Com
certeza, o aparelho celular veio em muito aproximar aqueles que estão longe,
mas estaria mentindo se omitisse não achar também que, em certas ocasiões, veio
a distanciar aqueles que estão próximos.
Não
que eu tenha alguma coisa contra essa revolução tecnológica tão útil, mas é
desagradável depararmos com um grande amigo que não vemos há anos, e sermos
privados de um simples aceno. Possivelmente, um bate-papo com alguém que
poderia até mesmo estar do outro lado do planeta nos colocaria também, naquele
momento, a centenas de quilômetros um do outro. Trocando em miúdos, aqueles que
se encontram próximos acabaram mesmo é ficando relegados a um segundo plano.
Dia desses, entrei com certa pressa no
açougue e, coincidentemente, naquela hora, encontravam-se no recinto apenas eu
e o balconista. Simultaneamente ao meu pedido, tocou o celular do referido
atendente e, pra variar, tive que ficar mais ou menos cinco minutos em silêncio,
esperando apenas que o tal sujeito terminasse sua conversa no celular. Fazer o
que nesta hora, pois, do contrário, só me restaria mesmo ficar proseando com
aquele montão de carne. Haja paciência, e um pouquinho mais, o açougue teria
perdido um freguês.
Não
tardará o dia em que teremos que fazer uma chamada para conversar com amigos
que se encontram do outro lado da rua.
Até
em videogame, máquina fotográfica e
outros babados mais, essa grande invenção foi transformada, e, se observarmos
bem, é muito comum encontrarmos pessoas flutuando pela calçada caminhando distraidamente
de olhar grudado na telinha. Já vi gente caindo em buraco, trombando em poste e
até mesmo entrando em um orelhão (alienação total!). É o físico desfilando
pelas ruas, enquanto a consciência vai viajando pelo ar.
E
as intimas conversas pessoais que nos são confidenciadas, ou melhor, nos são empurradas
ouvidos adentro? Isso acontece a todo instante, sejam em esquinas, praças, velórios,
festas, restaurantes, banheiros etc.etc.etc. E tudo em alto e bom som!
Domingo
passado aconteceu algo assim na missa, quando, na consagração, todos teriam
sido pegos de surpresa com a chamada de um celular. Na verdade, era apenas mais
uma daquelas pessoas que estavam presentes de corpo, enquanto a consciência e o
espírito vagavam pelo espaço.
E
quando temos que interromper uma conversa com pessoas que estão a pouco mais de
um metro de distância, para dar lugar àqueles que se encontram lá em Bagdá? E
tudo sem que o dito intruso virtual venha, pelo menos, nos pedir licença.
Geralmente,
ficamos com cara de bundão, enquanto a esperar novamente nossa vez, vemos simplesmente
ir embora um precioso momento. E o que é pior, escutando conversa fiada dos outros,
ou melhor, somente a réplica!
Observem
também a fisionomia de um motorista quando está a falar no celular:
se
estiver estacionado, tudo bem, mas, se acaso em movimento, é melhor sair da
frente, pois ele não se encontra ali.
Certa
vez, teve uma senhora que, após se posicionar repentinamente ao meu lado na
calçada, perguntou-me se não havia me esquecido de desligar e tirar as bananas
do forno. No impulso, ainda cheguei a responder: - Bananas?
Só
aí que fui perceber que a conversa não tinha nada a ver comigo.
Mas,
de tudo isso, o que mais acho interessante é aquela famosa saidinha para
atender uma chamada. De que adianta afastar o corpo, se a intimidade é
propagada em alto e bom som pelo ar?
E
assim, dez anos após ter escrito esta croniqueta, confesso ficar sempre admirado
quando me deparo com reportagens na TV, artigos em jornais, revistas e afins,
alertando sobre o hábito DESATINADO de alguns usuários para com seus aparelhos
e dos muitos males ou mesmo DEPENDÊNCIA causados pelos EXCESSOS.
No
mais, se o negócio é bão mesmo, não custa nada lembrar que prudência e canja de
galinha não fazem mal a ninguém.
Crônica:
Serjão Missiaggia
Foto : Facebook
Fico me policiando para manter um mínimo de elegância no uso público do celular. Acredito que na maior parte do tempo eu consigo me sair bem, mas me exige uma constante atenção.
ResponderExcluirPenso que o problema com as falas e fotos com o celular está na combinação de pouca noção e muita vaidade.