Me lembro
que, outro dia mesmo, vínhamos saindo do portão da Casa Leite, depois da escola,
quando um coleguinha esbaforido veio trazer a novidade:
- Gente,
gente! As mulheres agora não vão mais usar sutiã. Minha tia falou que elas
estão queimando todos eles lá nos Estados Unidos.
Meninos
entre dez e treze anos, cada um de nós teve uma reação. O primeiro perguntou:
- E daí?
Eu não uso essa porcaria – enquanto o Zé Carlos, um repetente grandão que vivia
aprendendo coisas com a gente, disse:
- O que
que é sutiã?
Eu e o
Afonso, que acabara de trazer a notícia, começamos a fazer nossas considerações
sobre a novidade, quando o quinto participante do grupo, o Robertinho, que era
tido como namorador, chegou à conclusão que todos queríamos:
- Puxa
vida, no mês que vem, quando sairmos de férias, vou pedir ao meu pai pra levar
a gente na praia! – todos aplaudimos e, a partir daquele dia, nosso assunto
preferido passou a ser a praia. As meninas descobriram nossa questão social e,
como sempre irritantes, disseram que éramos uns estúpidos e que aquele movimento
era o FEMINISMO, feito, justamente, para elas não terem que aturar os
ignorantes, ou seja, os meninos.
O fato é
que, quase cinquenta anos depois, um passeio pelas ruas das cidades causaria
arrepios, tanto nas inteligentes meninas quanto nos estúpidos e ignorantes nós.
Idealizado como um movimento contra a dominação de um gênero sobre o outro (na
época, costumávamos ter apenas dois), o feminismo foi confundido, ou mal interpretado,
como uma guerra de poder, na qual o gênero vencedor passaria a dominar o outro.
É lógico
que estou generalizando, mas o que percebo hoje é uma “machização” da
sociedade: as mulheres não apenas ocuparam a maioria dos espaços antes
dominados pelos homens, como passaram a adotar, infelizmente, os piores tipos
de comportamento que os homens expressam: grosseiras, barulhentas, bêbadas,
muitas se vangloriam no Facebook, entre palavrões, que cobriram a desafeta “de
porrada”, enquanto, no trabalho, mandaram aquela chefa ridícula ir tomar...
A coisa
assume um contorno tão concreto, que o que era para ser uma discussão justa
transforma-se em atos no mínimo controversos: uma ex-atriz pornô, filha da
cantora conhecida em nosso tempo como a Rainha do Bumbum, não satisfeita em
assumir a sua homossexualidade (também justa e saudável), resolve remover
cirurgicamente os seios para, segundo ela, correr livre e sem sutiã pela praia.
Ou seja,
o tal do feminismo acabou se transformando num pesadelo machista para as
mulheres, que agora têm de tirar, literalmente, os peitos fora. O pior foi para
nós, meninos da década de 70, que continuamos trocando lâmpadas e abrindo vidros
de palmito, e já estamos morrendo de medo de ir na tal praia!
Crônica:
Jorge Marin
Foto : disponível em http://archive.freep.com/article/20140501/NEWS05/305010090/Rosie-the-Riveter-s-Willow-Run-Bomber-Plant-saved-from-wrecking-ball
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