sexta-feira, 14 de julho de 2017

SERENATA ASSOMBRADA


Era uma sexta-feira da paixão de um certo ano que eu não sei bem porque nem o meu pai (que contou a história) me disse e nem eu perguntei. E não perguntei justamente porque, depois do que ouvi, fiquei tão impressionado que nem dormir eu dormi

Imagino que o meu pai teria uns dezoito anos, o que levaria o caso para o ano de 1940, mas poderia ser um pouco mais. O fato é que ficou difícil pra mim duvidar, porque meus dois tios também participaram da aventura, se é que podemos chamar de aventura: o tio Brás e o tio Geraldo.

Meu tio Geraldo eu nem cheguei a conhecer porque morreu jovem, mas o meu avô, na época um próspero comerciante que havia trazido a família de São José dos Cabritos para a cidade, ficou muito irritado com a ideia. Ora, onde já se viu, esses mininos resolverem fazer serenata, cê tá me intendendo, uma SERENATA em plena Sexta-Feira da Paixão!

Os tempos autorizavam plenamente que meu avô desse uma coça nos três, até mesmo com o relho. Mas, acredito que, pela santidade do dia, também os castigos físicos estavam proibidos.

Assim, saíram subindo pela Rua Cônego Reis com destino à Santa Rita. Acho que meu tio Brás, então adolescente, tinha uma namoradinha ali na Rua do Banheiro (Rua Major Joaquim Leite) e para lá se dirigiram afinando o violão. No repertório, segundo meu pai, Francisco Alves, Orlando Silva, Augusto Calheiros, Sílvio Caldas, uma verdadeira Rádio Nacional, que era a TV Globo da época.

Quase no finalzin da Cônego Reis é que o TREM se sucedeu. Meu pai, que vinha mais atrás pitando, escondido, um cigarrin de paia, percebeu que uma pessoa os seguia. Pensou tratar-se de uma criança porque, assim de rabo de olho, notou que era um pessoinha baixa e atarracada.

Quis chamar os dois irmãos na frente, mas a voz não lhe saía da boca, talvez por medo ou porque não era pra sair mesmo. Mas, os outros ainda não haviam notado a presença até que... começou a clariar. Mas não era um clarão de luz não, mesmo porque naquela subidinha nem luz não tinha. Os postes iam só até o final da Rua do Totó.

Quando se voltaram pra ver o que era aquela luz, é que foram perceber que aquele homúnculo que, a princípio, só o meu pai vira, agora era um homem alto, vestido de preto, de uns dois metros de altura, cachimbo no beiço e um caminhar tão esquisito que, se eles andassem mais rápido, os passin dele continuavam deixando ele coladin ni nóis, como disse o pai.

A essa altura, invés de imbicar pro lado da casa do sô Narciso Leite, ali antes do Pontilhão, voltaram os três correndo, e o violão eu nem sei, porque, até hoje, nunca tive coragem de perguntar pro meu pai onde ficou. Uma coisa é certa: se aconteceu eu não sei, mas que foi real, foi!

Crônica: Jorge Marin
Foto     : os irmãos Geraldo e Irenio (de paletó preto, meu pai).

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