Recebo um
convite para participar de um seminário num hotel de Juiz de Fora, onde
poderei, através de técnicas adequadas, desenvolver a minha autoestima. O evento,
pelo que se descreve, vai juntar alguns dos papas da ativação neuronal
ensinando a ativar o cérebro para, entre outras coisas, a pessoa gostar mais de
si.
A verdade
é que eu já gosto de mim, apesar de algumas escolhas malfeitas na juventude,
como, por exemplo, não ter me tornado rico. Além disso, naquele tempo, quando
eu era adolescente lá em São João Nepomuceno, essa coisa de se destacar sobre
os outros era chamada de vaidade, e era pecado mortal.
Diziam que
Lúcifer, um dos anjos mais resplandecentes das hordas celestes (ele era o “portador
da luz”, daí o nome), caiu em desgraça a partir do momento em que,
contemplando-se no espelho, se achou tão belo quanto Deus e usou o pronome “eu”.
O
espelho, como se sabe, e a madrasta da Branca de Neve não me deixa mentir, é
aquela ferramenta que, sempre, nos diz que somos os mais belos, embora um
detalhe muito importante deva ser adicionado: mais belos do que uma pessoa que
me é próxima.
E é aí
que o bicho pega, pois somos capazes de aceitar a beleza ou o sucesso de uma
pessoa na Dinamarca, mas a compra de um carro novo pelo cunhado nos incomoda
profundamente. Por isso, temos a compulsão de tentar provar para nós mesmos, e
para o mundo se possível, que estamos superbem, superfelizes e realizados. Ou,
conforme o tal curso, com a autoestima lá em cima!
Mas,
afinal de contas, qual o propósito disso tudo? Ao nos compararmos com os
outros, é inevitável que encontremos pessoas melhores do que nós em
determinados aspectos, ou em muitos aspectos, assim como pessoas que julgamos
menos brilhantes do que nós.
Será que
esse fato faz com que os outros sejam o nosso inferno como queria Sartre? Ou
será essa diversidade um motivo a mais para viver plenamente a vida. Pois não
se trata de “aceitar” ou “suportar” pessoas mais ou menos brilhantes. A questão
até de sobrevivência é saber que nossa existência na terra depende da presença
de sujeitos totalmente diferentes de nós.
Então,
não é o caso de, por exemplo, aceitar gays, tolerar fanáticos religiosos,
deixar de criticar pessoas que não gostam de trabalhar e ser bom com os pobres.
A vida é uma negociação dura e constante. Melhorar a autoestima, num momento em
que todos estão em crise, só vai te transformar num maníaco bobão. Sentir-se
triste e abatido, num momento de dor, é um direito seu.
Crônica:
Jorge Marin
Foto : frame do filme Luzes da Ribalta
Essa coisa de não poder se sentir triste ou de receber um pedido de receita porque se está, " deprimido", pelo menos é o que muitos pacientes dizem sem saber muito bem o quadro clínico de uma depressão é de uma desumanidade gigante. Desde o dia 28 de agosto aconteceram fatos, mais precisamente 3 que me deixaram profundamente triste. Curti minha tristeza, esgotei o choro e hoje estou me sentindo muito bem. Tristeza é pra ser sentida sim. Grande abraço, meninos!
ResponderExcluirObrigado! Esse depoimento reforça nosso ponto de vista de que temos, sim, o direito de sentir as nossas dores, porque, da mesma forma que o prazer, dor é normal. O limite da patologia é quando a dor supera a sua função fisiológica, e "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é", como ensina Caetano Veloso.
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