Ainda
pegando uma carona nos causos de criança, numa dessas noites de setembro, enquanto
da varanda de minha casa observava o bailar das folhas ao vento rolando pela
rua, fiquei a lembrar de quando, reunidos com a turminha na calçada e sentados
geralmente debaixo de um daqueles postes de ferro da antiga Companhia Força e
Luz com suas lâmpadas incandescentes que nem tanto clareavam, ficávamos brincando
de contar casos de assombração ali no Beco do Arruda. E isso, muitas vezes,
esticava até um pouco mais tarde da noite, sendo que, naquela época, o horário
de 22 horas era a nossa referência de tarde da noite.
Época da
chegada das primeiras televisões em algumas casas da vizinhança, fazendo com
que, geralmente no horário da novela, o local já se transformasse numa pequena
cidade fantasma, onde pessoas desapareciam como passe de mágica e automóvel
somente vez ou outra.
Pés
descalços, quase sempre sem camisas e de olhos arregalados, ali ficávamos horas
e horas escutando os mais variados e arrepiantes casos. Entre eles o do Lobisomem,
Almas Penadas, Saci-Pererê, Caveiras do Cemitério e outros. Confesso que esta
tal de MULA SEM CABEÇA é que me tirava do sério, principalmente quando cada
qual tomava o rumo de casa, e eu teria que ir embora sozinho. Nessa hora, simplesmente fechava os olhos e, saindo
em disparada pelo centro da rua, iria abri-los somente quando entrasse em casa.
Confesso
que passar próximas àquelas sinistras bananeiras do terreiro do Nico Ferreira, com
suas imensas e assustadoras folhas balançando sobre a cerca de bambu e caídas para
lado do Beco, não era fácil não. Ainda pior eram minhas imaginárias alternativas
de conseguir escapar de uma possível emboscada da tal mula ali na travessia da
pequenina ponte que existia sobre o Stidum.
Enquanto
isso, naquelas ruas ainda sem calçamento, os estranhos redemoinhos de poeiras
ficavam a dançar ao vento, servindo de coadjuvantes, num pueril e imaginoso
cenário de terror.
Um bom
banho, e, após assistir o anuncio da TV alertando aos pais que o horário não
era permitido para menores de 12 anos, ia dormir feliz da vida, pois, afinal de
contas, tínhamos certeza de que no outro dia, é claro, depois da lição de casa,
tudo novamente começaria.
Crônica:
Serjão Missiaggia
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