sexta-feira, 30 de setembro de 2011

PAULINHO JÁ VAI ALI 2 - UM MAGRELO NA MAGRELA

Foto de Stephanie Mohr, publicada no site www.123rf.com

Na semana passada, falávamos de um certo Paulinho e sua magrela.
Acho fantástico, original e fora de qualquer padrão que regeria as normas sociais vigentes, seu exótico estilo no pedalar. Alguém de vocês já viu um ser humano andar de bicicleta daquela forma? Autenticidade pura! Coisa pra dar inveja a muitos prisioneiros de paradigmas sociais.

Pra começo de conversa a posição do selim fica quase a um palmo acima do guidão. Ai vocês já imaginam a visão catastrófica. Ainda mais pra quem está vindo de trás.
O assento fica tão alto que, enquanto seu traseiro segue nos mostrando a direção do céu, suas pernas, esticadérrimas, vão à medida do possível, tentando alcançar os pedais.
Na verdade, pela inclinação de sua cabeça em relação ao traseiro, temos a nítida sensação que a bicicleta está sempre morro abaixo. Mesmo que ainda numa reta.
E, desta forma, quilômetros vão, quilômetros vêm.
Como todos já deverão estar desconfiados, este meu amigo não poderia ser outra pessoa que não fosse nosso conhecidíssimo Paulinho Javali. Por sinal, figura esta de uma simplicidade ímpar, excelente pessoa e muito divertido. Ouso até a dizer que o considero uma espécie em extinção.
Certa vez ao questionar o porquê de Javali no apelido, disse que foi quando seu irmão o empurrou janela abaixo e teria caído de cara no chão. Aí, segundo ele, só deu pra salvar as duas presas laterais.
Foi juntando tudo isso, que, carinhosamente, passei a tratá-lo de Paulinho Já Vai Ali. Lá, acolá, além, como preferirem. Só sei que ele não para de ir. E cada vez mais longe. Poderíamos dizer que sua idade caminha diretamente proporcional aos quilômetros pedalados, ou seja, quanto mais “véi” mais longe ele vai.
Quando muito, carrega consigo, principalmente nos momentos de calor intenso, uma garrafinha de água, boné e pedaços de rapadura. Disse que existe em sua casa um pé “carregadin” de maracujá e, quando chega das “voltinhas”, é só fazer uma jarra inteira de suco e beber uns dez copos de uma vez. Segundo ele, não tem melhor energético.
Ele sempre soube que fui também um aficionado por bicicletas, sendo assim, pouco tempo atrás teve a petulância de me convidar pra dar uma chegadinha a Argirita. E com direito a voltar por Taru. Não tive outra reação que não fosse a de dar uma boa risada e perguntar:
- O retorno do féretro será por onde?
Ao observar que fiquei um tanto espantado, ainda veio tentando aliviar a barra:
- Numa boa, Serjão! Parece que é longe, mais é! Se não ficarmos parando muito no caminho, no máximo em quatro horas a gente ta pisando no centro da cidade.
- Ou num hospital, pensei. E o danado nem chegou a comentar sobre o tempo que levaríamos na volta. (Se é que haveria uma) Do calor então, nadinha. E muito menos de cachorros e na possibilidade de se furar algum pneu etc etc etc... Parecia que iríamos e voltaríamos, literalmente, voando. Se bem que, descendo aquela bela serra de Taru, talvez fosse esta a sensação que teria. Mesmo assim fui impiedoso e implacável.
- Fica pra próxima, Paulinho! Hoje tem formula Indy na TV! Sinceramente, prefiro ficar vendo o asfalto deitadinho da minha cama! Desta forma, brincando com ele, me despedi.
Na semana que vem, velocidade, cachorros (fila) e o tombo.

(Crônica: Serjão Missiaggia)

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A APOSENTADORIA DO CACHORRO DE HARRY POTTER (COITADO!)

