sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

ESPERANDO 2016


Alfredo está na janela e começa a chover forte, mas o sol, também forte, não desaparece.

Vista do décimo andar, a avenida Rio Branco apresenta um cenário pouco usual neste 31 de dezembro. Não há carros e, com a chuva, pombos fazem rasantes chegando mesmo a pousar na pista.

Sem os colegas de república, que foram passar as festas na praia, só restou ele. A ausência da namorada, em um congresso sobre educação em Helsínque (pronuncia-se Rélsinque, diz ela) também não ajuda muito.

O calor permanece insuportável, a chuva para. O rapaz vai até o note e, já no Facebook, digita:
- Onde curtir o réveillon aqui em Juiz de Fora???

O primeiro comentário é zoação:
- Com este calor, dentro do Paraibuna, com as capivaras. kkkkk
Alfredo não gosta deste uso do “kkk”.

Vem outro da tia:
- Em vez de pensar em festa, você deveria vir para a missa de mês do tio Romildo.
Um colega de faculdade:
- Na boa, brother, acho esse lance de réveillon pura manipulação capitalista, só para vender bebida e alienar ainda mais o povo.
Outro:
- Se a gente conseguir descolar um táxi, parece que tem uma treta lá na BR, mas eu não sei direito onde é nem a que horas começa.

A amada, direto da Finlândia, também se manifesta:
- Mor, aqui tá o maior frio, menos 4 graus, estamos passeando pelas ruas sem carros, pois aqui quase não tem. Divirta-se no réveillon. Eu vou voltar pro hostel, tomar um banho quente e dormir. Te amo!

Alfredo se lembra que só queria saber mesmo de algum boteco que ficasse aberto na hora da virada, mas parece que o seu pedido se transformou num debate ideológico na internet. Pode até viralizar, pensa. E vem a mãe:
- Filho, juízo aí nas comemorações. Juiz de Fora é uma cidade grande. Lembre-se de que, no ano passado, você foi parar no hospital por causa da bebedeira. Te cuida. Eu e teu pai te amamos. Feliz 2016!

Pronto, mãe queimou meu filme. Ainda chegam: uma corrente, uma novena, fotos de cachorro, passarinho e um vídeo do último show da banda Calypso.

Alfredo é calmo, porém decidido. Pega um vinil na estante e coloca no toca-discos. Abre uma cerveja, caminha até janela, confere a rua e joga o notebook lá embaixo. Volta e canta junta com Raul. Vem, 2016!

Conto curto: Jorge Marin
Foto           : frame do filme "The Wall"

2 comentários:

  1. Jorge, o escritor.
    Tudo um show: da criatividade e pertinência do texto à escolha da imagem.
    Parabéns !!!

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BRIGADU, GENTE!

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