sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A CASA DA TIA IRINEIA

Digital art por Janna Aika Deja

Capítulo 1 - No better place

Semanas atrás, ao deparar-me com o pequeno e feliz comentário feito pela Rosane em um post da música “Me and Mrs. Jones”, senti o quanto estava em dívida comigo mesmo e com um monte de outros seguidores. Amigos que, assim como eu, tiveram o privilégio e a felicidade de um dia poderem incluir em sua rotina diária, uma daquelas boas chegadas à casa da Tia Irineia.
Com muita justiça, já falamos aqui no Blog sobre o Barracão do Sr. Anjinho, Ginásio do Sô Bi, Botachopp, Rubro Bar, Varandão da Casa do Primo Dantinho, Oficina do Silvio Heleno, além de fazermos uma singela homenagem à nossa madrinha musical Nely.
Esses lugares e pessoas marcaram muito nossa juventude, especialmente a turma do Pytomba. E é justamente por isso que eu não poderia jamais deixar de incluir neste mágico roteiro a Casa da nossa inesquecível Tia Irineia! A eterna madrinha de todos nós. pytombenses ou não.
Nesta época, Tia Irineia, juntamente com o Márcio, Eucí e o Ilko, energizava o ambiente com aquele alto astral. Éramos sempre recebidos com muito carinho e alegria. Algo assim como se fosse nossa segunda casa. Podíamos dizer, e por que não, que parecíamos uma Grande Família.
Era uma atração meio que sobrenatural, pois para lá todos se dirigiam. Não havia horários nem dias pré-determinados. Simplesmente íamos! Raro o dia em que isso não acontecia. Muito comum quando encontrávamos com um colega na rua e dizíamos um ao outro:
- Tá indo onde?
- Vou dar uma chegadinha na Tia Irineia!
E juntos seguíamos, pois, com certeza, sabíamos que outros de nós também estariam por lá.
Fazíamos daquele lar o nosso refúgio e asilo inviolável, onde todos se entendiam e se completavam. Falávamos a mesma língua e convivíamos harmoniosamente.
O cafezinho, como sempre, era a marca registrada que, por sinal, era coado de hora em hora. Uma discreta “filada” no maço de Continental da Tia Irineia, que ficava quase sempre em cima da geladeira, acontecia constantemente. Depois, era só sentarmos, ou na escada da cozinha, na varanda, ou no passeio, pra poder jogar conversa fora. Tudo regado ao som de violões e muita música. Tia Irineia, muitas vezes, sentava ao nosso lado, e participava ativamente. Isto acontecia quando não estava, juntamente com Eucí, em sua máquina de costura, preparando algum pedido. Era uma grande costureira.
Hoje, vendo a correria dos jovens em busca de um lugar para passar o réveillon, percebo que a multiplicidade de informações os deixam completamente desnorteados. Uns acham que o lugar ideal é o clube, com o namorado ou a namorada. Outros que bom mesmo é a rua, sem o namorado ou a namorada. Dizem também que é na praia, ou num transatlântico. E até numa cachoeira no meio da floresta. Na calma da minha poltrona, em frente à TV, sem som, eu sei perfeitamente o que todos procuraram, mas só nós tivemos: paz, alegria, respeito, uma pessoa para nos ouvir e muita amizade. Corrigindo a Dorothy, do Mágico de Oz, podemos afirmar: não houve lugar melhor que a nossa casa... da tia Irineia.
NO PRÓXIMO ANO: não percam, Um Baile no Terreiro (soltando os cachorros). E um Feliz 2011!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

GABRIELA

Digital art por Fabíola Goellner

Colhia flores de manhã
e pensava que era romântico
retirar os espinhos.
Voltava para a cama
com cheiro da seiva do jardim
e sonhava com palácios:
eram muros altos
a luz do sol entrava
pela fresta da janela.

Pensava que era romântico
ser mulher
e enchia-se de raiva
dos pratos e talheres
na pia da cozinha.
Súbito um anjo
desses que povoam nosso imaginário
entrou pela janela
para fazer uma anunciação
e quebrou algumas louças:
coitado, levou umas vassouradas
e saiu voando
e gritando histericamente.
A mulher ficou ali
sentada sem fazer nada
comendo uma maçã
e lendo um romance qualquer.

(Poesia: Jorge Marin)

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

UMA NOITE FELIZ

Foto por Hot-Hot-Heat


Noite feliz, noite feliz,
ó senhor, Deus de amor,
Pobrezinho nasceu em Belém.

Foi nesta canção que, por décadas e décadas, milhares de crianças viajaram, tantas e tantas vezes, embalando seus mais puros sonhos de amor.
Nesta cidadezinha tão longínqua e mágica do Oriente, enquanto transportávamos nossa inocente imaginação, éramos levados a uma pequena gruta onde... ao brilho de uma linda estrela, José e Maria, pastores, anjos, reis magos e alguns animais, ficavam a adorar o menino Deus que, deitado numa humilde manjedoura, acabara de chegar ao mundo para nos salvar.
Hoje, simplesmente sentados em nossas salas confortavelmente, ficamos incrédulos, assistindo a globalização e a tecnologia nos trazer, num piscar de olhos, a imagem desolada e agonizante de Belém.
Numa luta sem fim, com seus brinquedos de guerra, irmãos verdadeiros vão envolvendo e sufocando em fumaça, o local que, para nós cristãos, é dos mais sagrados.
O lugar, onde hoje se encontra a Igreja da Natividade, foi o berço escolhido por Deus, há dois mil anos, para acolher seu filho Jesus Cristo. Por ironia: “O MENSAGEIRO DA PAZ”
Enfim... Fechando os olhos aos desígnios inexplicáveis e doentios dos homens, prefiro de certa forma me omitir, a permitir, jamais, não poder viver... A ETERNA BELÉM DE MEUS SONHOS!

A todos um abençoado e Santo Natal
Serjão Missiaggia

Saíamos para comemorar o Natal, e percorríamos as casas da Avenida Carlos Alves. Eram abraços, e abraços. E desejos e mais desejos de felicidades. Pensávamos até que tinha jeito, sei lá como, de ser feliz mesmo, assim. O tempo todo. A verdade é que passamos alguns maus momentos, chegamos até a sofrer bastante, choramos e, às vezes, pensamos em desistir. Lógico que houve risos, e zoadas e loucuras na medida certa, ou até um pouco além. Achávamos que o Natal era só aquele presépio empoeirado que a mãe tirava da parte de cima do guarda-roupa. Na verdade, tinha mais a ver com perceber a estrela (nossa estrela?) e segui-la.
Desejo que cada um possa perceber sua estrela e escolher segui-la. Sei lá, vai que tem um filho de Deus na outra ponta?
Jorge Marin

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

VIDA SIMPLES: MANUAL DE DESORIENTAÇÃO

Foto de Hermin Abramovitch


Andando pelas ruas de Juiz de Fora, o caos é o mínimo que acontece. Natal chegando, décimo terceiro salário, e lá vamos nós para as compras. Na saída de casa, um carro, dirigido por uma senhora, não para no cruzamento, e choca-se violentamente com outro, zerinho, que vai passando. A criança no banco de trás, sem a tal cadeirinha, é resgatada pela mãe, que chora. É... o dia promete.
Um conterrâneo (sanjoanense), meu vizinho, vem ver o acidente, e diz que não suporta mais este corre-corre, esta barulhada e não vê a hora de se aposentar para viver uma vida simples em São João. Pergunto (sou chato): mas afinal que vida simples é essa? Percebo que meu companheiro pensa que, depois que saímos de nossa cidade natal, ela parou e ficou do jeitinho que era. Ele fala que vida simples é viver num lugar calmo, sem engarrafamentos de trânsito, poder parar na rua e conversar com as pessoas, ser dono do seu tempo, não ter que ficar desviando dos transeuntes enlouquecidos todo o tempo. Enfim, “viver”, diz ele.
Este diálogo me lembrou meu velho pai que, no dia de hoje, se vivo fosse, estaria completando seus 88 anos. Ele dizia, na época da Guerra Fria, que, se o mundo acabasse, ele se mudaria para Roça Grande. Ao situar a vida simples geograficamente parece que estamos levando a sério a antiga piada do sr. Irenio.
Pensamos, talvez até por força de nossas religiões, que a vida simples depende de um despojamento, parecido com aquela cena do São Francisco, no filme “Irmão Sol, Irmã Lua”, onde o jovem entrega todos os bens, e até as roupas, recebidos do pai, para seguir uma vida de santidade e paz. Ou mesmo do iluminado Buda, quando, ainda Sidarta, abandona seu palácio dourado, e vai jejuar debaixo de uma árvore.
Mas, aos poucos, tenho percebido que a privação da materialidade, tanto quanto o decantado despojamento, tem um papel pequeno na simplicidade de nossas vidas. A simplicidade, mais do que uma consequência do ambiente externo, é fruto da forma como organizamos as nossas escolhas. E o pior é que estas nem sempre são feitas de forma consciente, já que, na maioria das vezes, são determinadas unicamente pelas nossas sensações. O que queremos, na verdade, é provar o fruto proibido. Se não tiver mais na árvore, é certo que vamos cultivar um novo. Ao invés de buscar, simplesmente, a felicidade, buscamos novas e excitantes sensações. Com estes sentidos que nos foram dados, não há nada de errado com isto, exceto que, quanto mais elaboradas estas criações mentais pela busca do prazer, mais complexas vão se tornando as nossas vidas.
Tentar controlar as escolhas também é outro equívoco, é premeditar o breque, é programar o sonho. Então, como não é possível, pelo menos enquanto vivos, deixar de sentir, a solução, se é que é factível, passa pela ESCOLHA DA FORMA COMO VAMOS SENTIR.
Muitos pensam: ah, mas se eu voltar pra São João; ah, se eu me aposentar; ah, se eu tiver pássaros e flores no jardim! Pode ser que muitos de nós não suportem esta situação nem por um mês. Porque viver, para nós humanos, não depende da paisagem. O poeta Walter Franco esclarece, em “Serra do Luar”, que “viver é afinar o instrumento, de dentro pra fora, de fora pra dentro, a toda hora, a todo momento”.
Aqui, no blog, temos um lema, que é a marca registrada do Serjão. Diz: vamos que vamos, e indo, percebemos que a simplicidade é mais do coração do que da cabeça. E encaramos todos os bêbados, os lúcidos e os doutores. Cantamos uma música do nosso tempo, aquela que diz “I wanna know: have you ever seen the rain, comin’ down on a sunny day”. Não queremos explicar nada, nem receber explicações. Se é possível viver uma vida simples, então, meu amigo, eu vou lá e vivo, em Nova Iorque, ou em São José dos Cabritos (Ituí).
Me diz aí: você, alguma vez, já viu a chuva caindo, num dia de sol? Pois é...