Foto do site http://www.germanshepherdrescue.co.uk/padfoot-harry-potter.html

Mais uma notícia de jornal inglês. Vocês devem até pensar que eu, como não tenho mais o que fazer, fico assinando o Daily Mail, ou o The Guardian. Não é nada disso: eu gosto mesmo é dos tabloides, que trazem aquelas notícias ridículas, como aquela que comentei na semana passada, sobre o rabo. Nesta semana, uma notícia bombástica: “Aposentaram o cachorro do Harry Potter”. Não sei se vocês se lembram, mas o padrinho do Harry, o Sirius Black é um animago, pois tem o poder de se transformar, voluntariamente, num enorme cachorro preto. Não por acaso o nome dele é Sirius, que é a maior estrela da constelação do Cão Maior.
Bom, mas voltando à vaca fria, ou seria ao cachorro quente, o tal cachorro era interpretado, no filme, por um cão pastor chamado Berry que, segundo o jornal britânico, estaria se aposentando da vida de artista e foi abandonado pelo seu dono, Paul Thompson que, agora que o cachorro não está dando nenhum retorno financeiro, resolveu doá-lo. O aposentado foi deixado num abrigo chamado German Sheperd Dog Rescue, algo como Resgate dos Pastores Alemães, onde passou, naturalmente, a continuar levando sua vida de cachorro, porém, como aposentado.
É engraçado que, há pouco tempo atrás, muito gente reclamava, e ainda reclama que, no Brasil, aposentado leva uma vida de cachorro. E agora vem essa notícia terrível, de um cachorro que leva a vida de aposentado. Embora eu ache que o alarde da notícia se deveu a um fato comum, que deve ter acontecido com a maioria de nós, aposentados: é dizer “poxa, eu dediquei metade da minha vida àquela empresa (o cachorro tem dez anos) e agora, simplesmente, eles não querem saber mais de mim”.
E é verdade! Quando trabalhamos para uma empresa, é uma relação de troca: trocamos nosso esforço pelo salário e (antigamente existia) um pouco de reconhecimento, só isso. O problema é que muitos de nós acabamos, para fortalecer o ego, ou agregar um pouco de dignidade à sua própria pessoa, sei lá, incorporando aquele emprego, como se fosse um sobrenome ou um título. O cara não é mais o João: é o João do Banco do Brasil, o Antônio da Petrobrás, ou o Doutor Manoel. Sem o título, era só o Manezin, ou o Neca, mas, depois do diploma, virou o Doutor. Outra coisa charmosa são todos aqueles cargos. Quem é você: ah, eu sou Gerente Geral de Produção, o Diretor Adjunto de Pessoal, ou o Encarregado-Chefe da Unidade Coronariana. Gente, é de dar inveja a qualquer nobre da corte do Rei Luiz XIV, também conhecido como Sol. Humilde né?
A nossa necessidade de nos destacarmos da manada é tão grande que costumamos adotar também o nome do cônjuge: è o Sebastião da Margarida, o Onofre da Isabel, ou a Tatiana do Toinzin. É brincadeira... Mas, e quando separa? Aí fica assim: olha lá, a Tatiana ex-Toinzin e por aí vai.
O que ocorre, na aposentadoria, é o que aconteceu com cachorro do Harry Potter. No filme, ele era o Padfoot, ou Almofadinhas em português. Desempenhou tanto aquele papel, que acabou acreditando que era mesmo o Sirius Black. Só que, ao sair do set de filmagem pela última vez, não conseguiu se “destransformar” e virar o Gary Oldman. Aí, já viu, não era mais útil para o estúdio e foi para o abrigo dos pastores abandonados.
Eu não tenho intenção de tirar conclusão nenhuma do fato. Só não entendo por quê um cachorro, supostamente inteligente (já que é ator), põe na cabeça que ele É aquilo que ele só representa?
Ah, e ele já foi adotado. Podem ficar tranquilos...

