Lendo as
notícias diárias, assistindo aos vídeos nas mídias sociais, uma mania parece
ser comum a todos os leitores: o hábito de explicar, ou pior, de justificar as
coisas.
Os pais
mataram a filha? Ah, faltou Deus no coração. O bandido adolescente executou o
idoso? Foi por causa da injustiça social. O filho vai mal na escola? Culpa da
família que não dá apoio.
Vivemos
uma época onde TUDO tem explicação, por mais patética, ridícula ou implausível
que seja. Talvez, ao emitir uma explicação sobre o fato analisado, a pessoa
demonstra que possui algum conhecimento, ainda que absurdo, sobre o assunto. E,
ao mesmo tempo, meio que se protege, porque, ao explicar, coloca-se em outro
nível, geralmente superior, àqueles indivíduos analisados.
Querem um
exemplo? Basta morrer um fumante que, na mesma hora, na rua, no velório e no
whatsapp, alguém vai comentar “com certeza foi câncer”. Como se as outras
pessoas, por não fumarem, estivessem automaticamente protegidas da doença.
Houve um tempo (recente) em que qualquer homossexual que morria era
imediatamente diagnosticado: aids, coitado!
Esse “coitado”
aí é inevitável, pois o comentarista se coloca como se ele próprio pertencesse
a algum tipo de classe superior, imune a doenças, desvios, vícios e pecados.
Não por acaso, pessoas absolutamente infelizes no casamento adoram dar
conselhos conjugais.
Outra
prática lamentável é a justificativa. Num programa de TV nesta semana, o
filósofo Mário Sérgio Cortella lembrou que a palavra “justificar” significa “tornar
justo”. Sendo assim, como justificar os crimes bárbaros, a corrupção
desenfreada, a falta de respeito com velhos e crianças, o descaso com a
natureza e o ódio?
Mais fácil
seria reconhecer que vivemos numa sociedade por vezes bárbara, corrupta,
agressiva, violenta e odiosa. Muitos afirmam: essas pessoas são desumanas! Puro
engano: é justamente porque são humanas que agem dessa maneira. E sinto informá-los
que cada um de nós tem também a semente dessas características indesejadas
plantadinhas em nosso âmago.
Nem anjos
nem demônios. Santo Agostinho, ao fazer um retiro no deserto, foi visitado por
ambos os tipos de seres fantásticos. Segundo ele, conheceu muitos demônios que
pareciam anjos e, naturalmente, anjos que se assemelhavam a demônios.
Perguntado pela diferença, o grande teólogo afirmou que só podia afirmar, com
certeza, depois que as criaturas iam embora. Se ele ficasse meio bolado, era um
demônio; mas, se a sensação fosse de leveza, era um anjo.
Talvez ao
explicar tudo e justificar todos, queremos fazer crer que só temos contato com
anjos.
Crônica:
Jorge Marin
Foto : Alessandro Laporta, disponível em https://www.flickr.com/photos/alessandrolaporta/
Ser humano: animal (primariamente) racional (secundariamente).
ResponderExcluirSem querer fazer (mas já fazendo) um trocadilho, o que eu digo hoje é o seguinte: se você ver qualquer sinal de racionalidade, DESCARTES!
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