quarta-feira, 13 de abril de 2011

AMOR NOS TEMPOS DE WEB

Arte digital por Julia Dresch

Vivíamos como se fosse só hoje e amávamos como se não houvesse amanhã. Havia uma confusão muito grande sobre a lei de Deus e a lei dos homens. No nosso tempo, a lei dos homens era implacável, mais até do que a lei de Deus vigente na época. Tentávamos, a todo custo, nos destacar: posávamos de roqueiros, pintores, atores, jornalistas e conspiradores. Era difícil imaginar onde começava a fantasia ou onde terminava a realidade, já que estávamos, quase sempre, viajando. Na maioria das vezes, não era uma viagem alucinógena, mas sim alucinada. Mais do que um voo, era um mergulho. Na vida, de cabeça. E tudo aquilo parecia não ter fim: como num carnaval perene, agendávamos intermináveis programas e invadíamos as praças, os bares e alguns jardins. Não havia chuva que nos detivesse: pelo contrário, animados pela tempestade, namorávamos sob as marquises, jogávamos futebol na lama e balançávamos os galhos das árvores para molhar os que passavam.
Às vezes, perguntamos: era melhor? Absolutamente, não. Era diferente. Moldados que éramos, por uma cultura menos competitiva, menos narcísica e mais autoritária, acostumamo-nos a respeitar, interagir e obedecer às regras. Mas, da mesma forma que os jovens dos dias atuais, adotávamos posturas desafiadoras, linguagem obscena e atitudes subversivas. Nossos pais diziam: não sei onde essa juventude vai parar.
Aí fundamos isto que está aí: a mesma sociedade dos nossos pais, um pouco menos hipócrita e mais cínica, mais liberal e mais egoísta, mais sofisticada e menos acessível, e, definitivamente, menos poética, embora eu não possa dizer, ao certo, se esta última característica é boa ou ruim.
Quando expresso esta desconfiança em relação à poesia, é porque esta me remete a uma instituição muito em moda, naqueles tempos, chamada amor romântico, hoje ausente até da novela das seis. Amávamos e, às vezes, a pessoa amada nem sabia. Era uma proposta assim meio utópica, de aliar emoções com sentimentos, tesão com carinho, possessividade com preocupação, ciúme com cuidado, e rivalidade com devoção. Na verdade, o amor romântico foi inventado, assim como a roda, ou o espartilho, pela sociedade interessada em reprimir a sexualidade e exaltar a família nuclear e conjugal.
Engraçado é que a gente fala assim, num jargão sociológico, e a coisa parece meio árida, mas, como diz o mineirinho, o trem era bão mesmo, sô! Segundo o psicanalista Jurandir Freire Costa, “o amor era um ideal de auto-realização afetiva que acenava para um tipo de felicidade no qual o êxtase da dissolução no outro era compatível com a consciência da individualização do desejo.” Logicamente, a coisa não funcionava na prática. Mas, era (e ainda é hoje) interessante esta tentativa de tentar viver um sonho, a despeito de todas as dificuldades que a realidade moderna impõe.
Pois foi justamente este componente de sonho, este romantismo, o que foi deletado na teia de relações amorosas dos nossos dias. Isto é, não completamente deletado, pois, dentro das redes sociais (Orkut, Facebook e outros), o que mais se lê, são juras e juras de amor. Só que, com a intensa e veloz rotatividade dos casais, este conteúdo acaba esvaziado e sem sentido.
Vejam! Não estou dizendo que tudo isto é ruim ou pior. São novos tempos, novas tribos, novos sujeitos e, portanto, novas emoções. Há uma tendência em classificar o amor apenas como uma emoção, ou seja, intenso e provisório. A maioria das pessoas tem medo de tentar viver a felicidade emocional, buscando realizar o ideal impossível prometido pelo amor romântico.
Como dizia o John Lennon, “você pode dizer que eu sou um sonhador, mas eu não sou o único.” Mas, ao contrário dele, eu não espero nada de ninguém. Por isso, vivo.

(Crônica: Jorge Marin)

Um comentário:

  1. Muita velocidade, desviando dos obstáculos e limites, pode causar a perda da direção no automóvel e no amor?
    Depende do condutor!
    Eu, velho que sou, prefiro ir mais devagar e apreciar o caminho.
    Sylvio.

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