(Crônica canina: Jorge Marin)

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

PAULINHO JÁ VAI ALI

Fonte: Site http://listas.20minutos.es/lista/personajes-de-dibujos-animados-132616/

Muita gente tem reclamado porque o Mundão acabou. Aquela carta para o Bete acabou, mas, gente, o mundão, o NOSSO MUNDÃO não acabou, principalmente porque o Mundão não depende do que acontece, mas do nosso olhar.
Hoje, por exemplo, enquanto descia a Rua Duque de Caxias (no nosso tempo, dizíamos rua da padaria do Debrando), fui surpreendido por uma pessoa que, após estacionar uma bicicleta bem próxima de mim, deu-me um tímido tapinha nas costas.
Olhando pra trás, um tanto assustado, qual teria sido minha agradável surpresa?
Naquele momento, coincidentemente, acabara de encontrar com uma grande figura. Amigo de outros bons tempos, vamos assim dizer. Interessante é que, mesmo morando na mesma cidade, confesso não me lembrar de quando teríamos nos encontrado pela ultima vez.
Assim, calorosamente, nos cumprimentamos e, após trocarmos breves palavras, continuamos nossos destinos. Talvez pelo fato de, naquele momento, eu estar acompanhado e de ter sentido, por parte dele, uma certa pressa em entrar no açougue, tudo aconteceu de uma maneira muito superficial.
Fazíamos parte daquela turminha das boas conversas. Aquela mesma que, entre umas e outras coisas, saía do cinema e aproveitava pra terminar a noitinha batendo aquele papo gostoso na porta do Cida ou no degrau do antigo prédio do Banco Nacional. Isso quando não ficávamos sentados naquele banquinho de madeira dentro da sinuca. Além de permanecermos ali, papeando e lendo jornal - geralmente notícias de esporte -, ficávamos também atentamente ligados, observando algum “cobra” jogar.
Futebol, cocotinhas e, por que não dizer, uma fofoquinha básica quase sempre rolava nos bastidores. Também ali sentados, muitas vezes, ficávamos de “oreia” em pé ao som do velho rádio do saudoso Sr. Cida, que, ao longe, transmitia algum jogo. O “home” era tricolor roxo.
Mas, voltando ao nosso amigo, considero-o um expert, quando o assunto é pedalar uma bicicleta. Igual não há! Acho mesmo que tenha aprendido primeiro a se equilibrar numa dessas do que propriamente andar. Por sinal, ainda hoje, com seus quase 64 anos, continua sereno e tranquilo dando suas voltinhas, se é que podemos falar que percorrer 70 quilômetros por dia é uma voltinha! Segundo suas próprias palavras, o seu recorde diário é, apenas, 90 km. No mais, uma saúde invejável e vitalidade de adolescente.
Assim, quando o encontro pela rua, de bicicleta, claro (pouquíssimas vezes o vejo andando a pé), procuro, em tom de brincadeira, sempre perguntar:
- Tá indo ou vindo de onde, Paulinho?
Respondendo-me rapidamente, esboçando sempre satisfação com minha pergunta, vai logo dizendo:
- Dei uma chegadinha ali na cidade de Astolfo Dutra! Na volta, ainda passei pela serra de num sei onde, entrei na estrada assim assado, contornei o trevo do tal lugar, peguei uma estradinha da direita e “casquetei” pra ali afora. Estou acabando de chegar, completa ele.
E, desta forma, vai contando cada detalhe de suas aventuras, ou seja, tranquilo e nunca ofegante, parecendo estar sempre acabando de se levantar da cama.
Na próxima semana, assim também devagar, vamos falar sobre sua paixão inseparável, a magrela, aquela que o conduz pelos caminhos da liberdade. Sem destino, ou com destino.

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

CONSIDERAÇÕES SOBRE O RABO DOS OUTROS

Francis Rossi, guitarrista do Status Quo, cortando seu rabo de cavalo (foto: mrpaparazzi.com para o jornal The Guardian)

