quarta-feira, 19 de novembro de 2014

CASOS DE ASSOMBRAÇÃO


Ainda pegando uma carona nos causos de criança, numa dessas noites de setembro, enquanto da varanda de minha casa observava o bailar das folhas ao vento rolando pela rua, fiquei a lembrar de quando, reunidos com a turminha na calçada e sentados geralmente debaixo de um daqueles postes de ferro da antiga Companhia Força e Luz com suas lâmpadas incandescentes que nem tanto clareavam, ficávamos brincando de contar casos de assombração ali no Beco do Arruda. E isso, muitas vezes, esticava até um pouco mais tarde da noite, sendo que, naquela época, o horário de 22 horas era a nossa referência de tarde da noite.

Época da chegada das primeiras televisões em algumas casas da vizinhança, fazendo com que, geralmente no horário da novela, o local já se transformasse numa pequena cidade fantasma, onde pessoas desapareciam como passe de mágica e automóvel somente vez ou outra.

Pés descalços, quase sempre sem camisas e de olhos arregalados, ali ficávamos horas e horas escutando os mais variados e arrepiantes casos. Entre eles o do Lobisomem, Almas Penadas, Saci-Pererê, Caveiras do Cemitério e outros. Confesso que esta tal de MULA SEM CABEÇA é que me tirava do sério, principalmente quando cada qual tomava o rumo de casa, e eu teria que ir embora sozinho.  Nessa hora, simplesmente fechava os olhos e, saindo em disparada pelo centro da rua, iria abri-los somente quando entrasse em casa.                                                                             

Confesso que passar próximas àquelas sinistras bananeiras do terreiro do Nico Ferreira, com suas imensas e assustadoras folhas balançando sobre a cerca de bambu e caídas para lado do Beco, não era fácil não. Ainda pior eram minhas imaginárias alternativas de conseguir escapar de uma possível emboscada da tal mula ali na travessia da pequenina ponte que existia sobre o Stidum.

Enquanto isso, naquelas ruas ainda sem calçamento, os estranhos redemoinhos de poeiras ficavam a dançar ao vento, servindo de coadjuvantes, num pueril e imaginoso cenário de terror.

Um bom banho, e, após assistir o anuncio da TV alertando aos pais que o horário não era permitido para menores de 12 anos, ia dormir feliz da vida, pois, afinal de contas, tínhamos certeza de que no outro dia, é claro, depois da lição de casa, tudo novamente começaria.

Crônica: Serjão Missiaggia
Foto     : Parlim, disponível em http://parlim.blogspot.com.br/2009_10_01_archive.html .

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