quarta-feira, 13 de maio de 2015

O BEVERLY VERMELHO


Fazendo minhas caminhadas, deparei-me, num cantinho da calçada, com um maço de cigarros vazio de nome bem estranho. Para não dizer, hilário, mas, diante de um impulso infantil ainda enraizado e meio que no instinto, quase mergulhei sobre ele. Por sinal, um lindo maço, que me fez viajar no tempo e a lembrar de como gostávamos de fazer coleção desses exemplares. O raríssimo maço de Beverly Vermelho era um deles, sendo que somente meu amigo Bete possuía em sua coleção. Fui descobrir mais tarde que aquele tal Beverly Vermelho era o maior blefe e que era conseguido simplesmente com a fricção de sabão em sua embalagem.     

Gostávamos de acondicionar os referidos maços em caixinhas de fósforos, e tínhamos extrema habilidade nos momentos das barganhas, principalmente ao posicioná-los na mão, e, assim como recontando dinheiro, manuseava-os com extrema técnica e rapidez.

Passávamos quase todo o dia olhando para o chão, na esperança de que pudéssemos deparar com alguma marca famosa, mas confesso certa decepção por nunca ter encontrado os célebres Everest e Beduíno.

Assim, enquanto caminhava, não tive como deixar de ir lembrando também das coleções de chaveiros, dos álbuns de figurinhas, dos adesivos (interessante como ainda me recordo do cheirinho desses adesivos plásticos!), das flâmulas, miniaturas de carrinhos, dos ovinhos coloridos de gude, gibis, alem é claro, das românticas embaixadas.

Falando em embaixadas, cheguei a enviar, de uma só vez, quase cinquenta cartas pelo correios, sendo que todas elas com o mesmo texto, mudando apenas o endereço e o nome do país.  E como era emocionante escutar os imensos envelopes sendo jogados pelos carteiros na varanda!

Os indiozinhos e os soldadinhos que vinham nos achocolatados da Toddy eram peças de outra coleção muito disputada pela garotada, e minha esperança era conseguir a qualquer momento encontrar o tal apache com seu arco e flecha. E isso me custou muitos pirirís em função de ficar tomando quase cinco copos de uma só vez, apenas pra que se pudesse comprar mais rapidamente outro vidro. Um belo dia, eu o encontrei!

Tive também uma bela coleção de selos que havia sido herdada de um de meus manos. Entre eles, constava o raríssimo centenário do olho de boi, que, inocentemente, presenteei a uma amiga juntamente com toda coleção. Dancei feio nessa!

E assim, subtraindo valor em tudo aquilo que de mais simples existia, seguíamos livres brincando pelas esquinas, interagindo com o mundo, felizes da vida.

Crônica: Serjão Missiaggia

4 comentários:

  1. O único álbum de figurinhas que consegui completar foi um chamado Space, de ficção científica. Adorava a história e estética das figurinhas e quando ficou faltando apenas uma entrei num frenesi irracional para conseguir formas de dinheiro e correr na banca para comprar o derradeiro pacotinho de figurinhas. Foi um tal de me voluntariar para comprar cigarro para minha mãe ou ir à padaria, ficando sempre com as moedas dos trocos... Saía pela rua me oferecendo para arrumar os jardins ou carregar entulhos dos vizinhos por mais uns trocados e lá ia eu novamente correndo para a banda em busca de mais um pacotinho. Aquela ansiedade cada vez que rasgava um novo pacote...
    Sei que podia encomendar a figurinha na editora (o que deveria te feito!), mas na época isso me parecia como uma desonestidade, algo que diminuía o valor da inédita vitória de completar um álbum de figurinhas. Por fim, dezenas de pacotinhos a mais e moedas a menos ao longo de dois meses que na época me pareceram duas vidas, finalmente completei o álbum. Que delícia aquela sensação de vitória e superação! Só quem completou um álbum de figurinhas na persistência e na sorte do acaso sabe o que é a sensação de sentir-se agraciado pelos deuses do efêmero!
    Cada um dá diferentes valores e sabores às suas pequenas doideiras cotidianas! O álbum e uma caixa de sapato, repleta das figurinhas repetidas, estão guardados comigo até hoje, aos meus 45 anos do segundo tempo. Certas coisas não têm idade...

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    1. Muito legal, Sylvio! Mas, se existisse uma Psicanálise Pediátrica, acho que teria muito a dizer sobre a forma como as crianças tratam os seus brinquedos. E o fato de você guardar suas figurinhas até hoje não me deixa mentir. Por falar em psicanálise, será que é um ato falho ali onde vc diz "saí pela rua me oferecendo" e, logo depois, "lá ia eu novamente correndo para a banDa", Pink Freud explica?

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    2. Cara... não sou fotógrafo, mas estou me revelando e queimando o filme!
      Faz mal não, o que importa no sentimento é que ele seja eterno enquanto duro (ôpa, outro ato falho)!
      Melhor parar meus comentários por aqui...
      Abração(s).

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    3. Não pare de comentar, não, compadre Sylvio, pois você é uma das poucas pessoas que conseguem escrever claro, embora, como diz o Veríssimo, "'escrever claro' não é certo, mas é claro, certo?".

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