A notícia no jornal inglês é: “Rabo de cavalo faz com que pai tire filho de escola do Reino Unido”. Bom, pelo menos não é nenhuma tragédia a qual estamos acostumados a ser bombardeados todos os dias. A questão aí é que o Mr. Geoff resolveu tirar o filho da escola porque os diretores pediram que o filho dele, Connor, de 11 anos, cortasse o rabo de cavalo que usa em seu cabelo. O menino entrou para escola agora em setembro, que é quando tem início o ano letivo lá na Europa, e, como o pai se recusa a cumprir a regra do colégio, a direção da escola decidiu que o menino vai assistir às aulas sozinho, separado do resto da classe, até se adequar às regras do colégio.
Confesso que me lembrei do tempo do Sô Bi, quando havia aquelas inspeções para ver se o uniforme estava certo, a cor dos sapatos, o cumprimento das saias e a altura dos bolsos. Naquele tempo, uma notícia desse tipo iria me encher de revolta e eu iria protestar contra os diretores do colégio e armar aquele barraco. Na verdade, eu não iria fazer nada porque, além do respeito que aprendemos dos nossos pais, morríamos de medo do Sô Bi.
Hoje, mais sábio em anos, eu me pergunto por quê razão uma pessoa que não aceita cortar o rabo de cavalo do filho resolve matriculá-lo numa escola que não permite nenhum tipo de excentricidade nos penteados?
Parece uma coisa boba, mas o que mais se vê atualmente é esse tipo de “protesto”. Uma moça que trabalhava em minha casa disse que resolveu entrar para uma igreja evangélica, mas que achava um absurdo não poder usar calças compridas, e estava brigando com o pastor porque ela só ia aos cultos de calças compridas. O pior é que ela pediu a minha opinião e eu estava “naqueles dias”. É, gente, homem também tem disso, principalmente quando o Botafogo perde. A minha resposta foi um exemplo de sutileza: eu acho que você é uma idiota, porque, se você quer frequentar uma igreja que não admite mulheres usando calças compridas, por que é que você quer teimar em ir de calças compridas? Agora, se a calça comprida for muito importante, por que é que você não troca de igreja? Certamente vai ter uma que admite o uso de calças compridas...
A moça não voltou mais lá em casa, mas, querem ver um outro exemplo? A mulher não gosta que o marido beba, briga, reclama, e acabam se separando. Daí a um tempo, ela se refaz, e vai tentar achar um novo príncipe encantado. Onde? Num barzinho. Dá pra entender?
Tem também um caso clássico da moça que adora usar minissaia e resolve namorar um moço muito ciumento que não admite que sua mulher saia com as coxonas de fora. Aí sabem o que ela faz? Chuta o namorado? Essa é a alternativa lógica, mas o pior é que ela não faz isso. Ela, simplesmente: a) sai, sorrateiramente, de minissaia, e fica escondendo o tempo todo para não encontrar com o marido e, pior: b) não sai mais de minissaia e reclama do marido com todo mundo, inclusive com o pai e a mãe.
Parece brincadeira, mas esses casos, todos eles, são clássicos e provam uma coisa: que as pessoas se acham diferentes, superiores às outras. Sei que tem uma placa de “estacionamento proibido”, mas eu vou parar lá. Estou pagando o título depois do vencimento, mas vou falar para o caixa não me cobrar juros. Isso é um absurdo!
Acho que defendemos tão bem os nossos egos, que acabamos acreditando naquela imagem majestosa que fazemos de nós mesmos. Com a palavra, o espelho...

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

NOSSO MUNDÃO E NADA MAIS - FINAL

Fotos publicadas, originalmente, no blog carissimascatrevagens.blogspot.com.

