Sentado no
ônibus, voltando pra casa, percebo que algo me perturba, e trata-se de uma
música irritante que vem do banco ao lado. Não é uma musiquinha do tipo
daquelas que tocam em celular; é um baita funk que sai de um rádio em forma de
lata de cerveja.
Estamos
nos últimos bancos do ônibus. Eu tentando cochilar e uma típica família
mineira: nos penúltimos bancos, uma mãe, entre seus trinta quase quarenta, ao
lado da filha que deve ter no máximo quatorze anos e que está sintonizando a
geringonça, atrás um filho ainda mais jovem cabeça semirraspada e penteado meio
punk meio moicano. O pai, um senhor talvez um pouco mais novo que a mãe, está
no banco à minha frente do lado oposto ao resto da família.
A princípio, uma cena urbana típica e
corriqueira, a não ser por um detalhe: as letras das músicas que, no último
volume, invadem todo o veículo. Não vou repeti-las aqui no Blog porque, mais do
que mau gosto, trata-se de uma agressão. Imaginem uma consulta ginecológica
descrita pela Dercy Gonçalves. Pois bem, é três vezes pior do que isso!
Faço um
pouco de humor aqui, meio que para amenizar as coisas, mas, na verdade, eu, que
sempre fui contra qualquer tipo de censura, me senti profundamente agredido. Ainda bem
que havia deixado o meu filho um pouco antes. Entre a assertiva de pedir que
desligassem aquilo e a preguiça de ter que entrar em conflito com um grupo de
pessoas que pareciam estar bem tranquilas com aquela nojeira toda, preferi aguardar
e descer mais à frente, pois já estava me aproximando de minha casa.
Depois,
caminhando, fiquei me perguntando qual é a necessidade que têm as pessoas hoje
de exibir, de escancarar, de arreganhar intimidades para todos, inclusive para
os que não querem ter conhecimento desses detalhes?
A lista é
longa: além das tais letras escatológicas, infligidas nos ônibus e nos
poderosos sons automotivos, somos expostos a todo tipo de exibicionismo gratuito
em programas televisivos. Que fique claro: não tenho nenhum tipo de
constrangimento em assistir obras de arte que tenham conteúdo sexual. Mas, como
diz o programa de TV, “cada coisa em seu lugar”. Por que é que eu, na companhia
de um tanto de pessoas voltando pra casa, sou obrigado a ouvir tamanho lixo? No
caso da TV, ainda posso não ligar naquele canal, e não ligo mesmo, mas, no
ônibus, é brigar ou descer.
Finalmente,
uma afirmação àqueles que acham que isso tudo é natural, moderninho, sinal
dos tempos etc. Não é! Isso é uma deformidade de caráter, um exibicionismo
agressivo e uma tremenda idiotice.
Certo
estava Nelson Rodrigues: “subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de
séculos”.
Crônica:
Jorge Marin
Foto : disponível em http://transcooper.com.br/noticias/haddad-aprova-lei-que-proibe-musica-alta-em-onibus
Excelente postagem. Ainda pior é estarmos aqui na terrinha prisioneiros dos automotivos, que invadem nossos lares sem que nada possamos fazer ou que façam por nós.
ResponderExcluirNostra
Muito desses fatos, podendo até ser caracterizados como pertubação da ordem, é oriunda de um código de posturas, até então existente somente no papel.
ResponderExcluirAinda estamos longe de saber o que é respeito , dever e cidadania.
ResponderExcluirO código de postura não pode ficar só no papel , assim como nosso povo, também não pode ficar sem uma educação de qualidade.
Mika
Talvez seja o caso das pessoas de bem, os cidadãos comuns, passarem também a fazer barulho, e a reivindicar o seu sagrado direito ao silêncio, à paz e à decência. Não podemos esquecer de que, na última vez em que o povo foi às ruas, algumas vitórias foram conquistadas. O Ulysses Guimarães dizia que "a única coisa que mete medo em político é o povo na rua".
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