sexta-feira, 29 de maio de 2015

EU NÃO QUERO SABER POR QUÊ


Lendo as notícias diárias, assistindo aos vídeos nas mídias sociais, uma mania parece ser comum a todos os leitores: o hábito de explicar, ou pior, de justificar as coisas.

Os pais mataram a filha? Ah, faltou Deus no coração. O bandido adolescente executou o idoso? Foi por causa da injustiça social. O filho vai mal na escola? Culpa da família que não dá apoio.

Vivemos uma época onde TUDO tem explicação, por mais patética, ridícula ou implausível que seja. Talvez, ao emitir uma explicação sobre o fato analisado, a pessoa demonstra que possui algum conhecimento, ainda que absurdo, sobre o assunto. E, ao mesmo tempo, meio que se protege, porque, ao explicar, coloca-se em outro nível, geralmente superior, àqueles indivíduos analisados.

Querem um exemplo? Basta morrer um fumante que, na mesma hora, na rua, no velório e no whatsapp, alguém vai comentar “com certeza foi câncer”. Como se as outras pessoas, por não fumarem, estivessem automaticamente protegidas da doença. Houve um tempo (recente) em que qualquer homossexual que morria era imediatamente diagnosticado: aids, coitado!

Esse “coitado” aí é inevitável, pois o comentarista se coloca como se ele próprio pertencesse a algum tipo de classe superior, imune a doenças, desvios, vícios e pecados. Não por acaso, pessoas absolutamente infelizes no casamento adoram dar conselhos conjugais.

Outra prática lamentável é a justificativa. Num programa de TV nesta semana, o filósofo Mário Sérgio Cortella lembrou que a palavra “justificar” significa “tornar justo”. Sendo assim, como justificar os crimes bárbaros, a corrupção desenfreada, a falta de respeito com velhos e crianças, o descaso com a natureza e o ódio?

Mais fácil seria reconhecer que vivemos numa sociedade por vezes bárbara, corrupta, agressiva, violenta e odiosa. Muitos afirmam: essas pessoas são desumanas! Puro engano: é justamente porque são humanas que agem dessa maneira. E sinto informá-los que cada um de nós tem também a semente dessas características indesejadas plantadinhas em nosso âmago.

Nem anjos nem demônios. Santo Agostinho, ao fazer um retiro no deserto, foi visitado por ambos os tipos de seres fantásticos. Segundo ele, conheceu muitos demônios que pareciam anjos e, naturalmente, anjos que se assemelhavam a demônios. Perguntado pela diferença, o grande teólogo afirmou que só podia afirmar, com certeza, depois que as criaturas iam embora. Se ele ficasse meio bolado, era um demônio; mas, se a sensação fosse de leveza, era um anjo.

Talvez ao explicar tudo e justificar todos, queremos fazer crer que só temos contato com anjos.

Crônica: Jorge Marin
Foto     : Alessandro Laporta, disponível em https://www.flickr.com/photos/alessandrolaporta/

2 comentários:

  1. Ser humano: animal (primariamente) racional (secundariamente).

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    1. Sem querer fazer (mas já fazendo) um trocadilho, o que eu digo hoje é o seguinte: se você ver qualquer sinal de racionalidade, DESCARTES!

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BRIGADU, GENTE!

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