Neste nosso mundão, enquanto ficávamos a degustar algumas balas de drops Dulcora, brincávamos de soltar papagaio, bolinha de gude, peão, triangulo, mãe da rua. Trocávamos figurinhas na disputa de bafo e gostávamos de fazer coleção de flâmulas, selos e plásticos adesivos. Andávamos como loucos de bicicleta e velocípedes de um lado pra outro. Fazíamos campeonato de jogo de botão e vivíamos disputando quem primeiro preenchesse o álbum de figurinhas. Por sinal, juntamente com as pipas, eram sempre coladas com grude feito por nós. Adorávamos subir em árvores e fazer cabaninha. Nessas cabanas tínhamos até telefones com linha, ou seja, uma linha bem esticada com uma lata de “mastumate” adaptada em cada extremidade. E o pior é que funcionava! Ou seria a altura de nossas vozes? Só sei que conseguíamos nos comunicar!
Represávamos a água da chuva que escorria no canto da calçada (hoje os saquinhos plásticos fazem isso por nós) e pegávamos algumas frutas emprestadas no quintal do vizinho. Interessante é como na maioria das casas havia um pé de fruta! Hoje uma imensa floresta de concreto tomou o lugar deles.
Ficávamos, de tocaia, esperando a passagem do caminhão de cana que, quase diariamente, passava em nossa rua com destino à usina de Roça Grande. Corríamos atrás dele e, enquanto alguns tentavam perigosamente pegar uma “bera”, outros gritavam pedindo cana. Alguns, mais corajosos, escalavam a carroceria do caminhão, e jogavam um monte de cana na estrada: era uma festa!
Também andávamos escondidos no telhado, fumávamos talos de chuchu (coisa que não aconselho) e fazíamos catavento e barquinhos de papel para jogar no córrego.

Éramos supercriativos, principalmente quando fincávamos um pauzinho no bumbum das tanajuras pra brincar de ventilador. Isso pra não falar das incríveis construções
castelos, autoestradas e imensos túneis nos montes de areia. Falando em tanajura, há muito que não vejo uma, nem mesmo joaninhas, ou colós, lembram? Besouros também sumiram!
Ah... Lembrei-me agora: alguém se recorda de como fazíamos panelinha de xixi na areia?

Era muito comum terminarmos aquelas noites de brincadeiras sentados na calçada, debaixo de alguma luz fraca de um poste qualquer. Ali, depois de vários casos de assombração, sempre tinha alguém que tinha que ser levado até a porta de casa, de tanto medo da Maria Quitéria ou da Mula sem Cabeça.

Enfim, esta nossa geração praticou, ao ar livre, sem que percebesse, verdadeiras lições, práticas e teóricas, de psicomotricidade. Foram brinquedos e brincadeiras que nos deixaram o abençoado legado da coordenação motora, criatividade, percepção, agilidade, ritmo, noção de tempo e, principalmente, afetividade.
Aprendemos a descobrir o mundo através de nosso corpo, pois o virtual era apenas uma palavra subjugada aos praticantes do contato direto e do calor humano.

Para encerrar, coincidentemente logo após ter escrito estas linhas, fiquei quase cinco minutos para atravessar a rua e alcançar a pracinha em frente. Tudo devido ao grande movimento de carros.
É, meu amigo Bete, a coisa mudou muito pelas bandas de cá!
O negócio é voltar a tomar Emulsão de Scott e não tirar o pé da estrada.

Forte abraço,
Serjão

(Crônica: Serjão Missiaggia)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

