sexta-feira, 2 de abril de 2010

ORIGENS



O BARRACÃO DO SR. ANGINHO - Capítulo 3

(Artigo - Serjão Missiaggia)

Foi neste barracão que, certa vez, tivemos a louca ideia de adaptar uma corneta de caminhão na bicicleta do Silveleno (se bem que ainda acho que aquilo tava mais pra buzina de locomotiva!). Era tão possante que, para ativar aquela coisa, tivemos que improvisar um baita tanque de ar comprimido. Até aí nada de mais, até que chegou o momento de prendê-lo na bicicleta. Tentamos de todas as maneiras encontrar uma forma de instalar aquele monstro na garupa mas, devido ao seu tamanho, não tinha como fixá-lo. Foi aí que entrou em cena o otário que agora vos escreve. Como não tinha mesmo jeito, tive, como única opção, de ir sentado em cima do tanque, procurando a todo custo travá-lo com as pernas. Mesmo ficando com metade do meu traseiro do lado de fora.
Desta forma, após passar pelo posto de gasolina e dar aquela carga máxima ao tanque, saiamos pela rua assustando todos que víamos. Subíamos no passeio e, após aproximar bem de cada vitima, dávamos aquela buzinada. O som era tão alto que teve uma senhora que quase desmaiou de tanto susto. Foi sacola pra todo lado.
Hoje fico pensando: e se aquilo explodisse? E se aquela senhora tivesse ido dessa para melhor? Enfim...

Havia também a brincadeira do telefone.
Quem já passou um trote ao vivo e em cores? Era bom demais!
Isso sempre acontecia quando ficávamos na casa do Silvio, escondidos na sala, atrás da porta, discando sem parar, para o posto de gasolina. O que mais gostávamos era poder estar vendo, a menos de dez metros da gente, a reação do pobre frentista que, furioso, quase sempre saía chutando tudo que via em sua frente.
Certa vez perguntamos se havia gasolina, ele prontamente nos disse que sim:
- Podemos ir aí então dar uma cheiradinha? – perguntamos.
E o cara, de tanta raiva, só faltava quebrar o telefone.

Pobre Sr. Anginho. Hoje tenho um enorme sentimento por ter contribuído pelo não êxito de seu comércio.
Quantas e quantas latas de Leite Souvenir, pêssego em calda, latas de feijoada, sardinha, além de quilos e mais quilos de amendoim, queijo parmesão e outras coisa mais, que devorávamos escondidos naquele depósito. Isso pra não falar das guerras de papel higiênico. Parecia batalha de confete, onde rolos e mais rolos passavam sobre nossas cabeças feito serpentina. Detalhe: Silvio Heleno dava as ordens e nós, como amigos fieis que sempre fomos, simplesmente acatávamos. Ou melhor, comíamos tudo.
Por ironia do destino, anos depois, este lugar se tornaria o local de ensaio do Pitomba

Nosso Cine-teatro SERSIL era um caso a parte.
Tudo começava com a projeção de filmes numa pequenina máquina a manivela. Coisa rara pra época. As seções eram feitas num daqueles quartinhos que ficavam próximo à escada da cozinha. Por sinal, sempre eram projetados os mesmos filmes e quase sempre eram as mesmas pessoas que iam assistir (um trator arando a terra e outro que me foge agora da memória)
E quando arrebentava o filme? Pelo menos umas dez vezes por seção. Mas as vaias faziam parte do show, pois nos faziam parecer que era cinema de verdade. O negócio era não parar de tocar a manivela.

Não sei por quê, mas teve um dia que, só pra sacanear, rasguei todos os ingressos. Silveleno, numa fúria sem fim, saiu correndo atrás de mim igual a um leão faminto. Passamos pelo posto de gasolina como um foguete, ao olhar de todos que ali estavam e que nada entendiam. Somente veio a desistir de me pegar quando já estava já bem próximo de minha casa.
O teatro era ainda mais interessante.
Fazíamos um picadeiro com arquibancada e tudo, em numa caixa de areia que ficava no fundo do quintal. Dantinho, vestido de palhaço com uma calota de caminhão na cabeça e carregando uma velha gaiola, fazia um tremendo sucesso. Eu gostava de contar piada (fracasso total). Renatinho também sempre fazia muito sucesso com as suas acrobacias que, de tão ousadas, chegou a ponto de um dia quebrar o braço. Como grand finale, nosso mágico Silveleno deixava todos boquiabertos com seu enigmático número. Tudo consistia em colocar fogo na água. Quem poderia imaginar que pedras de carbureto eram colocadas no fundo do recipiente? E todos aplaudiam de pé. Durante o show, vendíamos saborosas eugênias. Aquelas mesmas que pegávamos emprestadas, no frondoso pé em que se via somente o rabinho de uma égua. Também vendíamos castanhas. Essas eram colhidas em uma árvore que existia ao lado da antiga rodoviária. No final, fazíamos o caixa e dividíamos o dinheiro fraternalmente. Com o lucro de cada espetáculo, dava pra cada um de nós comprarmos duas a três balas de hortelã no bar do Zé Dias que, na época, funcionava na antiga rodoviária. Já ganhávamos dinheiro com a arte!
Na próxima semana, as primeiras oficinas eletrônicas, os primeiros clientes e a chegada (inevitável) da adolescência.

3 comentários:

  1. Parabéns Jorge e Serjão pelos temas e abordagens.
    È sempre bom darmos de vez enquanto uma pequena pausa em nossa vida fazendo uma inocente viagem dentro deste nosso lado criança. É este fantástico mundo perdido que, ainda existe dentro de cada um de nós, que verdadeiramente, nos acalma e equilibra.
    Muito interessante esta similaridade nas postagens, que de um lado diverte, de outro nos faz refletir. E esta química nos faz muito bem!

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  2. Era muito legal reunir a turma pra passar trote.
    Teve uma vez que perguntamos a um açougueiro se ele tinha pé de porco. Ele mais que depressa nos disse que sim. Aí perguntamos se ele tinha também, orelha de porco, focinho e rabo de porco. Após nos confirmar de que tudo teria simplesmente o respondemos:
    - Se tem mesmo tudo isso, então o senhor, é um porco de verdade!

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  3. Ontem conversando com um dos sobreviventes desta época, fui lembrado também, das inúmeras mangas que apanhávamos dentro do córrego. Ficávamos a catar “um monte” delas dentro daquelas águas já não tão limpas para depois consumi-las ou mesmo vende-las no Teatro SerSil.
    E para isso bastava apenas passar aquela aguinha no tanque do lavador e enxugá-las com a camisa.

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