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

OS IRMÃOS MORAM AO LADO - FINAL



NA SEMANA PASSADA, como bem recordam, uma irmã, possivelmente uma ovelha desgarrada, veio ter à minha oficina, procurando o reino de Deus. Se não estou enganado, há uma passagem bíblica, em Mateus, onde Cristo afirma que “o reino dos céus é semelhante a um negociante.” Mas lá fala num negociante de pérolas e, com muito custo, a mulher percebeu que o meu negócio é outro.
Como estava recebendo peregrinos em busca de verdes pastagens, o meu medo era de que um dos meus fregueses entrasse, por engano, na casa do Senhor, e pudesse causar algum transtorno. A dúvida, a abominação e o ranger de dentes só cessaram quando um irmão, meu conhecido, contou o seguinte causo.
E eis que, numa tarde calorenta, quando estava ocorrendo um culto, e exatamente na hora da exaltação, entra um senhor pela porta e, para espanto dos presentes, pergunta, num brado que, segundo meu amigo, “assemelhava-se à trombeta do arcanjo”:
- É aqui que dá um jeito nas coisas?
O silêncio foi geral, e, um a um, todos se viraram para trás, na direção da porta. O pastor não se escandalizou e, com a calma e atitude decidida, própria dos pastores, convidou o homem a entrar e, dirigindo-se a todos, acalmou-os:
- Lembrem-se de João: “Em verdade, em verdade vos digo: quem receber aquele que eu enviar, a mim recebe; e quem me recebe a mim, recebe aquele que me enviou”.
O homem estava encantado com aquele tanto de funcionários e, no mesmo tom do pastor, declarou:
- Desculpa, gente. Eu não conheço o João, mas tem um detalhe muito importante: se for para pegar, eu vou querer pra hoje. Esse calor infernal está me matando!
O pastor exultou:
- Aleluia! Aleluia! Acabe de entrar, irmão! Veio no lugar certo! Este calor, no corpo, não é coisa do bem! Está escrito: arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados, de sorte que venham os tempos de refrigério, da presença do Senhor.
O freguês ouviu a palavra “refrigério” e se animou, mas, pensando se tratar de geladeira, quis deixar as coisas bem claras:
- Eu não sou tão exigente assim, pessoal. Eu não quero gelar nada. E, brincando, concluiu: eu só quero mesmo é um ventinho!
Mas o pastor estava impossível:
- João disse que “o vento sopra onde quer, e ouves a sua voz; mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito.”
- Só um minutinho – respondeu o visitante, todo feliz. E saiu correndo pela porta.
O pastor continuou seu ministério:
- Volta, irmão, a tua fé te salvou. Volta!
E eis, que carregando um grande ventilador, aqueles de pedestal, volta o “convertido”, todo sorridente e animado:
- Entrega lá pro João, gente. Eu tenho certeza que ele vai dar um jeito.

Quem acha que os evangélicos são carrancudos, é porque não escutou a gargalhada que se seguiu.
Enfim, foram amigos verdadeiros que conheci e que, neste lugar, não mais se encontram. Confesso que cheguei, muitas vezes, a passar por momentos bem estressantes devido ao volume dos aparelhos e, principalmente, pela proximidade do meu quarto com o local.
Foi quando resolvi trazer o pastor aqui em casa, na hora do culto, e, da escada da cozinha, lhe mostrei o que estávamos passando. A reação dele foi surpreendente: pessoa finíssima, e de grande sensibilidade, virou-se para mim e afirmou:
- Estamos aqui pelas famílias e não contra elas.
E assim, solidário comigo, veio a pedir, dias depois, que fechassem com tijolos, todas as janelas que ficavam para meu lado. O local ficou um pouco mais abafado pra eles, mas continuaram felizes, pois sabiam que estariam, em muito, me ajudando.
Hoje o barulho se foi, mas, com certeza, as amizades permaneceram.
E, agora que eles não estão mais por aqui, posso citar um santo de quem gosto muito, o Agostinho: “a compreensão é a recompensa da fé.” Amém!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

VOCÊ VAI CONHECER O HOMEM DOS SEUS SONHOS



“Quando você faz um desejo a uma estrela, não importa quem seja, tudo o que o seu coração desejar virá até você. E, se seu coração estiver nos seus sonhos, nenhum pedido é exagerado. Se você dirigi-lo a uma estrela, como os sonhadores fazem.”
Esta musiquinha antiga, do desenho animado Pinóquio, é o ponto de partida do novo trabalho de Woody Allen. Mas, quem pensa que o filme tem a ver com morte (pois o nome original em inglês é “Você vai encontrar um estranho moreno alto”), está enganado, assim como quem esperar qualquer coisa. O próprio narrador sabe que os personagens são problemáticos, mas conta tudo com uma certa displicência, e como se, afinal de contas, soubesse de antemão, o quão sem significado a vida de todos, inclusive a nossa, é na realidade.
Rodado na cidade de Londres, nos dias atuais, apesar da aparência altamente romântica proporcionada pela fotografia magnífica do húngaro Vilmos Zsigmond, o filme acompanha a vida de pessoas comuns, que fazem coisas normais, com problemas corriqueiros.
Uma frase solta, dita pela personagem Sally (Naomi Watts) parece dar o tom do filme: “às vezes uma ilusão vale mais do que medicamentos.” Sua mãe Helena (a excelente Gemma Jones, que muitos conhecemos como a Madame Pomfrey do Harry Potter) está aporrinhando a vida, dela e de seu marido Roy (Josh Brolin). Helena tentou suicídio, após ser chutada pelo seu marido Alfie (Anthony Hopkins) e, a partir daí, até porque paga o aluguel, resolve visitar a filha todos os dias para reclamar. Sally resolve, então, encorajá-la a freqüentar uma cartomante, uma trambiqueira chamada Cristal (Pauline Collins). A estratégia funciona, em parte: Helena deixar de ir diariamente à casa da filha para reclamar, e passar a ir, também diariamente, para falar das previsões de Cristal e, de quebra, tomar todo o álcool que puder encontrar pelo caminho.
O marido Alfie, um coroa com ideais de eterna juventude, também está tendo seus problemas, pois, após se casar com uma prestadora de favores sexuais mediante remuneração previamente negociada (se é que vocês entendem o meu politicamente correto) chamada Charmaine (Lucy Punch, muito louca), começa a ver que o seu desejo começa a trazer algumas consequências a ponto de, pior que a solução adotada pela esposa, ele resolve até... reatar o antigo casamento.
O outro casal também está tendo seus próprios dilemas. Roy, um romancista que não consegue emplacar um segundo romance, está desejando sua vizinha de frente, uma estudante de música. Enquanto sua esposa, está desejando ser cortejada pelo seu chefe. Poderíamos dizer que este sentimento é uma coisa imprópria para pessoas casadas, não fossem os objetos de desejo, respectivamente, a belíssima atriz portuguesa Freida Pinto (que uma vez foi a menina Latika, do filme “Quem quer ser um milionário?”) e o bonitão Antonio Banderas que, mesmo aos cinquenta anos, dispara muitos corações, além de ser a voz do Gato de Botas do Shrek.
Parece que esta busca da felicidade é o que leva os personagens a suas enrascadas. Roy, além de cortejar a vizinha, resolve roubar o romance de um amigo, Henry Strangler, que ele julga ter morrido num acidente de carro, mas a coisa parece não ser assim tão simples. E a própria decisão de Sally, de entregar a mãe aos cuidados de uma pilantra, acaba interferindo na sua busca de realização profissional.
Vamos percebendo aos poucos que a tal busca da felicidade, embora legítima, tem sempre um preço a ser pago, que pode ser muito alto às vezes. Mas, tudo isto é demonstrado sutilmente, sem moralismo, sem filosofia e até mesmo sem muita emoção.
Helena acaba não encontrando o tal moreno alto, bonito e sensual, mas se apaixona, afinal de contas, por um baixinho branco, careca e barrigudo. Dono de uma loja de livros esotéricos, este Jonathan (Roger Ashton-Griffiths) parece ser bem melhor do que a ilusão, ou os medicamentos.
Quando termina o filme, uma adolescente, do meu lado, pergunta, indignada; “o que é que eu vim fazer neste filme?”. Não falo nada, vou saindo de mansinho, mas eu sei o que eu vim, e consegui fazer: assistir um filme de Woody Allen. Inodoro como um remédio homeopático, mas, algumas vezes, estranhamente eficaz.

(Crítica: Jorge Marin)

domingo, 12 de dezembro de 2010

PASSAMOS DOS VINTE MIL. E A GENTE NEM VIU!

Vinte Mil Léguas Submarinas (cena do filme da Walt Disney Productions)

Imaginem a gente recebendo amigos numa sala aconchegante, para tomar um café, para bater papo, ou simplesmente lembrar "os bons tempos", falar umas abobrinhas. E rir. Mas rir bastante mesmo. E, no meio do riso, deixar até algumas lágrimas rolarem, sem querer, pelo rosto.
E já são mais de 20.000 xícaras de café! Café virtual, é verdade. Mas, nem por isso, com menos papo, menos lembranças, menos abobrinhas, e menos riso, ou choro, quem sabe?
Um blog com a marca Pytomba não poderia ser diferente do que foi a dinâmica dos bailes. De repente, uma guitarra começa a dar choque, um pedal quebra, um microfone pifa. Aqui, no blog, o que pifou foi, justamente, o contador de visitas. Mas, como o nosso blogger é muito organizado (o contador não é do nosso blogger), fizemos as contas, somamos a estatística e... 20.177 visitas!
Cara, que sacanagem, a gente ia ficar vigiando para ver quem seria o 20.000º visitante, e agora acontece isto.
E daí? O Serjão sempre diz: esse negócio de estatística dá um nó na minha cabeça, e só serve para encucar.
E ele está certo. Mais importante do que saber quem foi o 20.000º visitante, é ir dormir agora - é uma e vinte da manhã! - e saber que estamos vivendo plenamente. E só sabemos que estamos vivendo plenamente, porque conseguimos tomar, junto com os amigos, 20.000 xícaras de café virtual. E em menos de dois anos.
E é só o começo: a porta continua aberta, o café está no fogo, e o coração, tranquilo.
Podem chegar que a casa é de vocês. Obrigado...
(Agora vamos escrever as visitar a lápis, para não perder as contas)

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

OS IRMÃOS MORAM AO LADO - III



NA SEMANA PASSADA, eu estava na minha oficina, de calça curta, não só porque estava usando aquela bermuda furada com a qual eu fui no casamento da moça, mas também porque estava me sentindo espremido pelo interrogatório da Mulher Misteriosa. Depois de pesquisar vários detalhes do meu trabalho, ela deu um diagnóstico, sei lá por quê, de que o local era acanhado, mas iria indicá-lo aos amigos. Eu já não sabia se fica feliz ou assustado.
A sabatina continuou:
- Gozado!... Quase todos os lugares que conheço têm expedientes, no máximo, três vezes por semana! Só aqui é diferente!
- É mesmo? Possivelmente, pouco trabalho! – respondi um tanto surpreso.
Enquanto, já de saco cheio, começava a perder a paciência, ainda teria que escutar algumas perguntas:
- Já são muitos os seus simpatizantes?
- Ah! Por alto, pelo menos uns cem! – respondi, já fazendo cara de poucos amigos.
- Ué!... Me disseram que não passava de trinta!
- Intriga da concorrência!
- E como faz pra caber tanta gente? – perguntou, admirada, enquanto, continuava a olhar o pequeno espaço da oficina, e já um tanto confusa
Ou esta senhora é maluca... ou andou bebendo”-pensei.
- E os bancos? Onde estão os bancos? Ou aqui fica tudo no chão?
- Que banco, minha senhora? Que banco?
- Não me diga, então, que, temos que ficar todo o tempo de pé?
- Não, minha senhora! Não é nada disso! Eu não conserto na mesma hora! Tem que ficar aqui!
- Ficar aqui? – reagiu ela, com certo ar de arrependimento, e até um certo apavoramento.
Nisso, os meninos chegaram e eu ainda nem havia lavado minhas mãos de graxa.
Procurei, de imediato, encurtar o assunto e ir rapidinho aos finalmentes, dizendo:
- Não me leve a mal, minha senhora! Tem certeza, mesmo, que procura uma oficina?
- Oficina?!!! - De olhos arregalados, embasbacada, ainda perguntou: Então, aqui, não é umaaaaa...
Pior de tudo, é que ela não conseguia terminar de fazer a pergunta e eu já começava é ficar numa curiosidade sem fim.
- Minha mãe!!!... Desculpe-me moço, não sei onde enfiar a cara! ÉÉÉ... Que me informaram que aqui éééé... E novamente não conseguia completar a frase.
Foi aí que a nossa ficha ao cair de vez, levou-nos a uma crise de riso incontrolável.
Pedindo mil desculpas, confessou-me que aquele seria, até então, o episódio mais divertido que havia acontecido com ela.
E assim, em meio a muitas gargalhadas, mas um tanto incrédulo, ainda concluí:
- Tudo bem... Tudo bem, minha senhora! Procure se acalmar, pois entendo perfeitamente! A senhora, foi, realmente a primeira, mas com certeza, não será a última! Entre nesta porta, ao lado e siga em frente!