FÉ DE MAIS

Arte digital por Ryoko Girle

Na escola do meu filho, me perguntam: qual é a sua fé? Sou apanhado de surpresa e, confesso, não sei bem o que responder. Eu sei o que é que a entrevistadora quer ouvir: “católica” seria a resposta certa. Mas, chato que sou, recuso-me a dar a resposta esperada e respondo: de menos. Como assim, senhor? Minha fé, você perguntou, é de menos.
Aí, como todo bom chato, tenho que explicar: aprendi, com um mestre budista, que a fé é uma coisa mutante, porque depende da compreensão e do saber. No livro, que se chama “Jesus e Buda Irmãos”, o autor Thich Nhat Hanh diz que ter fé é como aprender a fazer pão de queijo: a gente vai na casa de alguém e come um pão de queijo delicioso. Aí, anota todos os detalhes e volta pra casa cheio de fé: fé de que pode fazer o pão de queijo sozinho. Compra todos os ingredientes e tenta fazer o pão de queijo, mas a coisa não funciona. Pronto, a sua fé foi abalada. Você volta na casa da pessoa e pede que lhe ensine de novo, e vocês fazem o pão de queijo juntos, só pra ter certeza. E volta pra casa com fé de que, agora sim, pode fazer pão de queijo. Só que, essa fé, agora renovada, NÃO É A MESMA FÉ DE ANTES. De volta pra casa, vai para a cozinha e... consegue fazer o pão de queijo exatamente igual. Agora você tem certeza e sai dizendo que nada no mundo vai abalar a sua fé de que é capaz de fazer pão de queijo. Dois anos se passam, e, num belo dia, você visita uma outra pessoa que faz um pão de queijo de uma maneira totalmente diferente da sua, e, pior, muito mais gostoso. Aí, você não renega a sua fé, mas você aprende. E renova a sua fé. Acho que fé não é pedra: parece mais com uma lagartixa, ou, melhor dizendo, um camaleão.
De qualquer forma, acho que não passei na tal entrevista, mas a coisa não acaba. Chegando em casa, ouço na TV duas notícias, em ambas se fala em boa fé: na primeira, uma mãe, que recebe oferta de uma estranha para comprar roupas para o seu bebê, deixa a criança em poder dessa pessoa que, naturalmente, se manda com o bebê. A outra notícia diz respeito a um pastor que, para curar mulheres, cobra favores sexuais. Ora, minha gente, acho que, nos dois casos, o que houve não foi boa fé, foi excesso de fé. O Direito fala que boa fé é o convencimento individual da parte de obrar em conformidade com o direito, até mesmo por desconhecer ou ignorar qualquer vício ou circunstância anterior. Então tá... mas, vamos pensar uma coisa: a pessoa entregar um bebê nas mãos de outra que nunca viu só porque esta vai comprar umas roupas, é fé demais. E, no segundo caso, entendo que a proposta de cura em troca de favores sexuais, em si, já é uma agressão. E, se a mulher se submete, entendo que é um caso de má fé, dela própria, consigo mesma, ou um autoengano.
Tive uma professora de Psicologia que dizia que, para andar para a frente, temos, obrigatoriamente, que tirar o pé de trás do chão. E penso que isso se aplica em questões de fé. Fé não é para ficar amarrado num conceito, como o de que todas as pessoas são boas, ou também que todas são ruins.
Fé, repito, depende de sabedoria e compreensão que, é importante lembrar, são duas coisas totalmente diferentes. Minha mãe comprou uma Bíblia ilustrada e, a partir daquele dia, eu não conseguia mais dormir pensando naquelas chamas do inferno. Hoje, aquela pintura me causa, no máximo, admiração (acho que é de Botticelli). Com o conhecimento, é a mesma coisa: você tem que se livrar do conhecimento presente, para adquirir outro mais profundo. Os cientistas, às vezes chamados de sem fé, sabem que, tão logo você faça uma nova descoberta, logo terá que abandoná-la para descobrir algo novo, mais evoluído, mais compatível com as novas formas de conhecimento.
Agora, essa coisa de dizer que “eu não acredito em Deus” é mais ou menos igual ao caso do peixe que diz não acreditar em água. Podem levar fé nisso. Ou não...

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

NOSSO MUNDÃO E NADA MAIS

Foto publicada no blog ra-bugio.blogspot.com

Na semana passada, falávamos de amebas. E de como eu, ao executar uma manobra radical, acabei caindo de boca no córrego. O córrego, apesar de toda aquela catinga da qual certamente todos se lembram, exercia na criançada um fascínio que, hoje, eu não consigo entender mas que, naquele tempo, era fantástico. De tempos em tempos, um senhor que fazia colchões, vizinho da casa do Jorge, chamado sr. Lau, represava o córrego lá em cima, antes da ponte do campo do Mangueira, para dar uma limpeza. Não entendo bem que limpeza era aquela porque, depois da limpeza, o cocô continuava caindo lá dentro. Mas que ele fazia a limpeza, isto fazia. No dia em que a limpeza era feita, a molecada ficava toda de plantão: primeiro, porque, assim que o homem represava, as margens praticamente secavam e ia todo mundo “andar dentro do córrego”. Só que a coisa não secava na realidade: ficava uma lama mole e mal cheirosa e aqueles resíduos mais pesados iam todos para o fundo, e a garotada às vezes encontrava alguma bota, pneus de bicicleta e até uma vara de pescar, com anzol e tudo, foi encontrada.
Mas, e aí é que vem a segunda parte da festa: enquanto aquele bando de leitões ficava andando no córrego, uma outra turma ficava fazendo barquinhos. E eram barcos de todos os tipos. Cada um fazia o seu, do jeito que soubesse, uns eram de papel, principalmente aquele papel amarelo que embrulhava manteiga na leiteria, mas havia uns do tipo jangada, feitos com talo de mamona e forrados com folha de taioba.
E aí, tcham tcham tcham tcham... Quando o seu Lau abria a água, aquela corrente vinha forte, subia e ficávamos, cada um jogando o seu barco e analisando o desempenho.
Quem passasse por ali, e fosse acompanhando aquela arruaça, pensaria se tratar de algum tipo de festival ou coisa parecida.

