quarta-feira, 16 de julho de 2014

ALEGORIAS E ENDEREÇOS - Capítulo 1


Abram alas, pois lá vem mais um daqueles caminhões de mudanças desfilando discretamente pela cidade! Sem chamar a mínima atenção, pra não dizer o contrário, segue passando com tudo aquilo e tudo mais a que tem direito.
     
Nesse momento tão solene e único, procuro na oportunidade achar um adjetivo que venha caracterizar tão nobre momento, pois, na realidade, não sei definitivamente defini-lo.

Pessoalmente misturo uma forte curtição ao inusitado com uma grande conotação de solidariedade na qual podemos sorrir ou mesmo chorar, e, se o caminhão for de carroceria aberta, o bom mesmo é ficar num canto da calçada vendo o bonde passar.
    
Mas, antes de continuar com esta inocente croniqueta, gostaria de explicar o motivo de tê-la escrito.

Na verdade, tudo começou na adolescência, quando num daqueles descompromissados bate-papos das esquinas, um velho amigo meu veio a confessar que seria a maior desgraça de sua vida se um dia tivesse que fazer uma mudança e ter que sair a rua na CARROCERIA ABERTA de um caminhão. Fico apavorado só de imaginar!  Prefiro a morte, que a isto sujeitar! – disse ele.
  
Este meu amigo era uma daquelas pessoas que ficava em pânico quando tivesse que se expor de alguma forma, principalmente em situações que, para alguns, se tornaria cômica. Aí vocês já imaginam! Por sinal, essas pessoas possuem em comum a interessante característica de serem superdivertidas, ainda mais no que diz respeito ao próximo. E este meu amigo, por ser um expert no assunto, não poderia mesmo fugir à regra!
 
E desta forma acontecia, ou seja, a cada caminhão de mudança que passasse, lá estava ele, com todo seu sádico humor. Analisava-os minuciosamente e, após estudar com bastante critérios todos os seus detalhes, eram distribuídas notas, que variavam de um a dez. Algo assim como GRAU DE DIFICULDADE, SIMPATIA E ESPORTIVA DOS ENVOLVIDOS, SITUAÇÃO DO TRANSPORTE (neste caso, quanto pior, maior a nota), DISTRIBUIÇÃO VISUAL DA MUDANÇA NA CARROCERIA, GRAU DE ATENÇÃO QUE DESPERTASSE AOS PEDESTRES, FISIONOMIA DO RESPONSAVEL (algo então parecido com um penico, era um DEIZÃO na hora!).

Foi uma época realmente muito divertida e, mesmo depois que o tempo nos distanciou, ainda levaríamos conosco, lembranças de um passado feliz.

Até que um belo dia, o impossível e inacreditável aconteceu. Era uma tarde chuvosa em que eu estava na janela, e, no inicio da rua, um velho caminhão de mudanças começou a passar. Quanta emoção! Principalmente quando, quase em frente à minha varanda, estoura um de seus pneus. Sei que muitos não acreditarão, mas... Quem estava na carroceria, sufocado no meio de uma parafernália de coisas, sentado num botijão de gás, entre a geladeira e o fogão? Ele mesmo! Simplesmente, meu velho amigo das esquinas.

(continua)

Crônica: Serjão Missiaggia (junho/1998).
Foto: disponível em http://imoveis.culturamix.com/dicas/conheca-melhor-os-tipos-de-transporte-para-mudancas .

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