quarta-feira, 8 de setembro de 2010

AINDA A INCIVILIDADE



Agradeço, inicialmente, a manifestação dos leitores que postaram comentários, ou daqueles que enviaram e-mails, pois serviram para reforçar minha percepção de que não estou sozinho nas minhas queixas, que não se trata apenas de rabugice. Algumas pessoas entenderam que o fenômeno poderia estar restrito ao meu universo de relacionamentos, mas o fato é que se trata mesmo de um mal maior dos dias atuais.
A incivilidade nos obriga, a cada momento, a testemunhar cenas variadas de grosseria pela disputa acirrada de espaço. Há poucos dias, na porta da UFJF, um carro particular tocou, de leve, a traseira de um táxi: o taxista, imediatamente, saiu do veículo, armado com um cano, e partiu pra cima do motorista do carro que, providencialmente, já o esperava com um reluzente revólver na mão.
Na entrada da escola do meu filho, ele foi beber água e, como havia um coleguinha no bebedouro, ensinei que ele deveria esperar até que o colega saciasse a sede. Enquanto estava doutrinando o meu baixinho, chegaram dois alunos maiores e, simplesmente, entraram na nossa frente. É claro que, num caso desses, eu consigo ser bem assertivo e, sem desrespeitar os direitos dos garbosos jovens, mas já colocando ostensivamente meu cotovelo na frente dos dois, fui falando educadamente:
- Pode beber, meu filho, pois seus dois colegas estavam distraídos e não viram a gente. E os dois ainda ficaram brigando entre si, para ver quem iria beber em seguida.
Ou seja, num mundo em que os adultos, muitas vezes bem idosos, perderam a vergonha de xingar os outros descaradamente, imaginem os jovens que são naturalmente mais impetuosos! A regra de ouro, que antigamente era “não faças a outros o que não queres que te façam”, passou a ser, ao que parece, cada um por si próprio, e também contra todos.
Dessa forma, perdemos a noção do direito do próximo e cada um sai, loucamente, em busca do seu próprio direito, da sua felicidade, do seu prazer, do seu objeto de consumo e... danem-se os outros. Não é por acaso que as instâncias mantidas pelo poder público e que supostamente defendem os direitos individuais, como Procon, Juizado de Pequenas Causas e outras, vivem apinhadas, com pessoas discutindo, desde abusos contra consumidores a xingamentos mútuos no Orkut.
Nestes dias, com a campanha eleitoral em marcha, multiplicam-se as cenas de incivilidade ocorridas entre aqueles que, infelizmente, serão nossos próximos dirigentes. Também nas empresas, é comum que estes novos capatazes, chamados de gerentes, expressem abertamente seu descontentamento com seus colaboradores aos gritos, enquanto os subalternos, irritados, descontem sua insatisfação nos clientes.
Nas escolas, mais do que furar filas, é comum o fenômeno conhecido como “bullying”, em que alguns estudantes de má índole praticam um verdadeiro terrorismo contra seus colegas. Sem contar as inúmeras agressões – até mesmo físicas – aos professores. Temos a tendência a ficar afirmando que tudo não passa de falta de limites, mas, na verdade, ao infligir constrangimento físico e psicológico aos mais novos, não estariam os alunos repetindo um ritual do mundo adulto?
Eu me lembro de uma aula do Betto Vampiro, no Ginásio do Sôbi, que nunca saiu da minha memória, e que venho sempre repetindo para os meus filhos. Ele chegou com o seu costumeiro abrigo esportivo e propôs a seguinte pergunta: quanto tempo seria necessário para se varrer a cidade de Londres? Depois de várias tentativas e de muita discussão, ele deu a resposta:
- Apenas quinze minutos – e, ante diversos protestos, completou – se cada um varrer em frente à própria casa.
Esta pode ser uma boa pista para o começo da resolução do problema da incivilidade. É na casa de cada um de nós, e também na escola, que pais e professores temos que repensar e reescrever o conceito de cidadania. Para isso, é preciso que cada um escolha adotar as boas maneiras no convívio social, mesmo se provocados, mesmo se nosso carro for fechado, mesmo se o motoqueiro arrancar nosso retrovisor.
A única forma de reconhecer o direito alheio é praticando, nós mesmo, as boas maneiras: ser cortês sem subserviência e ensinar aos mais novos de forma clara e objetiva. Não se trata de moralismo, mas de sobrevivência social. E, como vivemos em sociedade, não vejo outra alternativa.

(Crônica: Jorge Marin)

5 comentários:

  1. Sabe Jorge,somos de uma geração que respeitava,que apenas no olhar o respeito era sentido.O tempo passou e as vezes nos assusta, e fico pensando o que é certo hoje?Tem este lado desta geração, que as vezes não concordamos,mas que de outro lado lutam e enfrentam mais que nós.Nós eramos mais submissos.Vamos ensinar as novas gerações esses valores antigos, pois sei que os pais deles tiveram e não sei porque não seguem.Abraço

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  2. Amigo Jorge,você está coberto de razão,nos dias atuais as pessoas parecem estressadas o tempo todo e estão,infelizmente,deixando de lado as regras de boa convivência em sociedade.Isso vem acontecendo até mesmo em pequenas cidades como a nossa São João.Lamentavelmente.

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  3. Jorge,
    Parabéns mais uma vez pela bela abordagem na crônica “Ainda a Incivilidade”.
    Muito bom saber que outras pessoas comungam conosco o mesmo pensamento.
    E Vamo que Vamo

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  4. Jorge;
    O que me deixou "feliz" é que eu não estou sozinha nos meus pensamentos. Cheguei a pensar que era coisa de idade...
    Mas vejo que sensibilidade são para alguns..Parabéns ,vc soube colocar tudo muito bem.

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  5. Sylvio disse...
    “Gentileza gera gentileza” era a filosofia básica usada pelo ‘Profeta Gentileza’ no Rio de Janeiro. É este também o tema adotado em uma campanha permanente pelo jornal Tribuna de Minas, de Juiz de Fora e pela prefeitura da mesma cidade nas escolas municipais no ano de 2009. Bom ver que existem pessoas que continuam cuidando das roseiras, apesar de seus espinhos, para que possamos desfrutar da beleza e do odor das rosas. Acredito que o caminho mais óbvio para se viver em um cotidiano hostil seja proteger a si mesmo e aqueles que lhe são importantes de ambientes onde constantemente não há respeito; depois investir em um contínuo esforço policiando a si mesmo para não se tornar desnecessariamente agressivo e compartilhar desta opinião com que o cerca, lembrando que os exemplos convencem mais do que as palavras. Por último rezar ou contar com a sorte para que sua família e seus amigos não se tornem vítimas de alguma destas bestas cegas que andam pelas ruas. Pequenas gentilezas como abrir uma porta, ceder um lugar no ônibus ou ajudar a carregar algo pesado transformam o dia em algo menos duro ou estéril. Saber que se pode contar com a boa vontade ou ajuda dos amigos e, acima de tudo, de algum desconhecido, transforma o mundo em um lugar mais fácil de se viver.

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