Mas, e à noite? Esperávamos ansiosos escurecer o dia, para que, com nossas lanternas, pudéssemos procurar rãs. Certa vez, ao fazermos uma caçada, conseguimos pegar algumas dezenas delas. E foi somente no outro dia que ficaríamos sabendo que eram todas sapos.
Imaginam que nosso o saudoso colega Beto conseguiu a difícil façanha de cair dentro do córrego?
Ao questioná-lo sobre o que o teria levado a despencar daquela altura, simplesmente me deu a seguinte explicação:
- Fui tentar brincar de andar com olhos fechado em sua beirada! E Bloofet!

Sem que percebêssemos, éramos sempre monitorados pelos nossos pais.
Havia uma distância territorial a ser respeitada e, quase sempre, o quarteirão era o limite. Muitas vezes, diante daquele típico impulso infantil, tínhamos, como uma de nossas artes preferidas, simplesmente ousar na distância e afastar um pouco mais de casa.
Um dos lugares prediletos onde sempre íamos era a subida pro largo da matriz pela Rua Galdino Furtado de Mendonça.
Na época, o referido local ainda não passava de uma estrada, e por sinal, bem deserta. Se não estou enganado, somente existia ali a casa do Sr. Rômulo Manzo, além, é claro, de muitas árvores. Pés de mamonas é que não faltavam e, com suas sementes, travávamos verdadeiras batalhas enquanto caminhávamos. Chegamos, certa vez, por incrível que pareça, até o inicio da antiga estrada de acesso a Roça Grande onde hoje funciona a marmoaria. Ali existia uma bela fazenda e, entre umas e outras coisas, ficávamos vendo as vacas serem ordenhadas e remanejadas de um lado ao outro. Encarávamos este passeio como uma verdadeira façanha. Para nós, uma autêntica aventura ao fim de mundo, que, se descoberta pelos nossos pais, seria um Deus nos acuda. Alguns castigos e umas boas palmadas, com certeza, iriam acontecer.
Semana que vem, não percam, o capítulo final, com cabaninhas, tanajuras, e aquele famoso caminhão de cana!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

terça-feira, 6 de setembro de 2011

SOU AMIGO DO SERJÃO!

Vou-me embora pra São João:
Sou amigo do Serjão
Vou descendo a Zeca Henriques
Escutando um violão
Vou-me embora pra São João

Vou-me embora pra São João
Aqui eu não sou feliz
Lá a vivência é uma beleza
Ficar deitadin na sombra
Na casa de Tia Irineia
Ouvindo o Grupo Pytomba
E tirando a maior onda
Dizendo que é Pinque Froide

E como farei zoada
No murinho do Adil
Na praça do Coronel
E na beiradinha do córrego
Frente ao Banco do Brasil
Depois vou pro Botafogo
Ver os trens a manobrar

Mando chamar o Belasquez
Trazendo junto o Dalminho
Renatinho já vem correndo
Com Zé Neli e Bellini
Oberon e Sílvio Heleno

O Serjão é meu amigo
Amigo do coração
Tem um sorriso tranquilo
Tem um jeitinho de irmão
Escreve blog comigo
Trata a todos com carinho
Mata bola sem querer
Na sinuca do Pintinho

E quando estivermos velhos
Bem velhos e bem gagás
Vamos fazer lista de gatas
Que é pra gente paquerar
- Sou amigo do Serjão -
Vou voltar a ser pequeno
E brincar com meu amigo
Em São João Nepomuceno.

