quarta-feira, 24 de abril de 2013

NÓS E O SUBVERSIVO...



Meninos, íamos ao Campo de Aviação, e aquilo lá nos encantava de uma maneira que não sabemos bem explicar.  Corríamos, soltávamos papagaio e, mais do que tudo, adorávamos ver o avião.  Havia um no hangar, mas poucos de nós já o havíamos visto voar.

Quando exagerávamos nas brincadeiras, ou mesmo quando entrávamos em algum recinto proibido, havia um tomador de conta que vinha e dava um “puxão de orelhas”.  Não literal, mas uma chamada de atenção, como era comum na época, já que tínhamos o costume de respeitar os mais velhos.

Era o Valdo!  Uma pessoa um tanto sombria, com um imenso bigode e que não parecia assim muito inteligente.  Aliás, parecia ter a mesma idade que nós.  Mas, de qualquer forma, ele era autoridade naquele local.  E a gente não abusava.

Um dia, quando estava indo para o grupo, vi o Valdo passando na caminhonete da polícia, sentado.  Estava com a cabeça baixa, as mãos amarradas e com um soldado junto, com um fuzil na mão.  Meu Deus!  Como é que pode?  O Valdo, lá do Campo de Aviação, foi preso...

Lá na escola, foi aquele alvoroço, todo mundo querendo saber o que havia ocorrido.  Mas, sabem como é, era tempo de silêncio, e ninguém queria comentar esses assuntos.  Diziam que o Valdo era subversivo.

- O que que é subversivo, mãe?  É quem é contra os militares, meu filho.  Mas não fica falando essas coisas por aí, não.  E o pior é que não podíamos nem ir brincar mais no Campo de Aviação, pois aquele avião tinha queimado e diziam que era o nosso conhecido que o queimou de propósito.  Eu sabia que era tudo mentira, pois ninguém gostava mais daquele avião do que o Valdo.  Mas...

O tempo passou, o Valdo sumiu.  No ano seguinte, já estávamos no terceiro ano, quando resolvemos, um dia, dar um pulo lá...  Pois é, no Campo de Aviação; só que, ao invés de ir pela Santa Rita, como sempre fazíamos, iríamos por baixo, pela estrada (na época, não tinha nem o trevo ainda).

E assim fizemos...  Só que, sem saber, protagonizaríamos um dos casos mais extraordinários das nossas vidas.  Eis que, chegando ali pra cima da fazenda do sêo Gabi,  vimos um homem descendo a estrada a pé, cambaleando.  Pensando se tratar de um bêbado fomos lá ver quem era.  Mas, não era um bêbado e sim... o Valdo.

Barbudo, maltrapilho, ficamos depois sabendo que um advogado lhe dera um atestado de insanidade e que o haviam internado em Barbacena, mas ele, inconformado, e sem entender bem toda aquela parafernália, fugira e viera, A PÉ, de volta para São João.  Um colega correu e pegou um pouco de água da mina pra ele.  Ainda meio tonto, bem abatido, ele parece nos ter reconhecido e, como num pedido de desculpas, ficava falando: foi um acidente, foi um acidente!

Era o ano de 1965 ou 1966. Começou a cair uma chuvinha fina, e voltamos para a cidade com o nosso velho amigo.

Crônica: Jorge Marin

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