Pela
manhã, me incomoda barbear em frente ao espelho. Talvez reflexo de outros
tempos, em que, na sexta-feira da paixão, não nos era permitido nem barbear nem
olhar no espelho.
Me
assusta que, passados meros cinquenta anos, o mundo tenha mudado tanto. Na
sexta-feira da paixão de 1968, como já disse, os homens estavam todos barbudos,
já que a maioria passava a quaresma inteira sem barbear. Já na segunda-feira,
todos os espelhos das casas eram cobertos com um pano roxo, assim como todas as
imagens de santos que, garanto a vocês, eram muitas.
Ah, e não
se podia varrer o chão também. Além de que os banhos eram mais rápidos naqueles
tempos, e fazia-se um voto de falar o
mínimo possível em casa. Esses rituais eram adotados por todos sem pensar, de
forma absolutamente natural e automática.
Vocês
pensam que, nos anos 60s e mesmo 70s, alguém entrava num bar na semana santa e
pedia uma cerveja, ou mesmo um filé a partir de quinta-feira?
Sei que
muita gente vai dizer que isso era maravilhoso, que antigamente as pessoas eram
mais respeitadoras, mais tementes a Deus e melhores. No entanto, isso não é
verdade: éramos os mesmos mentirosos, egoístas, narcisistas e canalhas como nos
dias atuais.
A diferença
é que havia um plano divino e que nós seguíamos esse plano. Não se questionava
aquela lógica: Deus mandava, pai mandava, patrão mandava, e nós obedecíamos.
Hoje,
quando chega a semana santa, a ansiedade é grande: o que fazer? Churrasco?
Viagem para a praia? Passeio às cidades históricas? E, no íntimo, mais
permitidas aquelas questões que escondíamos: fazer ou não fazer jejum? Comer ou
não comer carne?
O Cristo,
objeto maior da celebração do dia santo, é representado, chorado e louvado. Mas
também esquecido, ignorado e até criticado.
Somos
pessoas que se deixam levar. Pelo rebanho ou pelo egoísmo. Pelo proselitismo,
pela fé, pela angústia ou por nada disso.
Mais velhos
a cada sexta-feira santa que passa, não estamos piores nem melhores. Mas que
essa ideia de renascimento é muito boa, disso não tenho dúvida alguma.
Feliz páscoa
a todos!
Crônica:
Jorge Marin
Foto : Serjão Missiaggia
Oportuna postagem. Detonação total, onde carros propagandas, anunciando em plena semana santa festas que acontecerão ainda no meio do ano. Teve um automotivo que em função da procissão, parou em uma dessas esquinas e deixou o som na maior altura vindo a despertar e assustar a todos. Infelizmente, o mundo não pode parar um só minuto, nem mesmos para breves momentos de reflexão.
ResponderExcluirObrigado por comentar. É importante destacar que esse dono de carro de som que, segundo seu relato, "deixou o som na maior altura", não desrespeitou apenas a procissão, mas, ainda que esta não estivesse acontecendo, esse meliante desrespeitou a comunidade, perturbou o sossego, infringiu uma norma de trânsito e do código municipal de posturas urbanas.
ExcluirCom certeza amigo lembro bem disto.Só que minha geração não respeitava muito.Bar do Cebolinha quando passava a procissão descia as portas, mas a turma continuava continuava lá dentro tomando uma cerva gelada.Foi mais ao menos nesta época que tudo transformou. Não era atrevimento e sim respeito.FELIZ PÁSCOA A TODA FAMÍLIA QUE AINDA É MIMHA.
ResponderExcluirIh, mas você é novin, Zé Heleno. O Bar do Cebolinha surgiu bem depois da época descrita na postagem. Na época, talvez você estivesse no catecismo. Abração.
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