(Poesia: Jorge Marin “em cima” de “Vou-me embora pra Pasárgada” de Manoel Bandeira)

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

NOSSO MUNDÃO E NADA MAIS

Foto "Crianças brincando à beira do córrego" publicada originalmente no site www.camaraborborema.sp.gov.br

Fugindo um pouco do circuito em volta do córrego, não poderia jamais deixar de citar a casa do grande amigo Renatinho. Nesta época, carinhosamente o tratávamos de Tatíl.
Também foi uma família e uma casa que muito me marcou. Renatinho juntamente com seus pais Sr Geraldo e Dona Aparecida morava com seus irmãos: Everaldo, Elizete e Rosana.
E se eu disser não me lembrar de uma única vez em que. ao chamar o Renatinho pra brincar, teria passado pela porta da frente? Tudo acontecia nas inúmeras travessias que fazíamos pelo terreiro em diversas passagens secretas feitas nas cercas de bambu. E assim, íamos de casa em casa, pacificamente, sem qualquer tipo de repressão. Triste hoje é conviver com imensos muros que, quase sempre eletrificados, se transformam em verdadeiras fortalezas a proteger castelos.

Continuando a viagem, vamos dar um pulo até a casa do Sr. Anjinho Picorone.
Lá, muitos causos de nossa infância e adolescência aconteceram, muito dos quais já contados em postagens passadas. Sílvio Heleno fazia parte de nosso time de infância. Quando não estávamos naquele imenso terreiro de sua casa, íamos pra rua.

No posto de gasolina (Esso), muitas vezes ficávamos sentados no murinho do lavador curtindo os carros serem lavados. Era muito interessante, pois tinha todo um ritual a seguir. O cheiro daquele óleo lubrificante ficou mesmo na memória.

Chegamos à quadra do Mangueira. Lá não tínhamos o costume de jogar bola, mas aqueles baiões com cheirinho de quentão, pastel e churrasquinho também ficarão pra sempre na lembrança. Entrávamos pelo portão dos fundos e ficávamos curtindo, entre umas e outras coisas, a tentativa da garotada de subir no pau de sebo.

Nesta época, também iniciou teve início a construção daquele prédio que veio a abrigar, por vários anos, o Banco do Brasil. Pouco me lembro.

Chegamos à fábrica de macarrão, no local onde, hoje, é a casa do primo Marcelo.
Brincávamos muito num espaço vago que existia na frente do prédio. Depois do expediente, era de praxe juntar a turma pra bater aquela bolinha com meu pai e demais funcionários. Foram muitas e boas lembranças que carreguei também da fábrica de macarrão que, por sinal, foi uma das grandes indústrias da cidade. Pertencia ao meu saudoso pai e ao Tio Gaby. Com certeza, irei, um dia, reservar uma postagem somente pra ela.

O córrego, que antes era descoberto, veio dar lugar à pracinha, hoje existente, somente no inicio da década de noventa.
Não sei se lembram, mas, de um lado, não existia muro e aproveitávamos para escorregar, naquelas margens, deslizando sentados até próximo à água. Um belo dia, caí na asneira de tentar imitar o Beto, irmão Arruda, que tinha o costume escorregar de barriga. Quando cheguei bem próximo à água, é que fui me lembrar de perguntar como é que eu faria para frear. Fui de boca dentro d’água!
Pra minha sorte, nessa época, nem tão poluído era o córrego, mas, coincidência ou não, dias depois, após uma bela dor de barriga, foram constatadas algumas amebazinhas passeando, em meu exame.

Na semana que vem, não percam: a grande caçada e o mergulho no córrego, “discostas”.

(Crônica: Serjão Missiaggia)

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL