de setembro de 2017

CURANDO O GAY


Chego cedo ao consultório, mas o paciente já está na porta, me esperando. Calculo que chegou, pelo menos, meia-hora adiantado.

Digo “bom dia” e o deixo na sala de espera, enquanto entro para o início dos trabalhos. De mais a mais, ainda faltam dez para as sete, horário em que começo os atendimentos de sexta.

Quando abro a porta, ele parece extenuado. Nervoso, até um pouco ofegante, encaminha-se rapidamente para a minha cadeira, e eu explico onde ele deve se sentar. A pergunta é direta e objetiva:
- O senhor cura gay?

Da forma que veio a pergunta, a resposta também volta. Veloz:
- Qual é a sua doença?
Ele fica um tanto enrolado para responder, mas diz:
- Eu acho que eu sou... sabe, gay.
- Você acha? – aperto.

O que se segue é uma confissão. Uma confissão de vida, mas dita num tom de confissão de confessionário religioso. Ele diz que é de uma cidade do interior e que, desde pequeno, gostou mais de brincadeiras de meninas do que de meninos. Penso comigo: eu também adorava bonecas, mas não posso dizer. E ele conta sobre um primo com quem brincava muito, até que, num certo dia, acabaram se pegando, não no sentido de briga, mas no sentido amoroso, “o senhor sabe como é, né?”
- Como é? – pergunto.

Não vou dar mais detalhes, mas fiquei ali, ouvindo aquele moço falar. É um rapaz bonito, educado, trabalhador, bom aluno. Na faixa dos dezessete anos. Com tudo para viver uma vida plena e saudável. Mas, enfim, tem essa doença: incapacidade de ser feliz sem que lhe aprovem a forma pela qual tem prazer.

No final da sessão, está mais relaxado, sorri. Digo que, na semana que vem, continuamos. “Tchau, Oscar!” – ele diz. E sai. Fico pensando: quem será esse Oscar?

Crônica: Jorge Marin

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