Tomando
café com a mulher, ela pergunta:
- Então
quer dizer que o verão acabou?
- Ontem
já era outono – respondo. Quando eu estudava no “Judith Mendonça”, o verão
começava no dia 21. Mas agora, parece que mudaram tudo, sei lá...
Minha
mulher pousa a xícara no pires e me desafia:
-
Então, onde é que estão as águas de março?
Olho pela
janela, venta, um sol maravilhoso desafia os discursos, os preceitos, os
tratados e até mesmo a música de Tom Jobim.
De repente, éramos crianças e, ali em frente ao antigo Tiro de Guerra,
era 1964 e o governador de Minas vinha em comitiva trazendo boas novas.
Católicos,
fazíamos uma fila imensa, que ia até a esquina da Rua do Descoberto e
aplaudíamos. Militares passavam com suas
fardas de honra, luvas brancas e coturnos (já ia escrevendo soturnos) bem
engraxados.
Meio
libertário, já um tanto rebelde, mesmo me arriscando a perder a nota de
Comportamento e encarar a fúria da Dona Renée, fiz a minha primeira rebelião e,
num gesto impensado, saí da fila e, com meu amigo Helinho, atravessamos no meio
dos atiradores em parada e ficamos sozinhos do outro lado, o lado proibido.
Não
havia tempo para nos resgatarem, o Governador vinha passando, sorrindo e
acenando para todos. As escolas com suas professoras e alunos ficaram todos do
lado direito, na subidinha do Ginásio.
Eu e o Hélio, vejam só, resolvemos ir para a esquerda.
Como estava
descendo para a Prefeitura, também do lado esquerdo, o Governador nos viu ali,
sozinhos, passou pelo meu amigo, me cumprimentou e, olhando nos meus olhos,
perguntou:
- Tudo
bem, menino? – e me abraçou. Se eu fosse algum tipo de profeta, ou menos
ingênuo, poderia ter dito:
- Não,
não está. Eu não quero que nada disso
aconteça.
Mas,
como já falei, eram outros tempos. Me lembro que voltei todo feliz pra casa,
coloquei a minha roupinha de PM, e saí cantando pelo terreiro:
-
Marcha, soldado, cabeça de papel...
Crônica:
Jorge Marin
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