O que é
que eu tenho que fazer para ser aceito? Melhor dizendo, o que é que eu tenho
que fazer para agradar às pessoas que me cercam?
Quando
era menino, em São João Nepomuceno, a resposta era simples: obedecer. Meninos
obedientes tinham uma aceitação fantástica. Eram citados, com orgulho, pelos
pais, elogiados pelos sacerdotes (suprema glória!), invejados pelas mães dos
vizinhos (“olha que lindo que o Jorginho é”) e paparicados pelas professoras.
De volta
ao século XXI, vejo-me num dilema: colegas aposentados aqui do bairro dizem que
sou um comunista teimoso, e não consigo agradá-los. Artistas e ex-colegas da
boemia juiz-forana dizem que sou um careta alienado, e não consigo agradá-los.
O fato é
que, com o passar do tempo, fui perdendo aquela habilidade, tão útil e tão
desejada nos dias atuais, de obedecer aos mais velhos, que hoje, como também
sou velho, chamo de poderosos.
Dessa
forma, abdiquei do meu desejo de ser bom e de também agradar os outros. Não
saio por aí, a la Cazuza, disparando contra o sol a minha metralhadora cheia de
mágoas. Mas também quebrei, há muito, os meus sapatinhos de cristal de Dorothy.
Nem Sade nem São Vicente. Nem Demônio nem Jesus Cristo. Nem Metralha nem
Pateta.
Por isso,
tenho encontrado algumas dificuldades, pois, quando tento argumentar alguma
coisa sobre o tempo, ou a paisagem urbana, ou sobre som automotivo, logo me perguntam:
você é o quê?
- Gente! –
respondo, mas, confesso, um pouco ressabiado, porque nas discussões modernas,
eu, que sou um produto do século XX, me sinto totalmente deslocado. Isso
porque, nas querelas (viram o termo?), nas divergências “mudernas”, as pessoas
NÃO ESCUTAM.
Mas,
então como se dá o debate? Não há debate. As pessoas buscam detectar, o mais
rápido possível, um rótulo pra te colocar: homofóbico, ateu, comunista,
maconheiro, governista, fanático. Não vou dizer nem o nome de um partido, pois,
se o fizer, é apedrejamento na certa.
Dias sim
dias não, lá vou eu, sobrevivendo sem um arranhão. Da incivilidade de quem não
me escuta. E devoto de São Raul.
Crônica:
Jorge Marin
Foto : disponível em http://utilbrasil.tumblr.com/post/35285909801/metamorfose-ambulante-foto
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