Fechei a oficina e fui receber as crianças.

MORAL DA HISTÓRIA: Acho que, pelo menos, ganhei uma freguesa.

De volta aos meus afazeres, uma dúvida começou a tomar forma em meu pensamento: se este tipo de equívoco já aconteceu aqui, e, se, por acaso... Mas afastei a ideia. Não, não é possível que uma pessoa vá numa igreja, e pense estar numa oficina. Será???
Na próxima semana, não percam: A Igreja, os irmãos desconsertados.

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

OS FILMES QUE EU NÃO ASSISTI NO CINE BRASIL



Há mais de 25 anos, eu cultivo este estranho hábito de subverter as histórias infantis que conto para os meus filhos. Talvez porque eu mesmo não suportasse o conformismo e achasse toda aquela “bondade” irreal demais, eu sempre alterava os escritos originais dos irmãos Grimm e outros, introduzindo explicações sobre o Lobo, que eu não considerava Mau, apenas um apreciador da carne suína, como nós. Outras vezes eu explicava que aquele felizes “para sempre” era mentira, pois nada é para sempre, pelo menos aqui nestas bandas terrenas.
Naqueles idos anos 70 para 80, foi lançado o filme “Superman”, contando a saga do famoso herói dos gibis, numa invejável produção, que tinha a participação de Marlon Brando, como Jor-El, e a estreia do inesquecível Christopher Reeve, além da figurinha atrevida de Margot Kidder, na pele da destemida Louis Lane. Também neste filme, para minha tristeza, imperavam os clichês, do herói que defendia os fracos e oprimidos ao bandidão terrível e totalmente “do mal” Lex Luthor, aqui vivido por Gene Hackman, o sósia do Filipão.
De volta ao século XXI, temos agora uma deliciosa releitura desta luta do bem contra o mal. Na abertura de “Megamente”, é recontada a explosão do planeta Krypton, mas sob a ótica incômoda de um vizinho do “garoto dourado”: também um alienígena, porém de pele azulada e cabeção. Enquanto o futuro Homem de Aço, desce tranquilamente, em sua naves, através de um cinturão de asteróides, nosso amigo azulão vai ricocheteando em um por um. Na chegada à Terra, a coisa não é diferente, com o garoto de Krypton caindo diretamente dentro de uma mansão, enquanto a criança azul vai parar dentro do pátio de uma prisão, onde é adotado por um bando de criminosos da pior espécie, que, como quaisquer pais modernos, condicionam o filho a odiar aquilo que mais temem, no caso a polícia.
Já dá para perceber que os dois extraterrestres irão desempenhar papéis de destaque na cidade mais próxima, a moderna Metro City, onde assumirão as personalidades de Megamente e Metroman. No entanto, o que leva o azulzinho Megamente a assumir sua porção malévola é um fato corriqueiro, hoje muito comum nas escolas, o bullying. Como ele é um tanto atrapalhado, e o supergaroto, seu colega de classe, é o queridinho da professora e dos colegas, acaba sendo discriminado por todos, e sendo marginalizado. Nesta posição desagradável, ele conclui que, como não consegue fazer nada de bom, o negócio é partir para a maldade. Bem lógico, não?
A luta destes dois superseres é acompanhada pela (também) repórter charmosa Rosane Rocha, que acaba sempre sendo tomada como refém pelo malfeitor. Seu cameraman Hal, um nerd barrigudo que é louco por ela, acaba se transformando num terceiro personagem, o Titã.
Até aí, tudo se parece com qualquer outra história de animação, exceto pelo fato de que nosso amigo, ou deveria dizer, inimigo, Megamente acaba por eliminar o Metroman. Com isto, a cidade fica à sua mercê, mas, sem um adversário, ele parece perder o seu gosto pela maldade, mesmo animado pelo seu fiel escudeiro, o peixe “Criado”. Para curar o seu tédio, resolve utilizar o DNA do falecido super-herói para criar um novo super, o tal Titã. Só que o que ele não esperava é que o novo personagem resolve trilhar o caminho do mal. E aí?
Para uma pessoa que gosta de subverter historinhas infantis manjadas, este roteiro (de Alan J. Schoolcraft e Brent Simons) é genial. Primeiro, o super-herói perde, segundo o vilão não sabe o que fazer com sua solidão e, finalmente, cria um novo super-herói que prefere trilhar o caminho do mal. Sem contar que, assim sem querer querendo, o vilão, disfarçado de bom moço, o Bernard, acaba se envolvendo com a destemida, e desejada, Rosane Rocha.
Quando digo que a narrativa é subversiva, não considero que seja condenável, ou perigosa. Ao contrário, acho importantíssimo desafiar as mentes das crianças com conceitos que não estejam prontos, mas que devam ser pensados. Meu filho me perguntou na saída: “papai, o Megamente é do mal ou do bem?”. Retornei a pergunta e ele respondeu exatamente o que ocorreu no filme.
Por isso, considero “Megamente”, mais do que uma ótima diversão para a família, um motivo para o exercício do diálogo entre pais e filhos, e, até para nós, um alerta que, mais do que nunca, aquele cara, que era tido como vilão, pode ter seus bons momentos, e aquele palhaço, aparentemente inofensivo, pode acabar sendo uma ameaça. Para ficar ainda mais parecido com a realidade, vale lembrar que o Megamente pronuncia várias palavras de forma errada. Alguém poderia até dizer que se trata de um analfabeto. Mas, neste filme, assim como na vida real, nada é definitivo, e nem sempre é o que parece ser.

(Crítica: Jorge Marin)

sábado, 4 de dezembro de 2010

OS IRMÃOS MORAM AO LADO - II

Foto por Nikola Borissov

NA SEMANA PASSADA, como bem devem se lembrar, por conta da vizinhança entre uma oficina e uma casa do Senhor, não do senhor que me lê, mas do Senhor Mesmo, o Lá de Cima, coisas estranhas aconteceram: um casamento quase sai da esfera do Juiz de Paz e vai parar no Demlurb.
Mas, passado o stress, lixo recolhido, noivos em lua-de-mel, tudo voltou ao normal, dentro do possível.
Martelada pra cá, martelada pra lá. Era mais um daqueles dias em que nada dava certo. Até mesmo um freguês havia me dado “cano”. Disse que votaria e pagaria depois. Ficou no depois.
Estava, também, quase na hora dos meninos chegarem do colégio. Nesta época, a coisa estava bem mais apertada, pois minha esposa trabalhava em tempo integral, e eu procurava, na medida do possível, dar uma mãozinha. Nesta hora, um tanto ansioso, já percebia que eles já deveriam ter chegado.
E o calor que fazia neste dia? Em determinados horários, o local chega a ficar bem quentinho. Prá piorar ainda mais a situação, haviam entregado duas enceradeiras. E de parentes!
(Sabem como é, né?)
E lá estava eu: ralando, ralando, mas sem deixar de pensar, um só minuto, naquele monte de contas prá pagar.
Neste exato momento, aproxima-se do balcão, uma freguesa: era uma senhora muito simpática e simples, que aparentava uns sessenta e cinco a setenta anos, pouco mais ou menos.
- Boa tarde – disse ela. Custei, mas, enfim, resolvi aparecer! Já há algum tempo em que venho pensando em vir, mas só agora achei um tempinho! - concluiu.
- Antes tarde do que nunca! – respondi, em tom de brincadeira. Fiquei pensando: quem será esta mulher, meu Deus? Mas... em que posso servi-la?
- Falaram-me que você é dos bons! Que é só por as mãos, que o trem fica “bão” de novo!
- A gente faz o que pode, minha senhora; às vezes, até o que não pode, mas... no final, tudo dá certo! Se não consertar por bem, vai por mal mesmo! – eu ia brincando com ela, enquanto, segurava o martelo em uma das mãos.
- Você já faz este trabalho há quanto tempo?
- Já há uns vinte e poucos anos! – respondi.
- E sempre foi aqui? – indagava, enquanto seus olhos ficavam a percorrer cada centímetro da oficina.
- Não! Estou aqui, nos fundos, há pouco mais de três anos!
- Já houve caso da coisa não dar certo? – indagou, com os olhos um pouco arregalados.
- Claro! - respondi. Ninguém é perfeito! A gente faz o que pode! Mas, procure não se preocupar, pois sempre dou uma pequena garantia daquilo que faço! “Mas... somente, do que faço!” E destaquei bem esta última frase, como se tivesse pronunciado as aspas. O fato é que, entre tantas interrogações e duvidas, comecei mesmo é a ficar desconfiado.
Ou esta senhora é perfeccionista, maluca ou é mal pagadora, pensei. Seria uma fiscal? Pelo menos, meus tributos estão em ordem!
O interrogatório continuou:
- Quais os dias da semana e os horários de funcionamento?
- De segunda a sábado! Só dou uma pequena pausa para almoçar! Do contrário, a concorrência nos engole! – continuei brincando, mas com uma pulga atrás da orelha.
- E não é que você tem razão? Só que eu conheço, são mais de trinta! Dizem até que, neste meio, tem muitos charlatães!
Pensei: esta mulher está querendo que eu dê uma de dedo duro. Resumi:
- De certa forma, a senhora tem razão, mas, que eu saiba, aqui em São João, sou apenas eu e mais dois!
- De confiança? Até pode ser! – prontamente me respondeu!
- E o que a gente tem que trazer? - continuou a perguntar.
O que é que ela quer dizer com isto? Mas, não perdi a classe:
- Não se preocupe, minha senhora! O material é por minha conta! Depois, é tudo incluído!
Seja o que for que ela queria, parecia ter ficado satisfeita, e emendou:
- Achei o local aqui meio escondido, mas começarei a indicá-lo agora para outros amigos!
- Quanto mais, melhor! Principalmente agora, nesta crise! – retruquei, mas a minha vontade já era de chorar. Imaginem: eu, cheio de serviço, e vem esta criatura, com esta conversinha mole, me interrogando como numa entrevista de emprego, fazendo observações, críticas e, no final, dizendo que ia recomendar os meus serviços. Será que ela vai me assaltar?
Leiam, NA PRÓXIMA SEMANA, o desfecho desta estranha conversa. É bem mais sinistro do que parece, podem ter certeza!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

HARRY POTTER 7 - FINAL



Na semana passada, brinquei que a questão, colocada pelas adolescentes, ainda na fila do filme, sobre com quem Hermione (Emma Watson) iria “ficar”, era muito importante, e merecia reflexão. Mas, na verdade, não é uma brincadeira. Afinal, Harry (Daniel Radcliffe) e Ron (Rupert Grint) são, agora, dois homens. Quando o inseguro Ron Weasley dá uma de furão (em inglês, weasel), e Harry se vê a sós com Hermione, chama a gata para uma dança. Ela acompanha numa boa mas, quando a coisa pode começar a esquentar, ela simplesmente para, pois conhece bem a natureza do amor que sente por Harry, e o amor, digamos adulto, e tudo o mais que sente pelo glorioso Weasley que, por sinal, no filme, parece ficar fora de cena apenas por alguns minutos, bem ao contrário do livro.
Como acontece em As Duas Torres (do Senhor dos Anéis), neste filme também o mal parece prevalecer. E, de fato, prevalece no final, com uma importante descoberta feita pelo Lord Voldemort. Há alusões visuais, e sonoras, relacionando as forças do mal aos governos nazistas e outros totalitarismos, e os três heróis agem como os românticos guerrilheiros dos anos 50 e 60, retirando-se para as florestas, e fazendo ataques estratégicos dentro do território inimigo, além de visitarem alguns subúrbios londrinos reais, imprimindo uma atmosfera de realismo, reforçada pela música sempre perfeita do francês Alexandre Desplat, também autor das trilhas de “Lua Nova”, do ótimo “Coco, Antes de Channel” e do infantil “A Bússola de Ouro”. Como num antigo rádio da Alemanha hitlerista, uma voz anuncia os nomes dos mortos, para os angustiados heróis de Hogwarts.
O andamento do filme, em relação aos seis anteriores, é bem mais lento, e são poucos os sorrisos. A galeria de astros e estrelas britânicos está presente: Ralph Fiennes/Voldemort, Helena Bonham Cartes/Belatrix, Alan Rickman/Snapes, além da estreia de Rhys Ifans, como o pai riponga da birutinha Luna (Evanna Lynch). No entanto, a aparição destes atores, e de tantos outros, é rápida e limita-se a cenas curtas, diferente do trio principal, que esbanja boas atuações, capazes de inseri-los na referida galeria de astros.
Outro grande momento do filme, é a narrativa do “Conto dos Três Irmãos”, que explica a origem das Relíquias da Morte. A cena é ilustrada com uma animação, que retrata a história de um livro infantil para bruxos, porém sem perder o toque sombrio, e maléfico, do filme.
Projetado para ser convertido para 3-D, o filme manteve seu formato 2-D, e pode-se dizer que a Warner fez muito bem em proceder deste modo. O filme fica mais brilhante e mais claro (já pensaram o que aconteceria se ficasse mais escuro ainda?), e não perde em qualidade. Na cena do logo inicial, pode-se jurar que se trata de uma imagem tridimensional!
Finalmente, o que pode ser dito sobre esta primeira parte do final de Harry Potter é que a obra preparou de modo satisfatório, o terreno para a batalha final (a Parte 2 está prevista para julho de 2011). Se este vai se assemelhar a um filme de guerra, meio a la Star Wars, a Parte 1 tentou, e na maioria do tempo conseguiu, se manter como um filme, às vezes de suspense, às vezes de horror. Mas o que prevaleceu foi a afirmação dos três heróis, tanto na trama quanto na vida real, como protagonistas da história, e aptos a conduzir de forma competente, a luta contra o Senhor das Trevas.
Esta é a esperança da comunidade de bruxos e outros seres mágicos pertencentes ao universo potteriano. E também dos milhões de fãs deste universo de cá, tão carente de adultos jovens de bom caráter, capazes de executar a magia de serem responsáveis, comprometidos, pacíficos e iluminados, sem ter que recorrer a quaisquer varinhas e encantamentos.

(Crítica: Jorge Marin)

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

OS IRMÃOS MORAM AO LADO

Portrait de Enikõ Szabó, fotomanipulada por Jorge Marin

Antes de começar a contar este causo, irei, primeiramente, posicionar melhor nossos amigos leitores.
Gostaria de explicar que a entrada de minha oficina fica bem ao lado da porta de outro cômodo. Nesta outra porta, existe um galpão para aluguel, sendo que o corredor de passagem é comum aos dois proprietários.
Importante ressaltar também que existia, na época, um acesso privativo de minha casa até a oficina.
Sempre foi uma convivência pacífica, até que (como eu poderia dizer?) fatos começaram a acontecer.

Vamos, então, ao Causo: OS IRMÃOS MORAM AO LADO.

Capítulo 1: A Noiva e o Lixo (que não era o Noivo)

Bendita a hora em que deixei para colocar meu lixo na rua!

Após abrir a porta, de repente, a porta de minha oficina, com um grande saco de lixo na mão, deparei-me com algo extremamente inesperado. E põe inesperado nisso! Acredite quem quiser, mas, simplesmente, dei de cara com uma noiva. Isto mesmo! Uma noiva. Toda de branquinho, com um longo e belo vestido, vinha ela em minha direção.
Em lágrimas, de braços dados com o pai, e escoltada por duas damas de honra: era só emoção...
Caminhando em passos lentos, adentrando pelo corredor de minha oficina, parecia mesmo que vinha ao meu encontro. E foi o que aconteceu.
Até que ficamos só nós, frente a frente.
O cenário era aquele tradicional de casamento: música ao vivo, perfume no ar, fotografias, flores, e muita gente bonita e chique.
Tudo na mais perfeita beleza e harmonia, se não fosse pelo simples fato, de eu estar ali, no meio do caminho.
Pois, acreditem, lá estava eu, de short (furado), sem camisa, com um saco de lixo na mão, e sem nada entender do que estava acontecendo.
Cheguei, por alguns momentos, até mesmo a pensar em pegadinha, mas a cena estava muito perfeita para tal. E também, quem poderia ser capaz? Que eu conheça, ninguém!
Foi, realmente, uma situação não muito agradável, mas perfeitamente entendida por ambas as partes.
Numa hora dessas, que é que eu poderia fazer? Nada! Simplesmente, me desculpei, desejei boa sorte, e fui atravessando o cortejo. Bem de ladinho.
Entre chegas pra lá, pede licenças e empurrões, fui passando no cantinho do corredor. Enquanto ralava as costas na parede, fui, mais do que depressa, colocar meu mico... digo, meu lixo, na calçada. Isto, sem contar que, por um triz, quase deixei um pedaço de meu calção ficar para trás. Uma ponta de prego, mal posicionada na parede, quase piorou, ainda mais, aquela patética cena.
Mas... Há males, que vem prá bem.
Esta quase tragédia serviu para que despertasse em mim, a realidade, de não estar mais sozinho, e que teria de dividir, dali em diante, com meus queridos irmãos evangélicos, aquele espaço. (Pelo menos, o corredor, até então, só meu).
Foi a partir deste acontecimento, que outros fatos, nem tantos rotineiros e de certa forma hilariantes, começaram a acontecer.
NA PRÓXIMA SEMANA: Consertos e Curas (ou Quem não Sara, Solda).

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

FILMES QUE EU NÃO VI NO CINE BRASIL



Quando o assunto é cinema, às vezes me pego naquele dilema típico de todos os cinéfilos, e sempre lembrado nos comentários do meu amigo Brandão, presença constante em nossos fóruns: estamos falando de um filme-filme ou de um filme-arte? É só entretenimento ou aquela “razão esclarecedora” de que falam os filósofos socialistas? Pois eu resolvi pular esta parte, e usar como álibi o gênio de Luis Buñuel, segundo o qual, “a hipnose cinematográfica, leve e inconsciente, deve-se, sem dúvida, à obscuridade da sala, mas também às mudanças de planos, de luzes e aos movimentos da câmera, que enfraquecem a inteligência crítica do espectador e exercem sobre ele uma espécie de fascinação e de violação.”
Assim, já previamente hipnotizado fui para a fila, repleta de adolescentes, comprar meu ingresso para o megahit “Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 1”. Na fila, fui acompanhado dos meus filhos: o mais velho, que acompanha Potter desde os 18 anos; e o mais jovem, que nasceu junto com o “Cálice de Fogo”, de 2005. Ali mesmo já foi possível perceber a extensão do fenômeno potteriano: uma garota disse que estava comprando ingressos para as duas sessões, para a dublada e para a legendada, nesta para perceber a obra cinematográfica como ela foi feita e, na dublada, simplesmente para não perder nenhum movimento de Daniel Radcliffe, “nenhuma piscada de olho”, segundo ela.
Por este movimento, já se percebe que, mais do que um filme, Harry Potter passou a ser um ritual obrigatório para crianças e adolescentes, um fenômeno de massa que tem o mérito de trazer para o nosso dia a dia, através da escrita de J. K. Rowling, as histórias mitológicas, os seres fabulosos e os banidos elementais, todos distantes dos personagens-máquinas então presentes nas mídias infantis.
É esta mistura, que tantos tentaram, mas que, estranhamente deu certo para esta inglesa, escrevendo em bares enquanto a filha dormia, morando de favor, enquanto corria o divórcio contra o marido português. Enfim, “Vingardium Leviosa”, diz o feitiço inventado por ela, leve e para a cima!
Por todos estes motivos, era de se esperar que o filme atraísse uma multidão de apaixonados e nostálgicos. Quem assiste Harry Potter pela primeira vez neste “Relíquias da Morte; Parte 1”, certamente não vai conseguir entender o que se passa. O diretor David Yates, que também dirigiu o quinto e o sexto episódios, simplesmente capta a história e retrata o momento crucial para os três adolescentes protagonistas, que assumem a vida adulta e se afastam, literalmente, dos familiares. Ou seja, esta é a história de Harry, Ron e Hermione.
Quem leu o livro, sabe que seria impossível colocar todo aquele conteúdo – são 759 páginas – em apenas um filme. Desta forma, o episódio funciona como a primeira voz de um contraponto, em que o grand finale ocorrerá na segunda parte, da mesma forma que Matrix Reloaded ou As Duas Torres (do Senhor dos Anéis).
Neste filme, ou deveria dizer, penúltimo capítulo, o ambiente está particularmente sombrio. Não por acaso, a franquia buscou um diretor de fotografia excelente, o português Eduardo Serra, indicado para o Oscar pelo trabalho fantástico em “Moça com Brinco de Pérola”, em que teve a tarefa de representar os detalhes de luz e sombra da pintura de Vermeer. Aqui, a luz passa longe, e o Lorde das Trevas reina absoluto. Não tem mais a situação de conforto da Escola de Hogwarts, não tem, como foi dito, nem mamãe nem papai, nem Quadribol, nem gravatinhas vermelhas ou meias três quartos. Que me perdoem os que não viram “O Enigma do Príncipe”, mas Dumbledore foi assassinado, e os antigos protetores, o gigante Hagrid (Robbie Coltrane) e o professor Alastor Mad-Eye (Brendan Gleeson), embora ofereçam uma proteção aparentemente forte no início do filme, quando Harry tem de ser retirado da casa de seus tios, na Rua dos Alfeneiros, o que se vê é que os três amigos estão agora por sua própria conta e risco, contando, é claro, com as habilidades aprendidas na escola de magia (sobretudo por Hermione), mas tendo apenas um ao outro para confiar.
Aqui, surgem dois complicadores: primeiramente, uma coisa que é intrigante no livro: as pistas, deixadas por Dumbledore são tão obscuras que acabam sendo quase inúteis. Sabe-se que os místicos costumam falar e escrever em códigos compreensíveis apenas para os iniciados, mas, no presente caso, ninguém consegue entender absolutamente nada. Outro complicador, desta vez natural, é a sexualidade, que vem com a maturidade dos personagens. Afinal, e é grande questão das adolescentes, Hermione vai “ficar” com Harry ou com Ron?
Com esta importante questão, fecho a primeira parte desta crítica. Se a Warner retalhou o filme em duas partes, dou-me o direito de também criticar a primeira parte em duas. A segunda estará disponível no domingo à noite. Portanto, para proteger a todos contra a ameaça dos Dementadores, deixo-os protegidos: Expecto Patronum!

(Crítica – Jorge Marin)

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

MINHA PRIMEIRA VEZ - FINAL



Na semana passada, como bem recordam, era chegada a hora do encontro. Confesso que lembrei disso a semana inteira. Posso me arriscar a tomar um beliscão após esta postagem, mas foi uma coisa que ficou gravada na minha memória. Foi assim:
Lá fui eu, banhozinho tomado, cabelo penteado, perfume atrás da orelha e, pasmem, até o tênis lavado. E era tudo por uma boa causa. Ia caminhando a passos largos em direção ao centro da cidade, local onde ela trabalhava.
A maioria das pessoas já havia saído, e as coisas foram acontecendo, numa rotina deliciosamente natural, embora eu estivesse com o coração a ponto de sair pela boca. Até para não correr o risco de apanhar, vou pular alguns detalhes de ajustes e vacilos que sei que a maioria comete, mas nada que atrapalhasse o melhor da festa.
Enfim... Era chegado o tão esperado momento.
Finalmente, lá estávamos... frente a frente...
Ao me aproximar dela, meio ressabiado, confesso que pensei em desistir. Quando a encarei diretamente, ela permaneceu impassível, como se aquilo fosse absolutamente natural para ela (hoje eu sei que era) e, ao mesmo tempo como se ansiasse também pela ação.
Meu coração começou a pulsar mais rápido e as mãos ficarem frias. Quanta emoção!!!!
Após trocarmos aquele fulminante olhar, procurei ser bastante objetivo e assim, não perder o mínimo tempo. Afinal, eu queria muito e ela nunca escondeu sua disponibilidade.
Pra começo de conversa, me senti bem seguro, pois, para minha sorte, percebi instantaneamente, ser ela, além de tudo, extremamente submissa.
Sendo assim, já sentindo a situação sob controle, procurei sempre, não sei como, tomar a todo o momento, a iniciativa das ações.
E não é que ela foi com minha cara!!!!
Eu sentia que, a cada toque, ela me aceitava mais e mais e, para minha alegria, ainda me impulsionava, a todo instante, a seguir cada vez mais em frente. Não acreditava naquilo que eu via: à medida que eu avançava, atrevidamente, ela pedia mais e mais. Gente, eu não sabia que eu poderia ser tão bom assim naquela coisa.
Por nenhum momento, me fez sentir que poderia estar cometendo algum tipo de erro. Desta forma sem perder tempo, continuei manter meus movimentos ousados e delicados sobre ela.
Comecei a ficar bem à vontade, pois, a cada toque, ela me correspondia com sinais, gemidos e ruídos de aprovação.
Enquanto íamos, cada vez mais, interagindo, eu começava até vislumbrar aquele final tão esperado.
A cada toque, mais prazer eu sentia até que, para minha surpresa, simplesmente, ela própria tomou a iniciativa de pedir-me que nela inserisse aquilo que eu tanto desejava.
Mesmo um tanto tímido, pelo tamanho daquilo que eu teria a oferecer, não me contive e mandei bala. E que momento!!!!!!!
Procurei introduzir lentamente, mas ela, para meu espanto (e deleite), informou de pronto que eu deveria introduzir completamente, e, sem cerimônia, puxou tudo de uma só vez.
E que prazer!!!!!
Pena que a rapidez do momento desfaria, em questão de segundos, aquele ato tão sonhado.
E a danada continuou me surpreendendo, questionando, descaradamente, se eu queria fazer outra. (Negativo e inoperante) fiz-me entender!!!
Desta forma, após mostrar que minha tarefa havia sido cumprida com sucesso, ainda ficamos a trocar um breve olhar apaixonado, até que finalmente saí, com as pernas um pouco bambas.
Minha vontade era de agradecer, mas... tenho certeza que ela jamais me escutaria.
Fiquei tão entusiasmado que, antes mesmo de sair, já estava a pensar no outro dia. (Um outro encontro... quem sabe!!!!!)
Muito possivelmente, amanhã, ainda não terei bala na agulha para repetir tudo aquilo de novo. Mas, com certeza: poderei pegar o saldo ou mesmo sacar um pouco daquela grana, que há pouco, bem há pouco, coloquei no envelope, e nela introduzi. Jamais esquecerei as iniciais do nome dela: A.T.M.
Para ser sincero, ainda não sei aonde poderá nos levar esta revolução tecnológica desenfreada, com suas máquinas maravilhosas, mas... Que o trem é bom, isto é!

A primeira vez, em uma Máquina Eletrônica, de uma agência bancária, a gente nunca esquece!

(Crônica – Serjão Missiaggia / Adaptação – Jorge Marin)

NOTA DO AUTOR: “Coincidentemente, dias atrás, ao dirigir-me ao banco para fazer um saque, surgiu, na tela, a seguinte mensagem: “Sem cédulas. Por favor, utilizar outro terminal. Operação indisponível no momento.” Achei superinteressante, pois, encontrar uma Máquina Eletrônica “durinha da silva” foi também, a primeira vez!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

A BUSCA DA FELICIDADE - FINAL

Digital art por Tsuki Takarai

Nas últimas duas semanas, falamos sobre os aspectos externos da felicidade. Mas, será que existe um aspecto interno? Isso é o que vamos avaliar a partir de agora.
Todos temos o nosso Ego, o nosso Eu. E o que é o Eu? O Eu é forma como fazemos a leitura da nossa existência. Muito criticado nos meios religiosos, o Eu garante a nossa existência. Caso esta percepção do Eu não existisse, nós também não existiríamos, pelo menos no nosso ponto de vista pessoal.
Mas, ter consciência de sua existência é uma coisa, achar-se o centro do universo é outra. A verdade é que, para não ser absorvido, dissolvido mesmo no torvelinho de informações do mundo moderno, o homem tenta desesperadamente se destacar. Somos ensinados que felicidade é o mesmo que sucesso pessoal. E este sucesso é obtido através do prazer, de preferência da obtenção daqueles objetos que poucas pessoas possuem. Desta forma, a felicidade só será atingida quando conseguirmos ser aquilo que queremos ser: vencedores de uma batalha que engendramos todos os dias para conquistar aquilo que nos parece importante; na realidade, pequenas necessidades e ambições engrandecidas pelos nossos desejos.
A própria História da Humanidade é baseada nesta lógica de conquistas, batalhas e derrotas, não necessariamente nesta ordem. Quando repetimos estes feitos, temos a nítida sensação de ter atingido a felicidade. Quando nos apaixonamos, ou nos graduamos, ou obtemos uma promoção no trabalho, ou adquirimos um bem luxuoso, vamos dormir com aquela sensação de preenchimento e de contentamento. Mas, já no dia seguinte, a insatisfação ressurge, a realidade não é suficiente para atender às crescentes expectativas. Aí, caímos de novo na armadilha: planejamos, projetamos a felicidade para um futuro, ainda que próximo, e retomamos a luta. Sabe aquela história de “estou correndo atrás”? Pois é, a felicidade está sempre a nossa frente, no tempo, num futuro que jamais chega, e dentro desta lógica egóica, jamais chegará.
A lógica egóica é muito simples: é feliz quem faz o que quer, consegue ser o que deseja ser, e não tem de dar satisfação a ninguém. Muitos objetarão que isto é um julgamento moral, mas isto é apenas uma constatação de que o Eu quer, mais do que tudo, preservar a sua integridade e, para tal, não hesita em manifestar este comportamento tipicamente infantil.
É claro que vivemos num mundo material e, certamente, não há nada condenável em ter desejos e ambições, e nem imoral em satisfazer os sentidos humanos. Mas, atrelar a conquista da felicidade a estes objetos de desejo, é tão inútil quanto achar que somos pessoas diferenciadas no universo. Porque, se assim fosse, haveria uma conquista de felicidade específica para cada Eu. E isto seria impossível, por dois motivos: primeiro, porque o Eu sempre quer tudo para si; e, em segundo lugar, porque o Eu acha que o mundo é ele mesmo.
Entretanto, sair desta teia, desfiar esta trama, é uma tarefa difícil, que só poderá ser atingida, quando escaparmos justamente desta armadilha de fixação de metas e resultados. Neste novo modelo, a busca da felicidade seria outra que não a promoção de nossos Eus em detrimento dos nossos semelhantes. Uma condição para a felicidade é a existência, plena e serena, atenta e livre, num ambiente livre de conflitos, angústias e ansiedades.
Dentro deste estado de equilíbrio, a felicidade deixa de ser efeito, e passa a ser causa. Aliás, este estado de equilíbrio e repouso mental É a felicidade. Portanto, todo este blá-blá-blá em torno da busca da felicidade é uma grande ilusão, é a crença ilusória nestes mecanismos de defesa do Eu, necessários à nossa autoconsciência, mas nada mais do que artefatos, assim como um “data show” ou um filme em 3D.
Isto não quer dizer que os nossos desafios cotidianos e nossas interações sociais não existam. Eles existem, assim como os conflitos inerentes ao nosso cotidiano. Mas, só porque existem conflitos, não significa que temos de vencer todos eles, mas sim observá-los, olhar para eles, e compreender a sua natureza.
Não serão os nossos pecados, nem as nossas virtudes que irão determinar o nosso grau de felicidade, principalmente porque não há grau de felicidade, mas estado de felicidade. Um estado que advém da subversão das nossas relações objetais, uma janela aberta para o mundo, para sabermos que não somos separados do universo e, principalmente, que não somos eternos.
E, quando conseguirmos enxergar o fluxo da existência, livre da luta pela sobrevivência e da imposição dos próprios desejos, estaremos começando a vivenciar o estado de plena felicidade. Titia Rita Lee (e Paulo Coelho), na música O Toque, já diziam que “você é uma criança do universo, e tem tanto o direito de estar aqui quanto as árvores e as estrelas e, mesmo que isto não esteja claro para você, não há dúvidas que o universo segue o rumo que todos nós escolhemos.” Isto é, todos nós juntos, sem prevalência de nenhum eu especial, sem posse de bens definidos e, principalmente, sem nenhuma espécie de conflito.
Aqui, no blog, sempre passamos esta mensagem de uma determinada noite, e a gente voltando dum baile, galos cantando, brisa fresca da manhã e cheiro de pão fresco. Seria isto a felicidade? E por que não?

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

MINHA PRIMEIRA VEZ



Por várias vezes, o assunto do qual vou falar esteve na pauta do dia mas, na última hora, eu não tinha coragem de postar. Os motivos do recuo eram muitos: será que um assunto desses deveria ir para o blog? O que é que os leitores vão pensar? Meio envergonhado, cheguei até a pedir a opinião da Dorinha e ela, ao contrário das minhas expectativas, achou “uma besteira”. Trago o caso também para conhecimento dos mais novos, até para mostrar como as coisas eram difíceis para pessoas da minha idade.
Então vamos lá: primeiramente devo dizer que, por ser minha primeira vez, não fui tão mal assim!
Valeu a pena esperar, pois, após um longo tempo de espera e ansiedade, enfim tive coragem de me aproximar dela.
De minha parte, nosso namoro até que já vinha rolando há algum tempo, mas só mesmo em troca de olhares. Mesmo sendo ela recém-chegada à cidade, de imediato, começou a despertar o interesse de todos, e comigo não poderia ser diferente. A cada dia que passava, mais ansioso eu ficava para conhecê-la.
Aproximar-me dela já era questão de honra e eu não via a hora em que pudesse enfim: apertá-la... apertá-la e apertá-la. Desculpem-me, mas, qualquer um que a conhecesse iria ficar desta forma, descontrolado: primeiro, pela beleza, pois, as outras que me desculpem, mas beleza assim, eu jamais tinha visto antes. Um verdadeiro “avião” para os padrões da época. Depois, as formas. Mais do que perfeitas, eram um verdadeiro convite à ação.
De certa forma, para com algumas pessoas, eu até sentia uma espécie de inveja, principalmente em saber que já tinham ficado tão íntimos dela. Como se tornara muito popular, sempre acontecia, em determinados horários de seu trabalho, uma imensa fila, só prá poder cortejá-la. Que ódio ao ver aquele bando de marmanjos babando ao redor dela, e com aqueles olhares pidões.
Mesmo começando a sentir um pequeno ciúme, o máximo que eu conseguia era, no máximo, trocar alguns lampejos de olhares distantes. Eu olhava... Olhava... E ia embora, sem coragem de sequer me aproximar. Na verdade, meu medo maior era de que não nos entendêssemos na primeira vez. Tem gente que é atirada: vai lá e pá, na maior cara-de-pau, e nem liga se dá errado. Eu não, eu prefiro ir na certeza. Mas, num caso desses, e principalmente porque eu nunca (vocês sabem)... Como poderia ter alguma certeza?
Quando ela chegou em São João, todos queriam ser os primeiros a se aproximar, mas nem todos também tinham coragem. E o medo de não serem bem aceitos?! Afinal de contas, em seu local de trabalho e, principalmente porque, como em toda cidade do interior, as pessoas que freqüentavam o estabelecimento, ficavam todas de orelha em pé. Só para surpreender alguém levando “um fora”. Seria assunto certo para o Bar Central!
Do seu espaço, discreto, de atendimento, ficava a despertar uma tremenda atenção. As primeiras pessoas que se aventuraram a tocá-la, timidamente claro, eram sempre observadas por uma multidão, pois, no íntimo, todos queriam fazer o mesmo.
Pior que, enquanto eu ficava olhando pra ela, a coitada nem mesmo podia retribuir o meu olhar.
Foi mesmo amor à primeira vista e eu sabia que, mais tarde, ou menos tarde, acharia coragem de chegar até ela. Até mesmo algumas dicas, por amigos, me foram passadas com antecedência, mas, quando chegava a hora H, eu simplesmente ficava gelado e passava reto.
E foi assim, por vários meses: olhando... Olhando... Olhando e... Vendo mais um dia ir embora sem nada fazer.
Outro fato que me assustava era o de ser ela bem mais jovem do que eu. Sabem como é: linguagem moderna, rapidez de raciocínio, pensamentos automáticos. E eu, por minha vez, representante de uma geração de costumes opostos... Parecia mesmo que não tinha nada a ver comigo.
Mas... Eu nunca desistia, pois minha hora, com certeza, iria chegar.
Seu jeito discreto, cada vez mais me fascinava. Também não me importava em saber que, para alguns (incapazes que se deram mal), ela tinha a fama de ser fria. Na verdade, o que ela era mesmo, era extremamente eficiente e capaz, principalmente, no seu desempenho, de resolver sozinha todos os nossos desejos, como é bem comum nos tempos modernos.
E foi assim, até que, num belo dia, ao acordar inspiradíssimo, pude sentir que era chegado o tão esperado momento. Preparei-me como nunca, e até um pequeno rascunho, com um script, levei escondido no bolso. Tudo seria válido para que não me enrolasse, um só momento, diante dela.
Desta forma, após tomar um banho relaxante, lá fui eu: tenso, mas inteiramente decidido. Teria mesmo que ser agora, pois há muito, precisava me “desafogar”. Aquela sensação de “atraso” estava até me fazendo mal. Sabem como é!!!
- È hoje ou nunca! É hoje ou nunca! - falava prá mim mesmo, enquanto caminhava em passos rápidos, pela calçada.
Era nosso primeiro encontro e nada poderia sair errado.
NA PRÓXIMA SEMANA, NÃO PERCAM: o encontro, o toque, tudo o que um jovem é capaz de fazer, ou não, num momento assim tão decisivo!

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A BUSCA DA FELICIDADE

Digital art por Overflowed

Capítulo 2 - O cérebro

Na semana passada, falamos sobre a busca da felicidade. Via livros, drogas e até mesmo como promessa de religião. Fica parecendo que a felicidade é uma experiência transcendental, que só pode ser atingida através de alguma fórmula secreta, ou de uma experiência hermética, ou mesmo por meio de um encantamento.
Uma coisa é certa, dizem: o dinheiro, se não traz, ajuda a obter felicidade. Mas como explicar, então, o fato de vivermos, hoje, num mundo com mais fartura, maior segurança e muito mais saudável, e, no entanto, com taxas elevadíssimas de casos de depressão? Como justificar o fato de, juntamente com o crescimento econômico da China, estar ocorrendo um surto de suicídios naquele país?
Se, no último censo, os agentes do IBGE perguntassem sobre o nível de felicidade, com certeza a maioria das pessoas diria que era feliz, embora, na prática, o que se vê é a infelicidade estampada nos rostos, nos gestos, nos conflitos sociais, nas famílias e por toda a parte.
No campo da Psicologia, o que se percebe são paliativos. Também poderíamos dizer no campo “das psicologias”, pois são várias as abordagens. A Neuropsicologia, por exemplo, que pesquisa a relação entre o cérebro e o comportamento humano, tenta explicar, anatomicamente, o mecanismo das emoções. De acordo com os neurocientistas, a dificuldade para se vivenciar a felicidade plena, está em nosso próprio córtex cerebral, que privilegia as funções de proteção contra o perigo, do que as do prazer propriamente dito. E isto desde que somos bebês: por exemplo, aprendemos a gostar de coisas doces (que nos deixariam, pois, felizes) e a rejeitar os demais sabores. No entanto, como funciona nossa fisiologia? Nós podemos detectar o doce, apenas na pontinha da língua (cerca de uma parte por 200), enquanto o sabor amargo, sentido na parte posterior da língua é percebido 10.000 vezes mais forte.
Ou seja, o perigo do desprazer é supervalorizado pelo nosso próprio cérebro. A tendência de “fazer uma tempestade num copo d’água” é plenamente justificada e o resultado desta luta desigual é um aumento no estresse. Esta palavra, que designa as reações físicas e mentais à percepção de fatores que nos pareçam perigosos, nem havia sido inventada quando um fisiologista americano, Walter Cannon, apresentou, em 1914, a sua teoria da “luta ou fuga”.
A coisa funciona mais ou menos assim: quando expostos a qualquer coisa que nos pareça perigosa, nosso cérebro manda sinais ao organismo, que bombardeia nosso sangue com opióides (para não sentirmos dor), estreita nossos veias (para diminuir possíveis sangramentos) e dispara nosso coração, para mandar bastante sangue para nossos membros inferiores (em caso de uma possível fuga).
Esse sistema foi construído em tempos primordiais, quando tínhamos que escapar de animais selvagens, ou mesmo caçá-los para sobreviver. E o fato de nosso cérebro “privilegiar” o perigo, permitiu que sobrevivêssemos até os dias atuais, pois, se o cérebro somente destacasse o prazer, já teríamos sido facilmente extintos pelos nossos predadores.
No entanto, a reação atual que temos ao prestar um concurso vestibular é a mesma de quando enfrentávamos uma matilha de lobos selvagens. Uma discussão doméstica, sobre um derramamento de café no tapete, gera uma preparação para a batalha, digna de uma guerra de Troia. Todo este cortisol, derramado na corrente sanguínea, certamente é superior às ameaças contemporâneas.
Ora, a conclusão que chegamos então é a de que “não dá para ser feliz”. Pois, se o nosso próprio cérebro põe uma lente de aumento sobre a infelicidade, como é que vamos fazer? E esta também é uma outra armadilha na qual estamos sempre caindo: a de achar que, quanto menos infelizes, mais felizes ficamos. E isto é uma grande mentira porque, como dizia o cronista esportivo Juarez Soares, “uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”. Por exemplo, se você mora no Haiti e o terremoto não derruba sua casa, você fica menos infeliz, mas, certamente, está longe de ser feliz. Talvez este tenha sido um dos grandes problemas com as psicoterapias: as pessoas saem aliviadas de grande parte de suas misérias emocionais, mas acabam voltando, pois não aprendem sobre as coisas positivas, como a própria felicidade, compaixão e entusiasmo.

NA PRÓXIMA SEMANA: a essência da felicidade, reflexão final.

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

PRÓXIMO DISTANTE - FINAL



Oi! Vivo perguntando se vocês se lembram, Tim-tim por tim-tim, do post da semana passada? Claro, poderão dizer, estávamos falando dos incômodos provocados pelo uso compulsivo dos telefones celulares.
Aliás, se celular fosse uma coisa boa, por que é que são obrigatoriamente desligados nos aviões e nos hospitais? Eu sei que é para não interferir nas várias frequências de rádio das aeronaves e nos equipamentos wi-fi dos hospitais, mas, será que não poderiam estender esta proibição também para os açougues, igrejas e salões de beleza?
E as intimas conversas pessoais, que nos são confidenciadas compulsoriamente... Ou melhor... Empurradas ouvidos abaixo?!
Isto acontece a todo instante, seja em: esquinas, praças, velórios, festas, restaurantes, banheiros etc.etc.etc. E tudo, em alto e bom som!
Domingo passado, presenciei algo do tipo na missa.
Estávamos na consagração. De repente, fomos pegos de surpresa com a chamada de um celular. Pude observar quando uma senhora, após dar uma saidinha, foi atender seu celular. A mulher falava tão alto que, por final, os fieis já estavam olhando mais pra ela do que pro padre. Sem querer dar uma de fofoqueiro, percebi que o maridão de nossa distinta havia deixado de ir à missa, pra ficar assistindo um jogo de futebol em algum barzinho próximo a igreja. Na verdade, nossa amiga era mais uma daquelas pessoas que estavam presentes de corpo, enquanto a consciência e o espírito vagavam pelo ar.
E quando temos que interromper uma conversa, com pessoas que estão a pouco mais de um metro de distância, para dar lugar àqueles que se encontram lá nos “caixa prego”?! E tudo sem que o dito intruso venha, pelo menos, nos pedir licença!
Geralmente, ficamos com cara de bundão, enquanto esperamos novamente a nossa vez, e vemos ir embora um precioso momento. Mas, o que é pior... escutando conversa fiada dos outros... ou melhor:... somente a réplica!
Eu mesmo, certa vez, testemunhei uma dessas cenas.
Uma pessoa, que já estava há tempos esquecida num canto da calçada, e já impaciente com o final da conversa, bateu em retirada sem mesmo ser percebida.

Tempos atrás cheguei a deixar no “vácuo”, um freguês, na porta da oficina.
Tudo teria acontecido quando, minutos antes de fechar para o almoço, uma figura apareceu pedindo que eu desse um jeito em sua furadeira. Insistentemente, ficava a pedir que adiasse meu horário de almoço, para que pudesse “quebrar seu galho”.
Até que, de repente, chamou seu celular.
Sem ao menos pedir-me licença, iniciou relaxadamente um longo e descontraído bate papo. E bem em minha frente.
Já haviam se passado uns cinco minutos, e eu, simplesmente, coloquei a placa de almoço, fechei a porta e fui almoçar. O cara, provavelmente, além de nem ter percebido meu paradeiro, deverá estar me procurando até hoje.

Observe também, a fisionomia de um motorista, quando está a falar no celular:
Se estiver estacionado, tudo bem, mas, se acaso em movimento, é melhor sair da frente. “Ele não se encontra ali”
Certa vez, teve uma senhora que, após se posicionar repentinamente ao meu lado na calçada, perguntou-me se não havia me esquecido de desligar e tirar as bananas do forno. No impulso, ainda cheguei a responder: - Forno?
Só aí que fui perceber que a conversa não tinha nada a ver comigo.
Mas, de tudo isso, o que mais acho interessante é aquela famosa saidinha para atender uma chamada. Que adianta afastar o corpo, se a intimidade é propagada em alto e bom som pelo ar?
Coincidência ou não, calçadão em dia de sábado, parece casa de sogra. E, se for marinheiro de primeira viagem, aí é que a coisa piora. É como estar perdido, dentro da bolsa de valores, em dia de pregão. São torpedos, pra tudo quanto é lado, atingindo as mentes e a atenção da garotada, vinte e quatro horas por dia. É de dar inveja, a muitos tarados, lá daquelas bandas do Oriente.

ÊPA!... Algo acaba de vibrar em meu bolso! Peço licença para uma pequena pausa...

Enfim... Se for bom pra todos, quem sou eu para criticar... Ainda mais que:
Qualquer hora dessas trocarei meu tijolão.. Que vou... Eu vou!

(Crônica – Serjão Missiaggia / Adaptação – Jorge Marin)

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A BUSCA DA FELICIDADE

(Digital art por Paul Duffield)

Estou escrevendo para o blog, quando um grupo de religiosos toca a campainha: pedem para deixar um folheto. Vou buscar, mais tarde, a correspondência, e lá está ele. O título é sugestivo: “Deus acabará com todo o sofrimento!” Logo numa das primeiras páginas, ilustrada com desenhos de paisagens semelhantes à Ilha da Fantasia, podemos ler vários textos bíblicos mostrando que, num futuro próximo, não haverá mais guerras, as pessoas amadas voltarão a viver, haverá alimentos para todos, não haverá mais doenças, as pessoas más desaparecerão e a justiça prevalecerá.
Leio, com o devido respeito, todas estas previsões maravilhosas, e fico me perguntando se, automaticamente, o fim do sofrimento significa a aquisição imediata da felicidade. Acho curioso que, enquanto uma religião prega o fim do sofrimento, a nossa cultura laica apregoa a busca da felicidade, a qualquer custo, o gozo imediato, e a busca de mais e mais felicidade.
Então fico dividido: o que é melhor? A cessação do sofrimento ou a busca incessante da felicidade? De um lado, o fim do sofrimento, que depende da realização de tudo aquilo que se vê no Apocalipse e que não se sabe, ao certo, quando ocorrerá. De outro, um Freud pessimista afirmando que é praticamente impossível conceber um ser humano plenamente feliz.
Na dúvida, acompanhamos a maioria e saímos correndo em busca da felicidade. Podemos começar, comprando algum livro. Se visitarmos uma livraria, real ou virtual, podemos notar que milhares de livros tratam deste assunto, sem contar os pensamentos, os hábitos, as simpatias e as receitas para ser feliz.
Outra forma, também muito popular, são as drogas, tanto as lícitas, como as ilícitas. Aliás, prefiro falar em legais e ilegais; legais aí significando aquelas que podem ser vendidas livremente. Entre estas, as bebidas alcoólicas, que estão em toda parte, desde aniversários, casamentos e batizados, até reuniões sociais e de negócios. Não se concebe um encontro com um amigo, ou um namoro, ou um churrasco, sem a inseparável cervejinha.
Não tenho nada contra. Estou apenas viajando pelas drogas legais. Continuando, temos, talvez em uma escala maior, os antidepressivos, e os tranqüilizantes. Hoje em dia, é praticamente impossível encontrar alguma família, na qual algum membro não utilize, um antidepressivo do tipo fluoxetina (Prozac) para combater a depressão, e um outro para poder dormir, normalmente clonazepam (Rivotril) ou cloxazolam (Olcadil). O engraçado é que as pessoas, mulheres em sua maioria, parecem se orgulhar de tomar alguns destes remédios. Chegam até a brigar com seus psiquiatras, pedindo a prescrição, baseadas em conselhos de amigas.
Chegamos, então, às chamadas drogas ilegais, um comércio que movimenta quase 10% da economia mundial, o mesmo que os combustíveis. Parece que, com a evolução dos costumes, mudou também o conceito de felicidade, pois, nas décadas de 60 e 70, a droga mais consumida era a maconha que, além de gerar uma dependência mais leve que o álcool, induz a um estado de tranquilidade. A partir dos anos 80 e até os dias atuais, a droga mais popular passou a ser a cocaína, tanto na forma pura, como impura (crack), que podem gerar uma síndrome de abstinência, e induzir à euforia. Podemos dizer que, antes dos anos 80, a felicidade era buscada nos alucinógenos e, depois, passou a ser procurada nos estimulantes, dos quais, aliás, faz parte também a nicotina, hoje um tanto fora de moda.
Mas, seja qual for o tipo de felicidade gerada por qualquer uma destas substâncias, é bom que se diga que esta felicidade fica na substância. Quando a pessoa interrompe o consumo, seja a droga legal ou ilegal, o efeito também cessa. E aí? Quem sabe, algum livro novo livro de autoajuda. Ou aquele folheto. Se bem que, vamos combinar, religião definitivamente não é a busca da felicidade! Se dissermos que é a busca da verdade, talvez estejamos no caminho.
NA PRÓXIMA SEMANA: o papel do cérebro na busca da felicidade.

(Crônica: Jorge Marin)

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

PRÓXIMO DISTANTE

(Digital art por Ella Shartiel)

Com certeza, o telefone celular veio, em muito, aproximar aqueles que estão longe, mas estaria eu mentindo se omitisse não achar também que, em certas ocasiões, veio a distanciar aqueles que estão próximos.
Pra começo de conversa, o celular não é, na verdade, um telefone, mas um rádio. Vamos combinar que é um rádio extremamente sofisticado, mas não passa de um rádio. Ambos, telefone e rádio, foram inventados no final do século XIX, por Graham Bell em 1876, e por Tesla em 1880. Na escola, aprendemos que o inventor do rádio foi Marconi, mas este foi quem apresentou oficialmente a invenção em 1894). Como se vê, demorou um pouco, para que as tecnologias se misturassem, gerando o nosso corriqueiro celular.
E não é que eu tenha alguma coisa contra esta revolução tecnológica tão útil, mas... é desagradável depararmos com um grande amigo, que não vemos há anos, e sermos privados de um simples aceno. Possivelmente, um bate-papo, com alguém que poderia até mesmo estar do outro lado do planeta, nos colocaria também, naquele momento, a centenas de quilômetros um do outro. Já observaram que, de uns tempos para cá, aqueles que se encontram próximos, ficaram relegados ao segundo plano?

Dia desses, entrei com certa pressa no açougue. Coincidentemente, nesta hora, encontravam-se no recinto, apenas eu e um balconista. Após fazer meu pedido, não deu outra: tocou o celular do referido atendente. Pra variar, tive que ficar, mais ou menos, cinco minutos em silêncio, esperando apenas que o tal sujeito terminasse sua conversa no celular. Digo calado porque, do contrário, só me restaria ficar conversando com aquele montão de carne. Haja paciência nestas horas! Um pouquinho a mais e o açougue teria perdido um freguês.

Não tardará o dia em que teremos que fazer uma chamada, para conversar com amigos que se encontram do outro lado da rua. Por sinal, coisa parecida veio a acontecer justamente com um de meus irmãos. Tudo teria ocorrido após frustradas tentativas de se chegar à mesa de um estabelecimento bancário para conversar com o gerente. Na verdade, o que realmente acontecia era que, sempre que ele se aproximava e ia chegando sua vez, era interrompido por diversas ligações que o tal gerente recebia. Cansado então, das inúmeras e frustradas tentativas de se aproximar, e após conseguir o número do celular da referida pessoa, posicionou-se na poltrona que ficava bem em frente à mesa do concorrido gerente e, antes que chegasse sua vez, foi logo telefonando. O episódio, que transcorreu como uma brincadeira entre amigos, que se conheciam há tempos, ilustra bem a concorrência entre a demanda pessoal, ao vivo, e as demandas via celular. Para se ter uma ideia da disparidade, basta voltar ao conceito inicial de que o celular é um rádio. Pois bem, se fosse um walkie-talkie, ele teria um único canal; se fosse um rádio faixa do cidadão, teria 40 canais, mas um celular simples pode se comunicar em quase 1.700 canais.

Até em videogame e máquina fotográfica, esta invenção sedutora foi transformada. Além de armazenar contatos, listar tarefas, agendar compromissos, gravar lembretes, fazer cálculos matemáticos, enviar e receber e-mails, acessar a Internet nos mais variados canais, mandar torpedos, além de interagir com outros badulaques, do tipo PDAs, MP3 players e receptores de GPS. Ufa, com tudo isto, é muito comum encontrarmos com adolescentes flutuando pela rua, caminhando de olhar grudado na telinha. Já vi gente caindo em buraco, trombando em poste e até mesmo entrando em um orelhão. A alienação é total! Verdadeiras cascas ambulantes, desfilando pelas ruas, enquanto suas consciências vão viajando pelo ar.

NA PRÓXIMA SEMANA: o celular e as situações constrangedoras, na missa, no trânsito e até no velório. Tudo em 3G, TDMA, CDMA e GSM, seja lá o que for isso. Aguardem, porque o desconhecimento é nóis, sem fronteiras.

