Alfredo
está na janela e começa a chover forte, mas o sol, também forte, não
desaparece.
Vista do
décimo andar, a avenida Rio Branco apresenta um cenário pouco usual neste 31 de
dezembro. Não há carros e, com a chuva, pombos fazem rasantes chegando mesmo a
pousar na pista.
Sem os
colegas de república, que foram passar as festas na praia, só restou ele. A
ausência da namorada, em um congresso sobre educação em Helsínque (pronuncia-se
Rélsinque, diz ela) também não ajuda muito.
O calor
permanece insuportável, a chuva para. O rapaz vai até o note e, já no Facebook, digita:
- Onde
curtir o réveillon aqui em Juiz de Fora???
O
primeiro comentário é zoação:
- Com
este calor, dentro do Paraibuna, com as capivaras. kkkkk
Alfredo
não gosta deste uso do “kkk”.
Vem outro
da tia:
- Em vez
de pensar em festa, você deveria vir para a missa de mês do tio Romildo.
Um colega
de faculdade:
- Na boa,
brother, acho esse lance de réveillon pura manipulação capitalista, só para
vender bebida e alienar ainda mais o povo.
Outro:
- Se a
gente conseguir descolar um táxi, parece que tem uma treta lá na BR, mas eu não
sei direito onde é nem a que horas começa.
A amada,
direto da Finlândia, também se manifesta:
- Mor,
aqui tá o maior frio, menos 4 graus, estamos passeando pelas ruas sem carros,
pois aqui quase não tem. Divirta-se no réveillon. Eu vou voltar pro hostel,
tomar um banho quente e dormir. Te amo!
Alfredo
se lembra que só queria saber mesmo de algum boteco que ficasse aberto na hora
da virada, mas parece que o seu pedido se transformou num debate ideológico na
internet. Pode até viralizar, pensa. E vem a mãe:
- Filho,
juízo aí nas comemorações. Juiz de Fora é uma cidade grande. Lembre-se de que,
no ano passado, você foi parar no hospital por causa da bebedeira. Te cuida. Eu
e teu pai te amamos. Feliz 2016!
Pronto,
mãe queimou meu filme. Ainda chegam: uma corrente, uma novena, fotos de
cachorro, passarinho e um vídeo do último show da banda Calypso.
Alfredo é
calmo, porém decidido. Pega um vinil na estante e coloca no toca-discos. Abre
uma cerveja, caminha até janela, confere a rua e joga o notebook lá embaixo.
Volta e canta junta com Raul. Vem, 2016!
Foto : frame do filme "The Wall"
Isso porque ele é calmo kkkkkkkkk
ResponderExcluirJorge, o escritor.
ResponderExcluirTudo um show: da criatividade e pertinência do texto à escolha da imagem.
Parabéns !!!