sexta-feira, 25 de maio de 2018

AS MULÉ PELADA DO CINEMA



O convite não poderia ser mais tentador num daqueles dias de 1973:
─ Vamos matar as últimas aulas e assistir filme de mulé pelada no Cine Brasil?
Do alto da maturidade dos nossos 15/16 anos, não deveria existir assunto mais interessante do que a tal da “mulé” pelada. E a fissura pela nudez feminina, além de hormonal, devia-se a um fato muito simples: não havia disponibilidade desse conteúdo cultural tão apreciado pelos jovens.

Nos chamados “anos de chumbo”, vigorava uma censura tão intensa que, simplesmente, não havia nenhum tipo de mídia com pessoas nuas. A revista Status, que sairia no ano seguinte, publicava nus de atrizes, porém, nas chamadas partes pudendas e nos seios era adicionada uma névoa para que nada do que queríamos ver fosse visto.

Assim, nos restava o cinema. Depois de um trabalho danado para passar arriscadamente pela secretaria, ainda tínhamos que usar toda nossa lábia para convencer a Dona Zenith a nos deixar entrar. Naquela noite, o filme era Se Dom Juan fosse mulher, com Brigitte Bardot. Não precisa nem dizer que a nossa guardiã da sétima arte não quis nem conversar conosco. Expulsou-nos de primeira, e ainda ameaçou contar pra nossas mães. Que vergonha!!! Tivemos que despistar, dar a volta no quarteirão, e ficar olhando ali na rua lateral, pela gretinha da porta.

O tempo passou e acabei me tornando um cinéfilo inveterado (será que para ver as mulés peladas?), indo, sem sucesso, em todas as sessões, até que, em 1978, o Cine Brasil anunciou Laranja Mecânica. Sabia, através de leituras, que havia uma cena de nu frontal no filme e pensei que, finalmente, iria poder assistir à tal mulé pelada na sua plenitude. Qual não foi a minha surpresa quando a atriz correu completamente nua para a frente da cena: apareceram, do nada, umas bolinhas pretas, bem em cima dos genitais da moça, que corria e pulava, e as bolinhas pulavam atrás, ou na frente dependendo do ângulo.

Quando, já adulto, morava em outra cidade e me preocupava com o início de uma carreira profissional promissora, fui convidado por um casal de amigos para, junto com outros casais, assistirmos ao primeiro filme brasileiro pornô, o que era um marco para o fim da censura no país. Na mesma época, 1983, tiveram início as videolocadoras, e o filme estava em videocassete. Após um jantar animado e alguns coquetéis, fomos até a sala de TV, onde, ainda tomando um cafezinho, começamos a assistir ao filme. Gente, vi, por fim, a mulé pelada. E não só pelada, mas fazendo cada estripulia que eu nem sabia que existia. Resultado: fiquei com tanta vergonha daquele povo intelectual, que, simulando um mal-estar, saí pouco antes da suruba final, posteriormente descrita por um amigo, e fiquei um bom tempo sem conversar com aquelas pessoas, embora, privadamente, alugasse um daqueles filminhos, até mesmo para aprimorar o meu conhecimento da matéria.

Em 1988, já ocupando um cargo de administração na minha empresa, e conversando animadamente com a Secretária Municipal de Cultura na videolocadora do cunhado dela, sou surpreendido pela atendente que, de forma gentil, porém EM ALTO E BOM SOM, anuncia:
─ Senhor Jorge, acabou de chegar As Rapadinhas 2. O senhor quer que reserve para o senhor?

Crônica: Jorge Marin

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