sexta-feira, 1 de abril de 2011

GUARDIÕES DO LARGO DA MATRIZ

Arte digital por Szandor DuBois

Já há algum tempo, minha atenção vem sendo despertada por uma visão que, no mínimo, acho demasiadamente interessante. Coisas do interior. Algo assim, como: romântico, contemporâneo, mineirês, sublime e, principalmente, raro.
Não há uma única vez que, ao subirmos o morro da igreja em horários de missa, não nos deixamos envolver com certa imagem.
Três idosos e um cachorro.
Na varanda de uma pequena casa, ficam a observar todos que ali passam.
Mais precisamente: duas senhoras, um senhor e um cachorrinho (aparentemente um daqueles dóceis vira-latas).
Faça chuva ou faça sol, lá estão eles, em seus postos de observação.
Ficam numa casinha que, se não me falha a memória, de numero 70 bem à direita de quem sobe mais precisamente ali, na Rua Coronel Furtado de Medeiros, já bem próxima ao jardim da igreja.
Três irmãos solteirões. Duas senhoras e um senhor.
Sempre nas mesmas posições, como em um balé inconscientemente bem ensaiado.
O senhor, de nome Josué, é um conhecido meu. As duas senhoras e o cachorro ainda não tive o prazer de conhecer.
Segue, então, a escalação com respectivas posições: no parapeito da referida varanda, começando pela lateral direita, se posiciona sempre o senhor Josué. Logo a seguir, pela lateral esquerda, uma de suas irmãs. O centro é lugar cativo da outra irmã. O cachorro fica com a irmã que se posiciona à esquerda, mas, não raramente, poderemos vê-lo também à direita, com o senhor Josué.
Cada um com suas respectivas almofadinhas, na qual apoiam os braços no parapeito da varanda.
Assim, daquela rústica moradia, ficam a certa distância, a observar todos que por ali passam.
A cada celebração dominical, casamentos, batizados e outras festividades, lá estão perfilados e posicionados, aguardando, talvez, aquela que seja, para eles, a maior de todas as distrações.
Começam a nos acompanhar, possivelmente, desde onde suas cansadas visões nos alcançam, até quase entrarmos na igreja.
De minha parte, como não poderia deixar de ser, me interessei, sensivelmente, com aquela cena. Comecei a analisar, carinhosamente, cada passo e costumes, desta já quase que extinta família.
De imediato, devido aos meus atrasos dominicais (diga-se de passagem, um tanto costumeiros), pude, de certa forma, fazer minhas primeiras observações.
De imediato, reparei que seguem, rigorosamente, horários pré-estabelecidos.
Numa precisão britânica, ficam num incansável entra e sai, que vai se repetindo a cada movimento dos transeuntes no subir e descer de morro. Quem quiser vê-los, favor ser pontual, pois, do contrário, lá não mais estarão.
Fico também imaginando a rotina desta interessante família: ao badalar do sino, todos se apresentam, mais que depressa, na varanda. Quem sabe, até já não exista uma antecipada escala de observação? Poderá ser por ordem alfabética, ou mesmo de posicionamento no parapeito.
Previamente, deverá haver também uma votação para saber quem ficará, naquele dia, segurando o Bolinha. Só pode ser Bolinha. Não imagino outro nome que possa ter aquele cãozinho branco! Quem sabe... Totó? Talvez!
Não posso deixar de acreditar, também, que uma previsão antecipada, não rola nos bastidores!!! Como, por exemplo, quantos automóveis deverão subir naquela noite? E muitos outros itens inimagináveis.
(continua)

(Crônica: Serjão Missiaggia)

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