sexta-feira, 20 de maio de 2016

NOS TEMPOS DO BOLOTE


Afinal, por que é que sempre temos tanta saudade de São João?

E não é só quem está longe que sente saudade. Quem mora na cidade também sente. Mas, não é saudade do local. É saudade do tempo. Sempre lemos nos comentários aqui no Blog como era bom viver na cidade “naquele tempo”, “no meu tempo”.

O que eu percebo é que “aquele tempo” do qual grande parte dos leitores fala se situa, geralmente, na época em que eram adolescentes e jovens. Este fato já dá bem uma pista do motivo “daquele” tempo (de juventude) ser tão bom.

Outras coisas, que ocorriam também “naquele” tempo, ajudam a explicar porque nos sentimos tão saudosos, e uma delas, fundamental, é que AS COISAS FUNCIONAVAM COMO DEVERIAM FUNCIONAR e, principalmente, AS PESSOAS AGIAM COMO SE ESPERAVA QUE ELAS DEVERIAM AGIR.

Assim, os papéis eram bem definidos: meu pai e minha mãe, por exemplo, eram homem e mulher, eram casados (na igreja e no civil), trabalhavam na Fábrica Sarmento e eram católicos fervorosos. Passaram para nós, filhos, que éramos obedientes e respeitadores, valores como: fé, honestidade e patriotismo.

Por isso, nossos “heróis” municipais eram pessoas honradas, trabalhadoras e cidadãs. Dentre todos os exemplos, um deles causava grande impacto: era o Bolote! Eterno delegado de polícia, o sr. Hercílio Ferreira cuidava da cidade como se fosse uma extensão da sua casa. Nada lhe passava despercebido: desde vagabundagem a bêbados, passando mesmo por moleques jogando bola na rua e até “moças” excessivamente maquiadas. Nada mesmo lhe escapava.

Por isso, numa certa noite, o delegado exemplar, que mais tarde viria a ser prefeito municipal, foi confrontado com uma situação inusitada: um grupo de rapazes tinha ido fazer uma visita à Roda, casa de prostituição na saída da cidade e, um pouco alterados, resolveram promover um quebra-quebra. Chamada pela proprietária, a PM foi ao local, mas havia um obstáculo que obrigou que o Bolote fosse até lá no seu fusquinha.

- Que foi, cabo? Por que não conduziram os baderneiros pra delegacia? – E o militar, levando o delegado para o lado, confidenciou-lhe:
- É que o seu filho está entre eles. – E o Bolote nem hesitou:
- Pois faça com que seja o primeiro a subir na caminhonete. Mais alguma coisa?

E assim funcionavam as coisas “naquele” tempo. Um tempo muitas vezes meio tosco, simplista. Mas, com certeza, uma vida mais fácil de ser vivida.

Crônica: Jorge Marin
Foto     : arquivo do Mangueira, reproduzida por Fernando de Lélis

4 comentários:

  1. Jorge, adorei sua crônica. Você, em poucas palavras, definiu o homem que era o nosso saudoso "Bolote": exigente ao extremo, mas justo como ninguém!

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    1. Há muito que queria falar sobre o Bolote, amigo Nilson. Você bem sabe como nós, naqueles tempos, criticávamos a truculência dos militares. No entanto, embora o Bolote agisse com um rigor até excessivo, nós o aceitávamos. Era como se fosse um pai bravo, porque chegávamos a ter medo dele, mas sabíamos que era um homem de bem. Abração.

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  2. Parabéns magnífica crônica, realmente este é o nosso sentimento saudosista. Quanto ao Bolote, era exatamente este homem com sua honestidade e seu caráter, que o tornou o MITO da cidade. Tempos magníficos que infelizmente não voltam mais.

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    1. Obrigado, Paulo Cesar. Diferente "daquele" tempo, hoje vivemos os tais tempos líquidos onde tudo é relativo. Mas, neste cipoal ideológico, uma coisa não deve ser colocada de lado: a lei e o senso comum. Por isso, a figura do Bolote, como símbolo, ainda é imbatível.

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