quinta-feira, 19 de agosto de 2010

PAIXÃO OU AMOR?



Com frequência, desfilam, aqui no blog, causos e histórias, engraçadas ou não, sobre o que era ser um jovem nos anos 70. Porém, um assunto tem passado batido, e é um assunto muito importante, que é o do apaixonamento. Uma pessoa mais desavisada, com seus vinte anos que lesse o blog hoje, poderia pensar que éramos todos assexuados quando, na verdade, este era um tema que consumia uma boa parte das nossas vidas na época, uns 90% mais ou menos, aí incluídas as horas de sono.
Aprendemos, naquela época uma coisa muito curiosa e que, nos dias de hoje, já não é usada mais: é que existia a paixão e o amor. A paixão não era muito aceita e, apesar dos nossos hormônios dizerem o contrário, era tido como uma mera ilusão, como uma coisa passageira, ao passo que o amor, um amor calmo e equilibrado, este sim, devia ser encorajado como uma forma de manter a moralidade e, por que não dizer, para perpetuar o romantismo.
Ou seja, éramos romanticamente treinados para não nos entregarmos à volúpia dos nossos desejos indecentes. E mesmo nós, rapazes, acreditávamos piamente que as meninas não tinham este tipo de pensamentos indecorosos. Mas os cantinhos escuros, a esquina do Correio e as ruas que dão acesso à Igreja do Rosário (vejam só o sacrilégio) sabem muito bem da luta hercúlea que travávamos para ter de optar entre o desejo de experiências intensas e descompromissadas (o atual “ficar”) e o estabelecimento de um amor terno, e eterno.
Como vimos, e sentimos na pele, até hoje não foram encontradas soluções, nem culturais, nem psicológicas para o busílis (adoro esta palavra, que significa o xis do problema, e era usada numa revista antiga, que não me lembro qual é). Certamente, a maioria de nós passou pelas duas experiências, e sabe que não se pode ter ambas ao mesmo tempo. E também que, na maioria das vezes, a perda de qualquer um dos tipos de experiência, acaba levando a um sentimento de vida contrariada, do tipo castração da felicidade.
Às vezes, meus filhos me provocam, perguntando se eu vivi todo aquele barato dos hippies, com toda a liberdade sexual do chamado flower power. E eu sempre lembro a estes “filhotes de Madonna” que a revolução hippie aconteceu nos Estados Unidos, entre estudantes ricos e loucos para não ir para o Vietnam. Aqui no Brasil, tirando um pouco o rock, qualquer manifestação de sexo e drogas era tratada na porrada. Além disso, a liberalização dos costumes fazia parte de um projeto de socialismo e comunitarismo que, de forma alguma, seria tolerado no Brasil, como também não foi tolerado lá.
Fomos sutilmente levados, desta forma, a optar pelo amor romântico, igual ao que víamos nos filmes de Hollywood, mas, na vida real, o que tínhamos, muitas vezes, era um mundo conflituoso, triste, decepcionante, baseado em expectativas irreais e contraditórias, o que resultava em ciúmes paranóicos, terrorismo contra ex-parceiros, depressão, disputas econômico-financeiras, estilhaços nos filhos e outras tantas barbaridades.
Exilados da ressaca romântica dos anos 80, fomos jogados no vale tudo dos anos 90, com toda a promessa de liberdade, inclusive sexual, e possibilidade de, aos trinta e poucos anos, podermos vivenciar todas as nossas fantasias individuais. Era tempo de privatização, e acabamos privatizando, em nome do narcisismo, a própria moralidade, aqui no termo geral, incluindo também o político e o social.
Resultado: vividos estes dez anos do século XXI, passeamos pelas ruas e, vez ou outra, topamos com alguns daqueles ideais de beleza que faziam nossos corações dispararem na porta do Rubro Bar, ou da Lanchonete Joia (que agora nem acento tem mais). Aquela gatinha de tirar o fôlego, dentro daquele shortinho da Fanfarra do Ginásio, hoje passeia pela Pracinha do Coronel, um pouco mais “cheinha”, às vezes até com um netinho no colo. O garotão, de cabelos compridos, calça de cintura baixa e botina e óculos “john lennon” também anda pela praça, de bermudão, chinelo de aposentado, careca, barrigudo e com a camisa de algum time do Rio.
Tivemos que nos reinventar para sobreviver. Eventualmente eles se encontram, trocam olhares, cumprimentam-se: “como vai a senhora?”, “beleza?”, continuam a caminhada, ela se lembra do cabelão, ele se lembra do shortinho. E, ali do antigo murinho do Adil, escutamos dois suspiros. Ai, ai!

(Crônica – Jorge Marin)

2 comentários:

  1. Jorge! Parabéns pela crônica!
    Interessante traçarmos este paralelo entre o “inocente” erotismo de quarenta anos atrás com aquilo que vem acontecendo hoje. Uma reflexão pra todos nós!
    Sinto dizer ao amigo, que já faz um bom tempo, que pontas de ferro, foram colocadas no Famoso Murinho do Adil no intuito de inibir aqueles poucos românticos sedutores que ainda se aventuravam a dar uma paradinha por la.
    E assim é a vida!

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  2. Não querendo ser muito saudosa, mas acabando sendo ,venho revelar que bom mesmo era aquele tempo, em que tudo parecia obedecer seu ciclo tempo,e não esta loucura de hoje em que tudo parece começar pelo final....
    Que bom que nos aproveitamos esta epoca !!!!rsrsrsrsr

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BRIGADU, GENTE!

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VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL