sexta-feira, 25 de junho de 2010

TIO PITOMBO E AS COPAS



Capítulo 4

Estamos esperando o jogo do Brasil com Portugal. Tio Pitombo descasca umas laranjas com seu canivete espanhol. Resmunga que o povo está aproveitando o jogo como pretexto para encher a cara e fazer bagunça. Falo com ele que são coisas de jovens e que, provavelmente, em 1958, ele deve ter feito a mesma coisa.

“Tenho certeza de que eu não fazia essas papeatas não. A gente torcia por amor ao Brasil, vibrava com as jogadas, com a transmissão do Braguinha, o locutor da Rádio Panamericana, que era a que pegava melhor. Mas a transmissão ainda assim era muito fraca, parecia uma sanfona, às vezes aumentava, outras, diminuía e a gente praticamente não ouvia nada. Na Copa de 58, não éramos considerados os favoritos, pois nossa equipe era muito jovem: o Feola, ao contrário do Dunga, relutou um pouco mas convocou o garoto Pelé que era um fenômeno no Santos. Mas tínhamos medo que o time não tivesse o equilíbrio emocional para vencer uma copa, pois muitos dos nossos jogadores eram bons, mas meio indisciplinados, como o Garrinha, por exemplo.
O grande time, capaz de parar a gente, era a Inglaterra. Mas, de novo, como na copa passada, um acidente aéreo acabou ajudando: foi em Munique e o time base da seleção inglesa, que era o Manchester United, perdeu grandes jogadores da época como o Roger Byrne, Edwards e Tommy Taylor. Quem escapou com vida foi um jovem, chamado Bobby Charlton que, em 70, ainda jogou contra nós.
A televisão tem falado muito dessa copa, mas eu acho que o mais importante de tudo foi a atitude do Didi: no jogo final, no estádio Rassunda, a Suécia marcou de cara, logo aos 4 minutos, com Liedholm. Aí deu aquela tremedeira na seleção brasileira, exceto no Didi, a gente chamava ele de Príncipe Etíope, que foi lá no fundo do gol, pegou a bola, levantou a cabeça, ele tinha ganhado da Suécia com o time do Botafogo, e gritou pra todo mundo, imagino que tenha pedido pra terem vergonha na cara. O fato, como você sabe, é que viramos e ganhamos de 5 a 2. Até hoje, lembro o gol de empate, foi assim: o Brasil está perdendo por 1 a 0 para a seleção da Suécia. Vai para o ataque o time brasileiro, a bola está com Zito. Zito conduz pela sua linha intermediária, avança um pouco mais pela direita, Garrincha está solto, é lançado. Domina Garrincha, chama Axbom, passa pela primeira vez, joga para a direita, joga o corpo para a esquerda, saiu-se muito bem, passa para a frente, vai para a linha de fundo, vai se aproximando da linha de fundo. Atenção, cruzou, entra Vavá, atira, e é gol. Gooooooooolllllll da seleção brasileira. Está empatada a partida na Suécia.”

Ver aquele velho gritando gol dá um arrepio e até um nó na garganta. Paramos para assistir ao jogo do Brasil. Saio para ver as comemorações, mas não tem comemoração, também não há muito para se comemorar: um Brasil apático e uma seleção portuguesa um pouco ressabiada, talvez pelos 6 a 2 da última partida. Depois, volto para assistir Espanha e Chile com o Tio e ele parece muito feliz por jogar contra os chilenos.

“Me lembro bem que o jogo entre Brasil e Chile, na copa de 1962, estava marcado para o Estádio Sausalito em Viña Del Mar, mas, para dar mais renda, foi transferido para o Estádio Nacional em Santiago. Tinha muito país europeu querendo sediar esta copa do mundo, mas a FIFA entendia que, após duas copas na Europa, era a vez de um país americano. Quem comandou a reforma e a construção dos estádios (este Sausalito era novinho, foi construído para a copa) foi um brasileiro naturalizado chileno chamado Carlos Dittborn. Ia indo tudo muito direitinho até que, em maio de 1960, um terremoto arrasou o Chile. Acho que foi 9,5 pontos na escala Richter. O fato é que morreram 5.000 pessoas e 25% da população ficou desabrigada. Pensaram em cancelar a copa, mas esse brasileiro falou uma frase que ficou famosa, ‘Porque nada tenemos, lo haremos todo’ (porque nada temos, faremos tudo). E não é que as obras ficaram prontas antes do combinado?
Mas, voltando ao jogo do Brasil com o Chile, foi numa quarta-feira, dia 13 de junho e o Estádio Nacional estava atopetado de gente, quase 73.000 pagantes. Esta mudança de local gerou um bafafá danado: o Paulo Machado de Carvalho, que era o chefe da delegação, vestiu o terno marrom que tinha usado na conquista da copa de 58, proibiu que os jogadores comessem qualquer coisa no hotel: de manhã cedo, foi um pessoal da comissão técnica para comprar salame, mortadela, queijo e pão. O jogo foi às duas e meia da tarde e nosso time só comeu sanduíche. Ah, e tivemos que viajar escondidos também: com medo de alguma hostilidade, não fomos de ônibus para Santiago, mas de trem; nosso ônibus ficou escondido num bairro de Santiago onde o trem parava, aí descemos do trem, pegamos o ônibus e fomos para o estádio.
O jogo, como você deve saber, porque está passando na televisão o dia inteiro, foi 4 a 2 para nós: Garrincha, que acabou expulso, marcou aos 9 e aos 31, o tal de Toro descontou e o primeiro tempo ficou 2 a 1. No comecinho do segundo tempo, o Vavá fez 3 a 1, Sanches diminuiu aos 16 e o Vavá fechou a goleada aos 32.
Na final, com a Tcheco-Eslováquia, que tinha machucado o Pelé nas oitavas, mandamos 3 a 1, com gols do Amarildo, Zito e Vavá. E acho que fomos injustos com os chilenos, porque eles torceram descaradamente para nós. No sábado, eles tinham disputado o terceiro lugar com a Iugoslávia, foi um jogo duríssimo, em que o Chile ganhou nos 45 minutos do segundo tempo com um gol de Rojas. A torcida cantavam um refrão assim: hoy Chile tercero, mañana Brasil en primero!
Você vem amanhã para assistir Uruguai e Coreia do Sul?”

Não, tio, amanhã eu não posso, mas, com certeza, venho no domingo para assistirmos Inglaterra e Alemanha.

(Artigo - Jorge Marin)

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