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

FILMES QUE EU NÃO VI NO CINE BRASIL


Fui assistir Tropa de Elite 2 meio ressabiado: todo mundo fala de nazismo, violência excessiva e até mesmo um enfoque meio rambolesco para o herói Capitão Nascimento. Mas não é o que ocorre: após passar pelo tiroteio, percebo que, mais do que a taquicardia gerada pela ação, fica um nó na garganta, ou uma dor no estômago. Assim como acontece após levarmos uma bolada, ou um soco.
Acuados pela ameaça do crime iminente, e pela lama da corrupção generalizada (ainda mais agora, jogada pelos programas eleitorais, em nossos ventiladores), vamos nos tornando um bando de batmans enrustidos. Muitas vezes, alguém, em desespero, clama pela volta do regime militar, outros defendem a pena de morte. O fato é que adoramos estes programas sensacionalistas, em que um jornalista defende a lógica do BOPE de que “bandido bom é bandido morto”.
Mas, fazer o quê, somos pessoas de bem, e é dessa característica positiva nossa, que os perversos de toda ordem se aproveitam, para se infiltrar no tecido social, com um apetite jamais visto. Mas, no filme, podemos pegar carona no helicóptero do agora Tenente-Coronel Nascimento, e descarregar toda nossa fúria, e nossa metralhadora cheia de mágoas, no lombo dos supostos responsáveis pelos males de nossa sociedade.
Podemos acusar o Coronel Nascimento de ter um pensamento muito primário, com uma visão maniqueísta do mundo (do tipo nós somos do bem e eles do mal). Mas, se os próprios candidatos à Presidência da República agem desta forma, por que não um herói, ainda mais fictício? Desta vez, o diretor José Padilha, com o roteirista Bráulio Mantovani, constroem um personagem complexo, com qualidades e defeitos bem humanos e imprevisíveis. Nascimento não só explode em fúria como de costume, mas também vacila, ora segura o choro, ora chora e até reconhece sua burrice. Tem um código de ética e um sentimento moral únicos, vividos com um peso e uma dor tão intensos por Wagner Moura, que acreditamos realmente que o personagem envelheceu dez anos. Diferentemente do que ocorre na maioria dos filmes, a narração em off, feita pelo sombrio coronel, funciona muito bem, permitindo que viajemos pelos seus pensamentos radicais e primários, até que estes se confundam com os nossos próprios.
Ao contrário de nós, o Coronel Nascimento não apenas acredita na via da violência para solucionar o problema do crime organizado, como não hesita em utilizá-la até a morte do último marginal. O seu oposto no filme (e, para detonar o policial, marido de sua ex-mulher) é o ativista de direitos humanos, Fraga, muito bem interpretado por Irandhir Santos, que chega a arriscar a própria vida na cena inicial do filme, uma rebelião no presídio de Bangu 1. Os dois homens têm em comum, tanto a família, como a mesma visão idealista em relação ao combate ao crime, embora em direções opostas. Como vai se observar no final, ambos quebram a cara e percebem como a realidade pode ser mais cruel do que qualquer ideologia.
A citada rebelião no presídio, comandada pelo criminoso Beirada, vivido magistralmente pelo Seu Jorge, é o ponto de partida de toda a história, pois gera a exoneração do Coronel, mas, ao mesmo tempo, o transforma em herói perante a opinião pública, o que obriga o governador a nomeá-lo para o Serviço de Inteligência, dentro da Secretaria de Segurança Pública, de onde Nascimento mexe os pauzinhos para fortalecer o BOPE como nunca. Há um resultado esperado, a diminuição do crime organizado; e um resultado imprevisto, a formação de milícias pelo que foi chamado, na vida real, de banda podre da polícia.
Aos protagonistas, juntam-se personagens fictícios, mas totalmente verossímeis em nosso dia a dia: um governador preocupado apenas com sua reeleição, um secretário de governo que se promove às custas da máquina estadual e um apresentador de TV, que passa do popularesco dramático ao cômico (André Mattos, vivendo o apresentador e deputado corrupto Fortunato).
Esta sequência de Tropa de Elite é menos violenta do que a primeira em um aspecto, que é o da batalha corpo a corpo entre os bandidos e os “caveiras”. No entanto, quanto mais se eleva a percepção da corrupção, do morro para a cidade, e daí para o país, o que se tem é a violência real, de um sistema corrupto, assistido por um bando de expectadores que, tanto no filme como na vida real, nada fazemos.
Fica uma certeza: nossa crise ética e moral não será resolvida, nem por policiais assassinos, nem por ativistas de direitos humanos. Se os políticos, nos quais votamos nas últimas eleições, conseguirem chegar ao final de seus mandatos ainda com a “ficha limpa” pode ser um bom começo. Mas, será que alguém acredita nisto?
Pelo menos, o Coronel Nascimento, e os bandidos que ele persegue, a gente sabe de que lado estão.

(Crítica: Jorge Marin)

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

DR. BICHEIRÓLOGO



Capítulo Final - Na cabeça!

A Bicheirologia tem se revelado um campo promissor e absolutamente fantástico. Confesso que eu mesmo não acreditava muito nesta história de palpites, mas, para terem uma ideia, fatos estranhos começaram a acontecer depois que começamos a publicar estes posts aqui no blog. No domingo, recebemos um e-mail de um leitor agradecido, pois aproveitou aquele final do capítulo de sexta-feira passada e jogou no veado (conforme diagnosticado pelo Dr. Froide) e também no peru (por motivos que talvez Freud explicasse) e, para sua surpresa (e nossa), o passe veio, na cabeça, na Loteria Federal do sábado, dia 16, ou seja, no dia seguinte à publicação da crônica. Mas o leitor, não satisfeito, pegou o valor ganho e apostou, de novo, na quarta-feira, dia 20, usando a outra dica do Dr. Froide (de que daria urso) e aproveitando ainda a ideia do brutamontes (jogou no elefante). E, adivinhem: deu, exatamente, elefante e urso na cabeça. Talvez iniciemos até um blog específico para a Bicheirologia, quem sabe?
Mas, voltando à famosa banca, o valentão, indignado pelo diagnóstico de veado, bracejava furioso, ameaçando adentrar pela barraca e já com a ponta do dedo no nariz do Dr. Froide.
O bicheirólogo, num belo jogo de cintura, foi logo se desculpando e retificou:
- Ô gente boa, não me leve a mal, mas... de uns dias para cá, tem dado tanto veado, que me perdi!!! Veado é um bicho que dá muito, sabe?
O que muito pouca gente ficou sabendo, é que, mesmo depois de quase apanhar, e após o tal sujeito ir embora, Froide fez uma fezinha e ainda faturou cento e cinquenta reais. E não é que deu Jacaré com Veado na cabeça?

Numa tarde, enquanto conversava com o Doutor, eis que, de repente, me surge na praça, o velho amigo botafoguense e vizinho Mota Soares. De imediato, foi logo dizendo que havia telefonado para a viúva do Tonico, e que sua intenção era dizer a ela que havia sonhado com seu falecido marido. (Tudo isso na justificativa de que iria acender uma vela em sua memória) Com esta descarada desculpa, perguntou se acaso ela não se lembrava de qual era o número da placa daquela que foi sua inseparável camionete. E se, porventura, não se lembrasse, serviria também a data do aniversário do falecido, ou mesmo do falecimento. Se, de tudo, nada fosse possível, o número do túmulo serviria também... E como! (E era exatamente aí que ele queria chegar!) Bem! O resto creio que, todos imaginam!!!!

Certa vez, ao consultar-me com o Dr. Froide, disse-lhe que, ao abrir a porta da oficina, havia me deparado com um gato. Uma consulta simples e óbvia, pensei!
Mas... Qual foi minha inesperada surpresa?
Froide começou a questionar-me, querendo saber: se o gato havia ficado parado, se havia corrido, se pulou em cima de mim, ou mesmo se havia demonstrado estar assustado ou não. Isto pra não falar de um tremendo interrogatório que, repentinamente, começou a fazer, no intuito de analisar quais seriam as melhores opções e possibilidades que eu teria naquele momento, ou seja: Passe, Centena, Passe Duplo, Milhar, Centena e Milhar Invertida, Milhar ao Quinto, Milhar ao Quinto Invertido, Duque de não seio o que, Terno de não sei da onde e por aí foi e não parava mais.

- Deixa prá lá, Froide! É mais fácil esperar amanhã e ver que bicho vai dar!
E fui saindo sorrateiramente.

Termino aqui esta confusa croniqueta. Provavelmente, após o término da mesma, muitos outros casos terão sido ouvidos. Quando puder repassarei pra vocês.
Este é apenas um pedacinho de meu Brasil brasileiro que, em meio a tantos contrastes e desigualdades, ainda possui: “o mais feliz povo deste planeta”.

(Crônica: Serjão Missiaggia / Adaptação: Jorge Marin)

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

OS ADOLESCENTES QUE ÉRAMOS

(Digital art: Samantha Eddleston)

Na adolescência, vivíamos a ciência da biologia em estado pleno, ou a saliência da antropologia em estrado plano. Não nos assustávamos com o clero nem com as sombras das casernas. Não carregávamos peso nenhum, a não ser nossos corações que, bombas atímicas, pulsavam ferozes, velozes, regidos pela lei da paixão.
Tínhamos asas completas que nos levavam em qualquer lugar, e nossas bocas, ávidas de beijos, cantavam, gritavam e bebiam. Quem nos visse na rua, de madrugada, não imaginava a importância dos rituais das noites de sábado. Quem ouvisse nossas conversas atravessadas de risos e xingamentos, jamais diria que seríamos pais, avós ou funcionários públicos.
Os romances eram sempre definitivos; as dores, irrecuperáveis; e os prazeres, manipulados para significar uma intensidade que queríamos fantástica, absurda, incomparável. O rock, onipresente, era uma desculpa esfarrapada, assim como os jeans, para matar aula, chupar bala, chapar cuca, quebra regras.
Naqueles tempos de Pink Floyd, os chicletes grudavam nas palavras, as chuvas não molhavam e nem usávamos guarda-chuvas ou sombrinhas. A Matemática era incompreensível e os poetas, guerrilheiros. Não sabíamos falar inglês, rezar a Salve Rainha, nem jogar gamão.
Ah, mas amar, sabíamos bem! Apaixonávamos a cada momento, os pensamentos escureciam, o coração mandava e, indestrutíveis super-homens e supermoças, mergulhávamos na cratera do vulcão, no olho do furacão, na doce ilusão de ser feliz para sempre.
Quantas bravatas, quantas serenatas, risos, rosas e carnavais. Na multidão, éramos únicos; nas procissões, tímidos; e nas exposições, bêbados. Os nossos heróis morriam de excesso de sonho, os nosso amigos eram temidos pelos amigos dos nossos inimigos, e bandidos só existiam nas telas dos durangos kids, james bondes e outros xerifes.
Era um tempo de almas claras e esperançosas, falava-se em aquarius, cenários e woodstocks. As roupas eram toscas, leves e diáfanas. A moda era vestir o que se queria, falar o que se pensava, e sonhar sempre e sempre. Nunca tínhamos fome, nem sentíamos saudade e chegávamos, pasmem, a burlar a própria lei da gravidade.
Nossos ombros nus jamais carregavam planetas; nossos planos projetavam comunidades, violões, canções de amor e danças por noites e dias. Havia algumas certezas, claras, transparentes: não queríamos viver como nossos pais; não desejávamos a guerra, seja lá o que isso fosse, e o trabalho seria, no máximo, em algum palco, ou numa praia, ou fazenda do planeta Krypton.
Viajávamos com Jethro Tull, Genesis e Mike Oldfield. Nossos quartos eram repletos de vinis, gibis e pôsteres de marylins. Não arrumávamos as camas, não penteávamos os cabelos e recusávamos a decorar a tabela periódica dos elementos. Vivíamos como se fosse só hoje, não dormíamos em momento algum e gastávamos todo o dinheiro que chegasse às nossas mãos.
E éramos felizes, e éramos dourados. Nada ou ninguém nos interessava, se não fizesse parte do nosso mundo, do nosso universo paralelo, dos nossos versos parafrásicos, da nossa lógica parafrênica.
O curioso é que, embora alguns tenham ido, muitos de nós permanecemos e, apesar de termos feito tudo o que fizemos, e vivermos como nossos pais, não somos mais os mesmos: adotamos, finalmente, a lei da gravidade; carregamos alguns habitantes do planeta nos ombros; e assombramos os mais jovens com a dureza de algumas certezas descabidas.
Se algum salmo nos diz que somos deuses, sabemos que não é verdade. Começamos, de repente, a sentir saudade; a sorrir para a vida, e a amar as flores.

(Texto-poesia: Jorge Marin)

BRIGADU, GENTE!

BRIGADU, GENTE!
VOLTEM SEMPRE, ESTAMOS ESPERANDO... NO MURINHO DO ADIL